Os “isentos” quando se manifestam, sempre me fazem lembrar o velho e conhecido poema de Bertold Brecht e me impulsiona a fazer a pouco original citação: “primeiro levaram os negros…, os operários, os desempregados e eu não me importei com ninguém. Agora estão me levando, mas já é tarde. Como eu não me importei com ninguém, ninguém se importa comigo”.

Por Jandira Feghali*

Fico pensando se teria algo mais sério e grave para acontecer, que pudesse mexer com a consciência de uma parcela da sociedade. Nem falo dos que já se robotizaram, mas dos que ainda fingem se incomodar. Quase meio milhão de mortos já não seria suficiente? O estímulo à transmissão do vírus como método de imunização em substituição a vacina, levando a morte de centenas de milhares de pessoas não seria crime? Recusar a compra das vacinas em agosto de 2020, podendo ser o primeiro país a vacinar, também não se constitui em outro crime gravíssimo? Deixar pessoas sem oxigênio morrendo asfixiadas sobre os leitos é crime de omissão? Fazer a sociedade acreditar em falsos medicamentos imaginando estar protegida e sair sem máscaras para as ruas, o que seria?

Poderia parar por aqui, não fossem os frequentes abusos de autoridade contra quem denuncia esses crimes, a violência física e política nas ruas e nas redes contra mulheres, inclusive com mandatos, o empoderamento dos guardas de esquina contra a liberdade de expressão e, agora, a forte sinalização dada pelo comandante do exército, que tenta colocar a instituição de joelhos diante de um mau capitão.

As FFAA brasileiras são instituições de Estado e devem cumprir a Constituição. Nenhum governo ou presidente da República pode submetê-las à sua vontade política contra a carta magna. O comandante do Exército, General Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, ao não punir o General Pazuello, surpreendeu negativamente a sociedade brasileira, o parlamento, os comandantes das outras forças e, principalmente, os seus subordinados.

A Constituição é muito clara, em seu artigo 142, quando diz que as Forças Armadas são nacionais , permanentes e regulares com base na disciplina e na hierarquia. Nos incisos IV e V estão expressas a proibição, a militares da ativa, à sindicalização, à greve e à atividade político partidária. O General Pazuello, general da ativa, ex-ministro da saúde, afrontou a Constituição, a CPI e o bom senso ao participar de um ato político e ainda sem máscara em atividade que não respeitou qualquer medida sanitária.

A não punição sinaliza algo muito grave. Que o comando do Exército fragilizou os pilares da hierarquia e disciplina pelos quais deveria prezar e que Bolsonaro tenta quebrar desde que se sentou na cadeira de presidente, numa clara intenção de romper a sustentação constitucional e democrática do Estado de direito. General Paulo Sérgio, nesses momentos é melhor arriscar o cargo e manter a autoridade, do que ficar nele sem ela.

A “milícianização” da segurança pública, a autonomia das polícias em relação aos governadores são induções permanentes e autoritárias do Senhor Bolsonaro, que busca permanentes rupturas. Neste ambiente, a democracia corre riscos.

Na Câmara, estamos tentando coletar assinaturas e pautar uma proposta de emenda constitucional da deputada Perpétua Almeida PCdoB/AC, que busca garantir a equidistância dos militares em relação à atividade político partidária impedindo que a Instituição se politize e deixe de ser uma estrutura de Estado em defesa do país.

Com sinais autoritários tão visíveis, não devemos nos manter no mesmo lugar. É preciso que muitas vozes se levantem em jornadas democráticas, com amplas forças deste país, que não aceitam retrocessos. Este país conhece o significado da falta de liberdade e lutou muito para reconquistá-la. Não nos vencerão pelo cansaço, nem pela falta de capacidade de enxergar o que está acontecendo, e muito menos de lutar por este país.

Quando a democracia está em jogo, como ficam os isentos???

 

*Jandira Feghali é médica e deputada federal do PCdoB-RJ

 

Artigo originalmente publicado no site Brasil 247

 

(PL)