Israel censura e confisca filme sobre o massacre de Jenin
O tribunal israelense – Corte Distrital de Lod – sentenciou, no dia 8 de janeiro, a proibição da exibição em todo o país do filme “Jenin, Jenin”, sobre as atrocidades realizadas pelas tropas israelenses neste território palestino ocupado e ordenou o confisco de todas as suas cópias.
Em “Jenin, Jenin” se vê a execução sumária, o despejo indiscriminado de bombas e mísseis sobre gente indefesa, fazer de alvo tudo o que se move. Agora se decide proibir que isso seja divulgado ou exibido.
Produzido em 2002 pelo cineasta palestino-israelense Mohammad Bakri logo após a invasão do começo de abril, o documentário, Melhor Filme no Festival de Cinema Internacional de Cartago, é uma contundente denúncia dos crimes perpetrados pelo Estado israelense durante a falsamente denominada “Operação Escudo Protetor”. Nela, idosos, crianças e mulheres grávidas – como aparecem dando depoimentos – não foram poupados da barbárie dos invasores.
Tendo despertado um tsunami de repercussões nestes 18 anos, ao elevar o tom em defesa dos direitos humanos dos palestinos, com riqueza de detalhes e depoimentos sobre o massacre da população civil, “Jenin, Jenin” também tem resultado numa longa queda de braços e impasses jurídicos.
De acordo com o tribunal, o cineasta não teria contado a verdade, mas homenageado um terrorista palestino das Brigadas de Mártires de Al-Aqsa. A “Justiça” dos ocupantes também determinou que Bakri pague 175.000 shekels israelenses (aproximadamente US$ 60.000) como “compensação” pelos soldados que entraram com ações judiciais contra o filme, além das custas judiciais e despesas no valor de 50.000 shekels israelenses (aproximadamente US$ 16.000).
Para o advogado de Bakri, a decisão do Tribunal estimula e consente o incitamento contra o seu cliente, permitindo, de forma inédita, a aceitação de um processo mais de quinze anos após a exibição do filme, mesmo havendo no país um estatuto de limitações, inferior a este período.
O filme já havia sido exibido na Cinemateca de Tel Aviv e em Jerusalém após o seu lançamento em 2002, depois de ter sido proibido. Na sequência dessa decisão, Muhammad Bakri foi ao Supremo Tribunal de Justiça, explicando o quanto a sentença é injusta e restringe a liberdade de expressão e criatividade. Em novembro de 2003, o Supremo Tribunal de Justiça revogou a proibição de exibição e permitiu que o filme fosse exibido novamente.
O objetivo do governo israelense é ocultar uma paisagem que, conforme a reportagem do Le Monde Diplomatique “desafia qualquer descrição”. “Uma encarnação do horror, uma visão de após-furacão. Casas destruídas, total ou parcialmente, restos de cimento armado e de ferro, entremeados de fios elétricos. Carros reduzidos a pó por tanques ou mísseis acrescentam uma dimensão bárbara a esse espetáculo assustador. Um cheiro forte de cadáveres flutua sobre os escombros. Nada resta da infraestrutura”. “Um homem cava a terra com uma pá, enquanto o filho afasta os escombros com as mãos. Procuram os membros da família que foram soterrados vivos”, prossegue, “o crime de guerra como norma”.
Em seu depoimento no documentário, um dos sobreviventes afirma que os autênticos derrotados são os israelenses, “pois meu filho de oito anos já não tem medo dos seus aviões e, para mim, é uma conquista superar este medo”. E acrescenta: “Saber diferenciar os calibres das balas das suas armas, conhecer todos os tanques, os mísseis M-16, saber o que é uma Kalashnikov, o que é a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Sempre tememos que nossos filhos se traumatizem, mas não… Aposto que se perguntar a uma criança o que opina da invasão, ela te responderá”. E uma menina aparece na tela: “Não temo a esses covardes!”.
Sobre o silêncio cúmplice da grande mídia, a mesma que hoje exalta as vacinas que inundam Israel e são enviadas minguadamente até a Palestina, e mesmo isso, sob intensa pressão internacional, o escritor Eduardo Galeano nos alertava acerca da informação global, em seu livro Bocas do Tempo. “Poucos meses depois da queda das torres gêmeas, Israel bombardeou Jenin. Este campo de refugiados palestinos ficou reduzido a uma imensa cratera, cheia de mortos debaixo das ruínas. A cratera de Jenin tinha o mesmo tamanho que a das torres de Nova Iorque. Mas, quantos a viram, além dos sobreviventes que revolviam os escombros à procura de sua gente?”