Baseado no modo de organização das formigas, Wilson imaginou que havia uma "natureza humana" inscrita nos gens

Outra linha de pensamento que naturaliza a história com base na biologia apareceu com a sociobiologia, a “ciência” criada por Edward O. Wilson, professor na Universidade de Harvard (EUA), especialista em formigas e autor de um livro de grande sucesso quando foi publicado, em 1975, no qual tentou aplicar ao estudo dos seres humanos os conhecimentos adquiridos na observação daqueles insetos.

Por José Carlos Ruy*

Já no título, o livro evidencia seu caráter ideológico: “Da natureza humana” (Wilson: 1981): supõe que há uma natureza humana à margem da atividade prática do homem. E pretende chegar a “uma descrição da história cada vez mais precisa”, na linha de grandes pensadores do passado que investigaram as leis de seu desenvolvimento. Citou, “dentre os mais inovadores”, Vico, Marx, Spencer, Spengler e Toynbee, que idealizaram “leis da História que pudessem prever algo do futuro da humanidade”, mas o resultado de seus esforços foram “modestos porque sua compreensão da natureza humana não tinha qualquer base científica.”

Defeito que, a partir da genética, Wilson garantiu corrigir. Nas condições modernas, escreveu, é possível basear a compreensão da história em conhecimentos científicos. “Agora há razões que sustentam a tese de que a cultura de cada sociedade viaja numa das trajetórias evolutivas de um conjunto cuja disposição ou arranjo global é restringida pelas regras genéticas da natureza humana” (Wilson: 1981).

A sociobiologia pretendia estudar as sociedades à luz da teoria neodarwinista da evolução. “A sociobiologia aparece como o caso mais explícito de uma aplicação do neodarwinismo” (Blanc: 1994). Para Wilson, o objetivo do comportamento social seria o de propagar ao máximo algumas variantes genéticas no interior das populações.

A acolhida da sociobiologia pela comunidade científica refletiu ideologicamente a hegemonia do pensamento conservador. Mas encontrou também forte resistência, sendo logo denunciada como reacionária e ligada ao darwinismo social. (Blanc: 1994).

Wilson se apegou à noção de uma inexistente e fantasmagórica natureza humana que, supõe, estaria inscrita nos gens, que a determinariam e carregariam através dos tempos, numa história de aparência científica (dada pela genética) mas tão mitólógica como aquelas baseadas em ações não produzidas pelos homens em sua atividade prática e nas relações com os demais – mas resultantes de alguma entidade fantástica, à margem e alheia à atividade concreta dos homens e sua ação no mundo. Supõe que todos os seres humanos a teriam gravada – sabe-se lá por quem – nos gens!

Essa pretensão absurda alinhou Wilson aos escritores que encaram o comportamento humano como fruto da biologia (no caso, da genética), e dão uma roupagem sofisticada e pretensamente “científica” para lendas ultrapassadas sobre o ser humano.

Referências

Blanc, Marcel. Os herdeiros de Darwin. São Paulo, Editora Scritta, 1994.

Wilson, Edward O. Da natureza humana. SP, T. A. Queiroz, Editor / Edusp, 1981

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