A Justiça determinou que a mineradora Vale tem até cinco dias para apresentar um plano de realocação temporária dos indígenas Pataxós e pataxós-hã-hã-hães da aldeia Naô Xohã, localizada em São Joaquim de Bicas, na região metropolitana de Belo Horizonte, que foram atingidos pelo rompimento da barragem de Brumadinho (MG).

A aldeia foi inundada no início do ano, após o rio Paraopeba, já contaminado com metais pesados por causa do rompimento da barragem de Brumadinho, transbordar devido às fortes chuvas na região.

A comunidade perdeu meios de subsistência e meios para fazer seus rituais. A juíza Thatiana Cristina Nunes Campelo, da 13ª Vara Federal de Minas Gerais, apontou que a presença de poluentes na água inviabiliza o retorno do grupo para o local atingido.

A decisão também determina que a Vale deve pagar mensalmente o valor de um salário mínimo a cada grupo familiar da aldeia como forma de auxílio, até que seja efetuada a realocação definitiva dos indígenas.

A decisão se deu após o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) solicitarem à Justiça que a mineradora realocasse os índios. Os órgãos apontam a responsabilidade da Vale, já que a aldeia foi invadida por rejeitos da barragem que se rompeu em 2019 e pertencia à mineradora.

Antes de entrarem com a ação, o MPF e a DPU se reuniram com a Vale, em meados do mês de janeiro, mas a mineradora se eximiu de qualquer responsabilidade no caso.

Após a inundação, os indígenas foram abrigados pela Prefeitura de São Joaquim de Bicas em uma escola municipal da cidade, mas, com o início do calendário escolar, tiveram que se retirar do local.

A aldeia conta com 136 indígenas, entre os quais estão crianças, idosos e grávidas. Sem lugar para irem, eles voltaram para a tribo, ainda suja de lama e metais pesados trazidos pelo rio Paraopeba.

O cacique Arakuã diz que, até o momento, os indígenas receberam ajuda apenas da Prefeitura de São Joaquim de Bicas, além do apoio judicial do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União (DPU).

“Não temos para onde ir. Fomos para a Escola Municipal de São Joaquim de Bicas, tivemos prazo até o dia 24 (de janeiro) para ficarmos lá, porque as aulas iriam começar. Viemos para a linha do trem para dar um recado para a Vale, porque ela cometeu um crime contra o nosso povo, a nossa crença”, explica o líder da comunidade, que voltou para a aldeia após ordem judicial, mesmo com o risco de contaminação.

A lama que poluiu o rio Paraopeba em 25 de janeiro de 2019, com o rompimento da barragem I da mina Córrego do Feijão, da Vale, está ameaçando a propagação da cultura dos povos indígenas. Segundo a cacique Agohó da aldeia Katurãma, os homens estão adoecendo por conta da frustração de não poderem mais pescar.

“Os nossos guerreiros estão adoecidos. Eles se sentem incapazes. Eles que caçam, iam buscar o peixe e hoje não podem fazer isso mais. A gente vê eles de cabeça baixa. As crianças estão menos interessadas na cultura e eu, como cacica, tenho medo que a nossa cultura se perca por um crime que não fomos nós que cometemos”, lamenta a liderança.

A aldeia é formada por 89 adultos e 34 crianças. Enquanto se refrescam com água de mangueira, em coro, os menores respondem que a maior saudade é de tomar banho no rio. O Paraopeba também era o local onde as crianças eram batizadas, ritual que também não é mais realizado.

“O rio era tudo para nós. Era lá que a gente fazia nossos batizados, luau à beira do rio. Hoje, com o desastre da Vale, não podemos mais fazer isso. A gente levava as crianças para purificar o corpo, e hoje não pode. Me sinto triste porque meu filho me chama para tomar banho no rio e fico com o coração partido. Na época, ele tinha 2 anos e, agora, não posso mais levá-lo”, desabafa o índio Aricuri, 27.