Luciana Santos: “A federação é uma inovação na política brasileira”
Em entrevista ao programa Olhar 65 desta quinta-feira (30), a presidenta nacional do PCdoB e vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos, considerou que a possibilidade de partidos se unirem eleitoralmente torna o atual sistema político mais arrojado. “A federação é uma inovação na política brasileira”, ressaltou.
Além da aprovação da federação partidária, Luciana também discorreu sobre a conjuntura política nacional e o 15º Congresso do PCdoB no programa transmitido pelas redes oficiais da legenda na noite desta quinta-feira (30).
A presidenta falou sobre o processo desde a aprovação da federação pelo Congresso Nacional — cuja primeira votação ocorreu ainda em 2015 no Senado — até a derrubada do veto de Jair Bolsonaro à medida, conseguida após muita articulação e diálogo dos comunistas junto aos demais partidos e lideranças, resultando na sessão histórica da segunda-feira (27).
“O PCdoB é um patrimônio do pluralismo democrático”, declarou a dirigente sobre a conquista obtida nesta semana.
“Esta foi, sem dúvida, uma vitória das forças democráticas, um dia histórico de respaldo à Constituição de 1988 que garante o pluralismo democrático no país e as federações vão assegurar esse pluralismo e dar autonomia aos partidos que poderão se aliar por questões programáticas, se assim desejarem”, disse.
Confira abaixo alguns dos principais trechos da conversa, que contou com a condução do secretário nacional de Comunicação, Adalberto Monteiro, e do jornalista Osvaldo Bertolino.
Inovação e renovação política
“A federação é uma inovação na política brasileira. O atual sistema eleitoral impõe uma concentração muito grande de partidos, criando uma espécie de congelamento do sistema partidário do jeito como está. É preciso possibilitar a inovação na política, a renovação, ainda mais quando se trata de partidos ideológicos, programáticos. Esta foi, sem dúvida, uma vitória das forças democráticas, um dia histórico de respaldo à Constituição de 1988 que garante o pluralismo democrático no país e as federações vão assegurar esse pluralismo e dar autonomia aos partidos que poderão se aliar por questões programáticas, se assim desejarem. Com isso, inova a política brasileira, aprimora o sistema partidário e força convergências programáticas, melhorando a representação política”.
Mobilização do partido
“Prestamos nossa homenagem à nossa gloriosa bancada do PCdoB, com oito deputados, que passou meses e meses, noites e dias, fazendo abordagens e convencimento. É uma pequena gigante bancada que jogou um papel inigualável. Honrou a camisa dessa organização centenária”. (…)
“Foi, de fato, uma mobilização integrada do partido, incluindo as direções estaduais. Nossa turma teve uma ordem unida, convencida dessa proposição com determinação e altivez. Aproveito para agradecer a todos que se empenharam nessa vitória. Cada ligação, cada visita, foi de suma importância e foi essa abnegação e determinação que construíram esse resultado; é unidade de ação”.
Batalha para aprovação da federação
“O processo foi uma verdadeira saga. Primeiro, veio o entendimento de que essa era a saída. Fomos buscar na legislação que já existia no Congresso Nacional, no Senado, aprovada em 2015, uma proposição da Comissão de Legislação e Justiça. Essa é uma proposta que já havia, do nosso saudoso Haroldo Lima, não com este mesmo nome de federação, mas com esse mesmo conceito. Resgatamos a proposição e convencemos o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), a quem quero fazer um agradecimento público, de que a gente deveria votar a federação separada do pacote do Código Eleitoral que estava tramitando. Então, buscamos a votação da urgência”.
“Depois, tivemos de pular a barreira de votar a federação junto com o debate do distritão e/ou coligação e primeiro foi votado o sistema eleitoral para depois votar a federação. Votou, foi aprovada e foi para a sanção, sendo vetada pelo presidente. E então veio a luta para marcar a sessão no Congresso numa data dentro de um prazo muito apertado. Soubemos que a sessão estaria marcada para o dia 28, mas não daria tempo da publicação”.
Para se tornar lei e ser válida para 2022 , o projeto da federação teria que ser publicado até o dia 1º de outubro no Diário Oficial. Neste momento, a presidenta e a bancada do PCdoB articularam com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) que antecipasse a votação para o dia 27 de setembro, no que foram atendidos.
Cultivar o convívio democrático
“João Amazonas sempre buscou esse ensinamento político de que é necessário cultivar o convívio democrático no ambiente parlamentar, absorver as diferenças. (…) Vimos, ao longo dessa jornada, o respeito e a consideração à contribuição construída ao longo de décadas e que a bancada do PCdoB conquistou. Somos uma bancada de posições fortes, estamos na linha de frente dos embates políticos. O PCdoB é um patrimônio do pluralismo democrático”.
Luciana, na entrevista, sublinhou que essa capacidade do partido e de sua bancada de se relacionar com as demais forças do congresso nacional em clima de convivência democrática foi também muito importante à aprovação do projeto da federação.
Caráter estratégico
“A federação tem caráter estratégico porque vai ser o exercício de unidade de pessoas que pensam em comum, que têm convergência programática (…). É um esforço necessário ainda mais no país pós-Bolsonaro, quando vai ser preciso muito exercício político de unidade para implantar um plano de reconstrução nacional do Brasil, que coloque a soberania, o crescimento, a geração de emprego como prioridades. A federação vai servir a esse exercício”.
Maior representação política do povo
“Por mais que a gente já tenha passado por muitos momentos da história brasileira de inflexão progressista, de conquistas importantes, essa conquista democrática ainda não logrou ampliar devidamente a representação política institucional dos trabalhadores. O parlamento brasileiro está longe de representar a diversidade do povo brasileiro e principalmente daqueles que são responsáveis pela produção das riquezas do Brasil. Não à toa, o parlamento não tem o prestígio, a popularidade que deveria ter e isso serve para os oportunistas criarem o sentimento da antipolítica. A gente precisa melhorar (o sistema) para fortalecer a democracia, para que o povo se sinta representado. Atualmente, ainda não representa os trabalhadores e trabalhadoras, as mulheres, os negros e outros setores oprimidos do nosso país, embora alguns sejam socialmente majoritários”.
“O Brasil precisa de mais e não de menos democracia. Por isso o PCdoB lutou e seguirá lutando por uma reforma política cada vez mais democrática, estruturante, que ajude a formar um novo ciclo político”.
Federação na prática
“Nossa bancada já tomou a iniciativa de fazer certo desenho do que seria a regulamentação da federação à luz da lei aprovada. Apostamos na construção da frente mais ampla possível do nosso espectro de forças, que caibam os que defendem a democracia, o desenvolvimento, a soberania e a justiça social. A federação não é a frente “Fora, Bolsonaro”, vai além da esquerda. A federação seria entre partidos que têm mais afinidade política e programática, uma ação mais estrutural para a realidade brasileira e para o nosso campo por juntar, num exercício de unidade, os convergentes”.
Frente ampla contra Bolsonaro
“A frente ampla, defendida pelo PCdoB há bastante tempo, vai se impondo. Sempre defendemos que somente amplos espectros da sociedade, das forças política e sociais, poderiam impor derrota a Bolsonaro para que ele pague por seus crimes contra a vida e contra o país, que são inúmeros. E o isolamento de Bolsonaro não para de crescer. O povo não aguenta mais a carestia dos alimentos, dos combustíveis, do preço do gás. O povo quer dar uma resposta política ao genocida Bolsonaro, que levou 600 mil vidas brasileiras. O povo está cansado de todo esse ambiente que a CPI vem revelando, de corrupção na venda da vacina, das ‘rachadinhas’. Esperamos que o dia 2 e o dia 15 de novembro sejam passos para a construção do ‘Fora Bolsonaro’”.
“Alguns dizem: mas foram esses que deram o golpe, foram bolsonaristas. Mas não são mais, estão arrependidos e que bom que seja assim. Quer dizer que vamos estar com essas forças e lideranças em 2022? Não, não quer dizer isso. Mas quer dizer que essas forças têm, hoje, algo muito importante para que a gente realize 2022 com êxito, que é o fato deles hoje serem pelo ‘fora Bolsonaro’ (…). É preciso juntar forças para impor essa derrota. Em todos os momentos de inflexão da história brasileira, a gente só impôs derrotas quando reuniu amplas forças, setores que não tinham a mesma ideia programática da gente”.
15º Congresso: isolar e derrotar Bolsonaro
“Costumo dizer que este é um congresso ordinário realizado em circunstâncias extraordinárias, nos marcos de uma pandemia — por isso será o primeiro congresso virtual — e no qual, pela primeira vez, o Brasil se encontra sendo dirigido por forças de extrema-direita, com impactos concretos na vida do país e em especial dos comunistas”.
“Com a aprovação da federação partidária, conseguimos responder a um importante desafio que havíamos, nós mesmos, colocado para nós no congresso de construir saídas para os dilemas eleitorais que a legislação nos impunha. E essa fase conseguimos. Agora, temos que desdobrar, mas a saída política principal nós já conseguimos no curso do 15º Congresso” .
“O outro foco, que era desmascarar, isolar e derrotar Bolsonaro também vai bem com a participação decisiva de nossas teses, do centro de nossa tática que é a frente ampla. É ela que tem vingado e que vai possibilitar a derrota de Bolsonaro. O 15º Congresso será momento de celebração da vida, de darmos início à comemoração de nosso centenário e será a arrancada de uma grande campanha política que vamos travar para isolar e derrotar Bolsonaro e fazer um PCdoB forte”.
Desafios permanentes
“No ensejo da federação, precisamos sacudir o PCdoB para os desafios da sua construção partidária, do seu enraizamento e capilaridade no seio do povo; estes são desafios permanentes. No embalo dessa grande conquista política, é preciso dar uma virada no nosso fortalecimento, na nossa atuação nas diversas frentes em que procuramos acumular pelo fortalecimento do partido. O 15º Congresso trará um revigoramento muito grande de nossas forças, seja pela possibilidade de virada do contexto político mais geral, seja pelas saídas políticas que encontramos. Vamos, sem dúvida, animar a nossa militância para seguir adiante”.
Assista a íntegra do programa
Por Priscila Lobregatte