Atos de milhões de pessoas em todo o Chile – mais de 1 milhão só em Santiago - forçaram a queda do gabinete ministerial de Piñera - foto Nossa Política

O resultado imediato das maiores manifestações dos últimos tempos no Chile, que na sexta-feira, 25, levaram às ruas, milhões de pessoas em todo o país – mais de 1 milhão só em Santiago -, foi forçar a queda do gabinete ministerial do presidente Sebastián Piñera.

“Tenho pedido a todos os ministros que ponham seus cargos à disposição para poder estruturar um novo gabinete para ter condições de enfrentar estas novas demandas e fazer-nos cargo dos novos tempos”, disse no sábado. Mas o presidente não anunciou quem integrará a equipe. Os nomes poderão ser decididos entre o domingo e segunda-feira.

Além disso, anunciou que “se a situação o permitisse” suspenderia o “estado de emergência”. Foi levantado o toque de recolher em Santiago, Valparaíso e Concepción, embora continue em La Serena e Coquimbo, ao norte do país, o que mostra o quão espraiados estão os protestos.

O Ministério do Interior reconheceu que já são 20 os mortos nas mobilizações, enquanto se avolumam as denúncias de violações de direitos humanos pelas forças policiais.

Mas, longe de acalmar-se, no sábado, 26, a revolta social teve como epicentro o Palácio de La Moneda, sede do governo, e a Praça Itália, ambas no centro da capital, onde se reuniram dezenas de milhares de pessoas para manifestar ao presidente Sebastián Piñera que aos chilenos não bastam as medidas de fachada que seu governo tem tomado.

A polícia (carabineiros como são chamados no Chile), que parece não terem sido informados sobre promessas de Piñera de absorver as manifestações, voltaram a reprimir, lançando gás lacrimogêneo, fato habitual nas marchas.

As manifestações continuam no domingo e estão previstas para seguir na segunda-feira. Já foi convocada para a terça-feira, 29, uma nova grande marcha pelo centro da capital, Santiago.

A mudança de gabinete, mesmo que simbolize o fracasso das políticas governamentais, em si mesma não significa a resolução da crise. “Quais são as propostas, quais as medidas para superar os problemas que o país enfrenta e seu povo que o governo pretende implementar? Não tem nada claro sobre isso”, declarou Bárbara Figueroa, presidente da Central Unitária de Trabalhadores.

Mais de 2 milhões de aposentados sob o sistema imposto pela ditadura de Pinochet recebem em média 880 reais mensais (160 mil pesos), e gastam quase um terço só em remédios; a metade dos trabalhadores chilenos recebe em média 1930 reais (350 mil pesos) de salário mensal, com alugueis, transporte e custo de vida acima de qualquer possibilidade de, com esses recursos, ter uma vida minimamente digna. Por isso, as reivindicações que foram colocadas pelos manifestantes são abrangentes: pensões dignas, reduzir o preço dos medicamentos, aliviar o endividamento dos chilenos, salários decentes, custo de vida controlado, transporte público melhor, etc.

A crucificação está entre uma das mais bárbaras das torturas policiais relatadas nestes dias de levante popular. Três homens e um adolescente de 14 anos foram presos por policiais e “crucificados” em uma antena da delegacia no bairro de Peñalolén.

Frente às violações sistemáticas dos diretos humanos que se registraram nos últimos dias, o Instituto Nacional de Direitos Humanos (INDH) do Chile realiza percursos por hospitais, cárceres e comissárias para observar o funcionamento das forças de segurança. O organismo informou que até a noite da sexta-feira, 25, eram 3162 as pessoas detidas, das quais 343 são menores de idade. Encontram-se hospitalizadas 997 pessoas, com feridas por armas de fogo 443 e por balas de borracha 24. Os processos denunciando violações sexuais chegam a 15. O INDH registrou relatos que denunciam simulacros de execução, maltrato físico e verbal.

ASSEMBLEIAS POPULARES

Tomando conta das ruas de muitas maneiras, em distintas praças de Santiago grupos musicais e artísticos realizam mostras e eventos culturais. Em muitas esquinas são organizadas assembleias, chamadas cabildos abertos, nas quais os vizinhos se juntam para discutir soluções e buscar uma saída de verdade para a crise. E, enquanto isso, as panelas continuam ressoando em todo o território chileno.