Manning se negou a falar ao tribunal de Alexandra, dizendo que já prestou em juízo todos os esclarecimentos no processo

Desde terça-feira (16) a multa diária imposta à presa política Chelsea Manning dobrou de valor, para US$ 1.000, por se recusar a mentir para que o governo Trump consiga condenar o jornalista Julian Assange, cuja extradição da Grã Bretanha está em processo, por ter publicado documentos oficiais norte-americanos comprovando crimes de guerra no Iraque e Afeganistão, inclusive o famoso vídeo do “Assassinato Colateral”. Neste, é visto um helicóptero Apache chacinando, sob ordens do comando central, uma dezena de civis, inclusive dois jornalistas da Reuters, e até um pai que levava o filho à escola e parou para socorrer os feridos.

A perseguição e punição financeira, que em julho já alcançara US$ 18.000 fez com que Manning perdesse o apartamento. Até outubro de 2020, quando se encerra o mandato do júri que arbitrariamente a condenou à detenção enquanto não falar o que eles querem que ela diga, a multa terá alcançado quase meio milhão de dólares.

Assange se encontra em presídio considerado a ‘Guantánamo britânica’, depois de ter sido entregue pelo governo traíra de Moreno à polícia inglesa, com base em que o fato ter ido pedir asilo à embaixada do Equador por temor de extradição para os EUA, foi considerado ‘violação’ de fiança e, ao invés de multado por isso, como é costume, foi sentenciado a quase um ano de cárcere.

Ainda mais absurdo, porque sequer existe uma acusação judicial formal contra Assange, apenas um pedido de investigação de promotores suecos, que reabriram o caso depois que a própria justiça sueca já liberara Assange para partir, após esclarecer que só houve relações consensuais. Uma das acusadoras foi desmascarada por falsidade. A outra, tuitou na época que não queria denunciar ninguém e foi pressionada pela polícia.

De forma cada vez mais kafkiana, tribunais ingleses, para aceitarem uma ordem de prisão ilegal contra Assange, já que não fora emitida por um juiz, fizeram uso da versão em francês da lei europeia. Prisão cujo objetivo central, hoje, conforme o atual editor do WikiLeaks, Kristinn Hrafnsso, é impedir que ele prepare sua defesa em relação à extradição. No establishment norte-americano era enorme o ódio a Assange, com a então secretária de Estado, Hillary Clinton, tendo chegado a sugerir silenciá-lo com “um drone”.

Ressentimento que só aumentou quando o pessoal do WikiLeaks foi essencial para evitar a captura de Edward Snowden, que pôs a nu a vigilância em massa cometida pela NSA no mundo inteiro, e sua publicação em todos os países.

NADA A DIZER

Manning se negou a falar ao tribunal de Alexandra, dizendo que já prestou em juízo todos os esclarecimentos no processo em que chegou a ser condenada a 35 anos, e que foi dela a decisão de vazar os crimes de guerra com que se deparou. Durante quase um ano, Manning foi torturada. No final do governo Obama, sua pena foi comutada após sete anos de cárcere.

Manning já afirmou que não irá abrir mão de seus princípios para testemunhar contra Assange, como o tribunal exige. Em maio, ao ser aprisionada pela segunda vez, depois de uma semana de folga, ela disse ao juiz Trenga que prefere “morrer de fome a mudar minha opinião a esse respeito”. “E quando digo isso, quero dizer isso literalmente”.

Contra Assange, de quem o então diretor geral da CIA e atual secretário de Estado, Mike Pompeo, disse encabeçar um “serviço de inteligência não-estatal hostil” e não protegido pela Constituição americana, já pesam acusações com sentença de até 175 anos, mas segue ameaçado de ser incurso em pena de morte por espionagem. O processo contra Assange correu de forma secreta durante anos.

Enquanto Manning está encarcerada, Eddie Gallagher, que matou um prisioneiro de guerra a sangue frio no Iraque, e o policial racista Daniel Pantaleo que estrangulou até à morte um camelô negro em Nova Iorque em 2014, seguem livres, lépidos e faceiros, com a cumplicidade de autoridades e tribunais norte-americanos.