Manifesto Comunista: primeiro programa político do proletariado
Por José Reinaldo Carvalho (*)
Em 1847, quando vivia em Bruxelas, Marx participou dos Comitês de Correspondência, existentes também em Paris, Berlim, Copenhague, Hamburgo, entre outras cidades europeias. Eram pequenos grupos voltados para a difusão das ideias comunistas no seio do movimento operário e a preparação das condições para criar instrumentos capazes de desenvolver a luta política dos trabalhadores.
Desde o ano de 1836, existia em Paris a Liga dos Justos, uma organização idealista e utopista, que realizava atividade conspirativa e secreta. Seu mote – generoso mas ingênuo – partia da falsa premissa de que “todos os homens são irmãos”.
No mesmo período surgiram na Inglaterra as Associações dos Trabalhadores e o movimento que se denominou Cartista, pois se organizava em torno de uma Carta do povo, em que eram expostas as reivindicações dos direitos dos trabalhadores, ao lado de exigências políticas, como o direito à participação do proletariado nas eleições e o voto secreto.
Marx e Engels mantinham relações com a Liga dos Justos e o Movimento Cartista, desenvolvendo ao mesmo tempo pontos de vista críticos às teorias ilusórias e erros de condução destes.
Por influência dos dois revolucionários alemães, a Liga dos Justos foi transformada em Liga dos Comunistas, cujos objetivos passaram a ser a derrocada da burguesia, a destruição da velha sociedade burguesa e a construção da nova sociedade sem classes, sem propriedade privada e exploração. A nova palavra de ordem: “Proletários de todos os países, uní-vos!”.
No congresso realizado em Londres, em 1847, a Liga dos Comunistas decidiu encarregar Marx e Engels de redigir o programa da organização. Surge então o Manifesto do Partido Comunista, em que se apresentam e condensam ideias fundamentais do socialismo científico: a luta de classes, a revolução, o poder político dos trabalhadores e o internacionalismo proletário.
No Manifesto, os dois filósofos e dirigentes revolucionários analisam que a divisão da sociedade em classes antagônicas surgiu com a propriedade privada sobre os meios de produção e marcou todo o desenvolvimento histórico. Os escravagistas oprimem o escravo. Os feudais, os servos. Os capitalistas, os operários. Classes exploradoras e exploradas vivem em permanente luta inconciliável umas com as outras. Diferentemente dos socialistas utópicos que imaginavam a evolução sem luta de classes, Marx e Engels afirmaram no Manifesto que a história de todas as sociedades é a história da luta de classes.
O corolário é a revolução social, designada como “a locomotiva da história”.
A luta dos escravos resultou na superação do escravagismo, substituído pelo sistema feudal. As revoluções burguesas derrocaram o feudalismo, que deu lugar ao capitalismo. Vivemos contemporaneamente a luta multifacética pela superação revolucionária do sistema burguês por uma sociedade superior, o socialismo.
Os fundadores do socialismo científico destacam a crescente divisão da sociedade capitalista em dois campos antagônicos: a burguesia e o proletariado. “A burguesia forjou não apenas as armas que resultarão em sua morte, mas também as pessoas que vão usar essas armas – os operários modernos, os proletários”.
Marx e Engels plantaram no Manifesto a semente do partido comunista como organizador, educador e dirigente da classe operária, como instrumento para a conquista do poder político e a realização de profundas transformações sociais: “Os comunistas são, pois, praticamente, o setor mais decidido, sempre impulsionador, dos partidos operários de todos os países; teoricamente, têm, em avanço sobre a restante massa do proletariado, a compreensão das condições, do curso e dos resultados gerais do movimento proletário”, afirma-se no Manifesto. Igualmente, no texto aparece em gênese a concepção marxista sobre o caráter do poder político a ser instituído pela revolução socialista: “O primeiro passo da revolução proletária é a transformação do proletariado em classe dominante”.
A classe operária de cada país luta por sua emancipação e a de todos os trabalhadores do mundo. É natural e indispensável que os trabalhadores de todos os países se unam e cooperem mutuamente pelo êxito de suas lutas e o triunfo da causa do socialismo em todo o mundo, o que se expressou no Manifesto com a palavra de ordem “Proletários de todos os países, uní-vos!”.
No Manifesto, Marx e Engels explicaram também a posição que a classe operária deve manter em face de outros movimentos e aliados. Os trabalhadores devem apoiar todos os movimentos democráticos , inclusive a luta da burguesia contra o absolutismo. Devem atuar nesses movimentos como uma força independente. Ao fazê-lo, os comunistas não renunciam ao seu dever de conscientizar a classe operária sobre a necessidade de lutar inconciliavelmente contra a burguesia. Ao lutar pela democracia, a classe operária e o partido comunista não perdem de vista os seus principais objetivos: a revolução socialista e a conquista do poder político.
Decorridos quase dois séculos, o Manifesto Comunista resiste ao furor dos tempos. As atuais gerações de comunistas e seus aliados na luta pelo socialismo interpretam e usam dialeticamente o tesouro das suas formulações, considerando as profundas transformações que a humanidade viveu nas épocas subsequentes à sua publicação.
Sua importância histórica reside em que este documento condensa as principais ideias-força da teoria revolucionária. Foi o primeiro programa político do proletariado, um passo decisivo para a transformação do socialismo de utopia em ciência, sem negar, ao contrário valorizando, a grande contribuição que havia sido dada pelos socialistas utópicos, principalmente Saint-Simon, Fourier e Owen.
O Manifesto constituiu um chamamento vibrante dirigido aos trabalhadores de todos os países para lutar contra a opressão e a exploração capitalistas, para sua união e caminhada na via revolucionária da construção da nova sociedade.
O Manifesto ainda hoje desempenha papel fundamental na educação socialista dos trabalhadores, na formação de quadros revolucionários e na orientação teórica que necessariamente informa os programas revolucionários dos partidos comunistas na atualidade, cuja ação cotidiana encontra no magistral texto de Marx e Engels uma fonte de ensinamentos e inspiração.
(*Jornalista, editor do Resistência e membro do Comitê Central do PCdoB