José Reinaldo: a origem e o caráter do Partido Comunista da China
Dentro de um mês, 1º de julho, os chineses celebram o centenário de fundação do Partido Comunista da China (PCCh), que dirigiu a Revolução Popular no país asiático e conduz a construção de um peculiar socialismo em distintas etapas, percorridas desde a fundação da República Popular, em 1º de Outubro de 1949. Este é o primeiro de uma pequena série de artigos sobre aspectos marcantes da trajetória histórica do Partido Comunista da China.
Por José Reinaldo Carvalho*
O centenário do Partido Comunista da China é acontecimento de envergadura histórica e mundial. Ao celebrar este aniversário, o povo chinês e os povos irmãos no mundo comemoram o surgimento da vanguarda política dos trabalhadores e das massas populares, que tem continuamente desempenhado papel decisivo na luta de libertação nacional e na construção do socialismo.
A história desse partido, hoje com 91 milhões de membros e ocupando a posição de organização dirigente da grande potência chinesa, é o percurso de uma força política que adotou o marxismo-leninismo e o socialismo científico e revolucionário como pensamento guia e soube adaptar na sua ação os princípios dessas teorias às circunstâncias de cada época e às condições objetivas da sociedade chinesa.
O Partido Comunista da China foi fundado em Xangai em 1º de julho de 1921. Entre os seus fundadores estavam os intelectuais Chen Duxiu e Li Dazhao. Mao Tsetung participou como representante da província de Hunan.
Um dos fatos precursores da fundação do PCCh foi o Movimento Quatro de Maio, em 1919, uma irrupção de milhares de estudantes que reivindicavam a unificação da nação, impedida pela fragmentação em regiões dominadas pelos “senhores da guerra”.
O Movimento Quatro de Maio refletia o despertar das lutas dos trabalhadores, massas populares, estudantes e intelectuais, e deixou objetivamente à mostra a necessidade de promover a síntese do movimento espontâneo com o marxismo-leninismo. A tarefa de estabelecer um partido revolucionário de novo tipo da classe trabalhadora estava colocada na ordem do dia, pois correspondia a uma tendência do desenvolvimento histórico. Objetivamente, aquele movimento lançou as bases para a formação do Partido Comunista.
O PCCh surge como um partido marxista revolucionário de vanguarda dos trabalhadores chineses. Na “História Concisa do Partido Comunista da China (1991), assinala-se que o partido abraçou o marxismo, que era uma concepção científica do mundo e uma teoria da revolução social; o leninismo, que foi o marxismo desenvolvido na era do imperialismo e da revolução proletária; e o socialismo científico, que foi a teoria revolucionária concebida no calor da luta contra o reformismo e oportunismo de direita. O Partido Comunista da China foi fundado como resultado de um processo de fusão entre o marxismo-leninismo e o movimento popular, operário e patriótico da época. Guiado por uma teoria de vanguarda, o Partido Comunista da China assumiu a direção do processo de transformação política e social da China e desbravou caminhos desconhecidos.
A fundação do PCCh não está desligada tampouco do contexto mundial da época, quando a Revolução de Outubro na Rússia triunfou e o oportunismo social-democrata da Segunda Internacional fracassou durante a Primeira Guerra Mundial. Não é fortuito que a fundação do PCCh tenha contado com a ajuda da Internacional Comunista, dirigida por Lênin.
O PCCh surge também no quadro concreto da evolução da sociedade chinesa, em que as lutas mais agudas tinham por escopo principalmente a solução da questão nacional, pela verdadeira independência do país, numa situação em que se espalhava o sentimento anti-imperialista e a inconformidade com a dominação neocolonialista da China por grandes potências. Já nos primeiros anos da existência do PCCh, os comunistas chineses souberam interpretar e incorporar o espírito e os valores nacionais da luta pela República Democrática liderada pelo Dr. Sun Yatsen (1866-1925), um líder nacionalista e revolucionário, o principal pioneiro da China republicana. Seu papel foi fundamental na criação da República chinesa, em 1912, e na formação do primeiro governo provisório após a derrubada do último imperador da Dinastia Qing, encerrando quase 6.000 anos de governo imperial.
Sun Yatsen foi o fundador do Kuomintang, o partido nacionalista que durante todo o processo revolucionário, terá, desde 1925, uma relação ora de unidade, ora de conflito com o Partido Comunista. O líder nacionalista defendia três princípios, que os comunistas chineses incorporaram ao seu pensamento socialista científico próprio: nacionalismo, democracia e bem-estar do povo.
Foi a fundação do Partido Comunista da China, a 1º de Julho de 1921, que criou as condições subjetivas para abrir perspectivas históricas ao povo chinês e levar adiante o desenvolvimento da revolução. Nessa luta foi decisivo o papel criador das massas, a direção política e ideológica, organizativa e militar dos comunistas e o papel de Mao Tsetung, a maior figura do século 20 chinês, um dos principais dirigentes do Movimento Comunista Internacional, dirigente teórico e prático da revolução, cujo discernimento político e conhecimento da ciência revolucionária o tornou capaz de integrar a verdade universal do marxismo-leninismo à prática concreta da luta.
Mao Tsetung dirigiu a revolução chinesa desde a década de 1930 até seu triunfo, em 1949, e a primeira etapa da construção do socialismo, até sua morte, em setembro de 1976. Na sua vasta obra, fez reflexões sobre a história e o caráter da revolução chinesa e a natureza do Partido Comunista. No antológico texto “A Nova Democracia”, publicado em 1941, ele destaca o papel da revolução democrática e republicana de 1911 e do Movimento Quatro de Maio (1919), entre outros, como fatos precursores da fundação do Partido Comunista e da Revolução Popular: “Pode-se dizer que a primeira etapa começou nos dias da Guerra do Ópio em 1840, isto é, no tempo em que a sociedade chinesa principiava a modificar-se, de sua forma feudal original, para a forma semicolonial e semifeudal. Durante este período, tivemos a Revolução de Tai-Ping, a Guerra Sino-Francesa, a Guerra Sino-Japonesa, o Movimento Reformador de 1898, a Revolução de 1911, o Movimento de 4 de maio, o Movimento de 30 de maio, a Expedição do Norte, a Revolução Agrária, o Movimento de 9 de dezembro e a atual Guerra Antijaponesa. Todos esses movimentos, de um certo ponto de vista, almejavam a realização da primeira etapa da revolução chinesa. Foram movimentos do povo chinês, em períodos diferentes e com diferentes graduações, tendendo para este objetivo — combater o imperialismo e o feudalismo e lutar pelo estabelecimento de uma sociedade democrática independente. A Revolução de 1911 foi apenas a sua realização num sentido mais concreto. Esta revolução, pelo seu caráter social, era democrático-burguesa e não social-proletária. Ela ainda não foi concluída e exige, assim, nosso continuado esforço, porque os inimigos desta revolução ainda estão extremamente fortes na atualidade. Ao aludir à revolução, dizia o dr. Sun Yatsen: ‘A revolução ainda não está terminada e a ela nossos camaradas devem continuar dando seus esforços’. Referia-se ele a esta revolução democrático-burguesa”.
A geração que celebra o primeiro centenário do Partido Comunista da China é legatária do pioneirismo, da audácia, da lucidez, do heroísmo, da originalidade e criatividade daqueles que o fundaram em 1921, características marcantes que estão presentes também nos atuais membros e dirigentes do Partido Comunista da China nucleados pelo presidente Xi Jinping. Há cinco anos, na celebração do 95º aniversário do PCCh, o presidente Xi, que é também o Secretário Geral do Partido, disse: “O surgimento de um partido comunista em nosso país foi um acontecimento histórico, que mudou profundamente o curso da história chinesa nos tempos modernos, o destino e o futuro do povo e da nação chinesa, e a direção e o padrão do desenvolvimento mundial”.
Uma grande virtude do Partido Comunista da China foi conduzir a revolução tendo o marxismo como referência teórica e tomando em consideração as peculiaridades nacionais, a particularidade de cada momento e etapa. A liderança do Partido Comunista da China teve larga visão estratégica, flexibilidade tática e capacidade de condução da luta. Tamanha habilidade e discernimento fizeram com que fosse possível unir o povo chinês e formar a grande coalizão de forças políticas para enfrentar o inimigo comum, sobretudo nas condições especiais da ocupação japonesa.
Com espírito inovador, o Partido analisou em profundidade a formação social concreta da China e elaborou a estratégia da revolução em etapas, a primeira das quais foi a Nova Revolução Democrática. Este foi um importante aporte dos comunistas chineses ao desenvolvimento criador da teoria revolucionária e uma experiência prática que deixou marcas indeléveis na história da China e do mundo.
É sobre estes outros aspectos que discorreremos nos próximos artigos.
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*É jornalista, editor do Resistência.cc, membro do Comitê Central e da Comissão Política Nacional do PCdoB. Secretário Geral do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz)
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