Jandira Feghali: A sobrevivência da democracia
A Constituição brasileira é jovem e já teve seu texto original nos últimos anos retalhado por interesses do capital em comunhão com muitos parlamentares – inclusive, o capitão da reserva recém-eleito. A emenda 95, que estabelece o teto de gastos e teve o sim de Bolsonaro, se contrapõe à essência do pacto universalista garantido nos capítulos da educação e da seguridade social, impressos pelos constituintes em 1988 por demanda de milhões de brasileiros.
As garantias e direitos individuais e coletivos, o pluralismo politico, o direito de livre associação, a liberdade de organização partidária, a busca de solução pacífica de conflitos, a liberdade de expressão, de imprensa, de culto, de reunião. A indelével proibição de tortura e maus tratos, a liberdade até o transito em julgado, a independência dos poderes, a estrutura federativa, o Estado democrático de direito. O direito de manifestação e de greve, a função social da propriedade, o direito à terra e ao teto, salário mínimo para necessidades fundamentais. Inadmitida discriminação por cor, credo, ideologia, gênero e orientação sexual. As forças armadas, a defesa nacional, contra invasão estrangeira. Todos esses são exemplos importantes e avançados da nossa Carta Magna!
É fato que a República que emergiu das urnas em 2018 tem gosto e cheiro de atraso e de submissão. A expressão restritiva à democracia, às liberdades, a força do preconceito e do ódio não combinam com o Brasil, nem com sua lei maior. Um presidente como Bolsonaro, que diz o óbvio (“defender a Constituição”), será cobrado a fazer exatamente o que se espera no que tange a proteção de direitos individuais e liberdades de expressão, pensamento, crença, direitos e organização partidária. Ao emitir opinião sobre os movimentos sociais, como não pensar que fará uso de instrumentos repressivos, como a lei antiterrorismo, para tentar enquadrar tais lideranças?
Nos poucos dias em que ensaia a formação de seu governo, já prometeu implodir politicamente o Ministério do Trabalho a partir de janeiro de 2019 e aprovar a reforma da Previdência. E isso quer dizer, no mínimo, a destruição de direitos e a entrega do povo a um Estado negligente e privatizado. Como acreditar que defenderá a Constituição?
Enganam-se os que propagam que nossas críticas são uma aposta e desejo pelo pior. Apenas não somos hipócritas e temos a obrigação de analisar e alertar os possíveis cenários. Nossa resistência é a favor da liberdade, da democracia e dos direitos. Nossa posição é clara. Defender as conquistas já inscritas na Constituição, nas leis e na vida! Esse é nosso papel. É o papel de todo brasileiro e brasileira que entende que nossa jovem democracia foi conquistada com muito esforço. Que deve ser sempre aprimorada, mas jamais afrontada.
O “maldito caminho” não deve nunca mais ser trilhado. Respeito o resultado das urnas, sim. Abrir mão de nossa justa resistência, não! Agora, mais do que nunca, é necessário somar forças, de forma ampla, sem exclusão ou disputa de protagonismos, tendo como meta a luta maior por liberdade e direitos.