O Boeing da Malaysia Airlines (voo MH17) derrubado em julho de 2014 sobre a Ucrânia

A Malásia está “descontente” com o resultado das investigações conduzidas pela Holanda sobre o Boeing da Malaysia Airlines (voo MH17) derrubado em julho de 2014 sobre a Ucrânia, afirmou o primeiro-ministro Mahatir Mohamad, que considerou “ridículas” tais conclusões atribuindo à Rússia envolvimento no abate do avião. “Naquilo que nos diz respeito, queremos provas de culpabilidade. Até agora não há provas. Apenas boatos”, ressaltou Mohamad.

Para Mahatir, foi desde o início um processo político voltado a culpar Moscou. “Desde o início (a investigação) se tornou uma questão política para acusar a Rússia”, assinalou o primeiro-ministro malaio, que salientou que, antes mesmo da investigação, já apontavam o dedo para Moscou pela tragédia do MH17.

Na quarta-feira, o Time Conjunto de Investigação (JIT) acusou três russos e um ucraniano pelo abate e anunciou que mandatos de captura internacionais seriam emitidos em breve – os quatro, da resistência no Donbass ao golpe fascista de fevereiro daquele ano em Kiev com cumplicidade da CIA, que derrubou o presidente legítimo, transformou o criminoso de guerra Bandera em ‘herói nacional’, passou a perseguir os ucranianos de ascendência russa e cassou a língua russa. 298 passageiros e tripulantes foram mortos no abate do MH17, que sobrevoava uma área de combates, em que nos dez dias anteriores três aviões militares haviam sido abatidos, com mais de 50 mortos.

As reclamações de Kuala Lumpur não são novas, já que, apesar do avião derrubado ser malaio, a Malásia foi inteiramente escanteada durante a investigação, que foi encabeçada pela Holanda, Austrália e Bélgica, mais o novo governo ucraniano, e com a Rússia deixada de fora por deliberação da JIT, apesar de oferecimento nesse sentido de parte do presidente russo Vladimir Putin.

Assim que o JIT anunciou sua conclusão, o Ministério das Relações Exteriores da Rússia rechaçou as “acusações absolutamente infundadas” e denunciou que “nenhuma evidência concreta foi apresentada para apoiar essas alegações ilegítimas”.

Todas as informações e provas apresentadas pela Rússia foram inteiramente ignoradas por Amsterdã, já que não se encaixavam na tese pré-estabelecida: de que só os antifascistas é que poderiam ter abatido o Boeing, e com uso de um míssil antiaéreo Buk supostamente trazido da Rússia e para lá levado de volta.

Entre as provas e evidências encaminhadas por Moscou ao JIT, estão as imagens de radar registradas pelo controle aéreo russo, que mostravam a presença de caças ucranianos nas imediações do Boeing da Malaysia Airlines; fotos de satélite que mostravam baterias Buk ucranianas posicionadas no Donbass no período imediatamente anterior ao abate; e documentos que, a partir dos fragmentos encontrados no local, mostravam que o Buk tido como responsável (número de série 8868720) era ucraniano desde 1986 e parte dos 20 sistemas em posse de Kiev e recebidos da União Soviética, e esse modelo desde 2011 não era mais usado pelo exército russo.

A tendenciosidade das conclusões fica evidente quando sequer é questionado porque as autoridades ucranianas mantiveram vôos de passageiros sobre áreas de conflito, onde aviões militares já haviam sido derrubados. Também não se sabe até hoje de onde partiu a decisão de mudar a rota do voo preestabelecida, para outra, que levou o avião direto ao abate.

Há suspeita, ainda, de que caças ucranianos tinham o costume de se esconderem atrás de aviões de passageiros civis para escaparem da detecção pela defesa antiaérea (foi o que os caças israelenses fizeram com o avião russo abatido por engano na Síria no ano passado).

Em sua sessão anual em que responde a perguntas vindas de todas as partes da Rússia, o próprio Putin entrou nessa discussão. “Devemos retornar a tudo que falamos? Quem permitiu voos sobre a zona de combate? A Rússia? Não. Onde estavam os caças (ucranianos)? E onde está a evidência absoluta de que a milícia atirou ou de que foi outra pessoa? Há muitas perguntas, mas elas não são respondidas. Apenas nomearam os ‘perpetradores’ e é isso. Não estamos satisfeitos com essa abordagem da investigação “, afirmou.

“Nós temos nossa própria versão, nós a apresentamos, infelizmente, ninguém quer nos ouvir. E até que haja um diálogo real, não encontraremos a resposta certa para as questões que ainda estão abertas”, acrescentou o líder russo.

Como Putin enfatizou, a Rússia “nunca se esquivou de sua responsabilidade se tal fardo estiver sobre seus ombros”. “O que vimos e o que nos foi apresentado como evidência da culpa da Rússia não é absolutamente uma opção para nós, acreditamos que não há provas disso”, finalizou.

Nem mesmo o procurador-geral holandês, Fred Westerbeke, que encabeçou a enviesada investigação acredita que alguém irá sentar no banco dos réus em Amsterdã, mas sempre é útil na campanha de demonização da Rússia. Ele reconheceu que as constituições dos dois países proíbem a entrega de seus nacionais. O ‘julgamento’ terá início, à revelia, em 9 de março do ano que vem.

ANTECEDENTES

Não era a primeira vez que um avião civil era abatido na Ucrânia: foi o que aconteceu em 2001, quando o exército ucraniano acidentalmente, durante um exercício, derrubou sobre o Mar Negro um avião de passageiros russo que voltava de Israel, matando todos os 78 passageiros e tripulantes a bordo.

Não se sabe também porque o JIT desconsiderou uma gravação encaminhada por Moscou aos investigadores, de uma conversa interceptada em 2016, em que um oficial ucraniano do controle aéreo, em meio a uma enxurrada de reclamações sobre as restrições de voo na região, deixa escapar que a menos que estas sejam respeitadas “nós vamos foder outro Boeing da Malásia”. O oficial é coronel Ruslan Grinchak, cuja unidade, segundo os russos, rastreou em 2014 o voo MH17.

Aparentemente, o JIT também ignorou o estudo e as provas enviadas pelo fabricante do sistema Buk, a Almaz-Antey, que demonstrou em um experimento em tempo real que o projétil que atingiu o MH17 era de uma geração mais antiga e não mais em operação com os militares russos. O estudo, que analisou o ângulo de impacto dos projéteis na cabine do mal-fadado vôo, mostrou ainda que a mais provável localização do local de lançamento somente poderia estar em território controlado por Kiev.

As autoridades militares russas também questionam o vídeo – apresentado pelo site Bellingcat, de notórios vínculos com a inteligência britânica – que “mostraria” o Buk sendo levado de volta para a Rússia e tida como a principal “fonte aberta” usada pelos procuradores holandeses.

A acusação é de que foi manipulado, para colocar imagens do lançador em fundo em que não estavam no original. O principal ‘investigador’ da Bellingcat se recusou na época a debater suas “conclusões” com o internacionalmente reconhecido especialista de armamentos do MIT, Theodore Postol.

Depois do golpe na Ucrânia, a que se seguiu o levante antifascista no Donbass e o referendo na Crimeia que decidiu pela reunificação com a Rússia, os países ocidentais histericamente desencadearam uma campanha de russofobia e decretaram pesadas sanções contra Moscou, e toda a investigação aconteceu sob esse clima nada imparcial.

O que levou o chanceler Sergei Lavrov a afirmar que “se nossos parceiros decidiram especular sobre este caso, quando se trata da mais séria tragédia humana, a morte de centenas de pessoas, para atingir seus objetivos políticos, eu deixo isso para suas consciências”.

O autor do livro “MH17: o acordo de encobrimento”, o jornalista holandês Joost Niemoller, denunciou que a investigação “não foi científica” nem pode ser “levada a sério”.

“As fitas com todas essas conversas são a principal evidência apresentada. E quando eu perguntei qual é a fonte dessas fitas, eles responderam que é o serviço secreto ucraniano. E quando eu perguntei se existem outras fontes, eles disseram “não”, denunciou Niemoller.

O escritor apontou a “estreita colaboração” dos investigadores holandeses com o governo ucraniano. “Quando você faz uma investigação objetiva, você tem de dizer que existe a possibilidade de que os ucranianos hajam feito isso”, ressaltou. “Os ucranianos estiveram investigando a si próprios”.

Sobre as “conclusões” do inquérito, que joga a culpa nos russos, Niemoller disse que o problema desde o início era que os investigadores definiram que “sabiam o que havia acontecido” e que o que tinham de fazer era “procurar evidências” confirmando. “Esta não é uma forma científica de trabalhar. Você tem que verificar todos os cenários possíveis e tem que manter esses cenários sobre a mesa o tempo todo”, concluiu.