Inpe: governo oculta aumento no desmatamento e desmonta monitoramento
O governo de Jair Bolsonaro escondeu o aumento de 8% na destruição do Cerrado. Entre agosto de 2020 e julho de 2021, o Inpe – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais registrou 8.531 km² de desmatamento no bioma. Os dados, que correspondem a uma área equivalente a sete vezes a cidade do Rio de Janeiro, foram mantidos por baixo dos panos, e sua divulgação só ocorreu na passagem de 2021 para 2022. Os dados são os maiores desde 2015. Com Bolsonaro à frente da Presidência, a devastação do Cerrado aumentou 17%.
A situação é semelhante ao que aconteceu na Amazônia, quando as cifras alarmantes da devastação da região também foram omitidas. De acordo com o Ministério da Ciência e Tecnologia, os números foram repassados ao Inpe em 6 de dezembro, mas só foram revelados no apagar das luzes de 2021, sem que houvesse qualquer registro anterior sobre o assunto.
Para agravar essa realidade, o Brasil vai ficar sem parâmetro sobre os números da destruição no Cerrado a partir de abril. Alvo da política de desmonte e sucateamento de verbas para impedir a divulgação dos dados desastrosos do atual governo, o órgão foi obrigado a desmobilizar a equipe de pesquisadores que atuava no monitoramento do bioma, e os dados devem ser mantidos até o citado mês. Após, o projeto será interrompido.
“É um projeto importante para acompanhar a questão hídrica, a agricultura. É um projeto de baixo custo se comparado ao valor que esses dados têm para o mercado, mas não temos investimento”, afirma Cláudio Almeida, coordenador do programa de monitoramento da Amazônia e demais biomas.
O Inpe informou que a verba de manutenção da equipe de monitoramento do Cerrado acabou em 31 de dezembro e o Instituto não dispõe de orçamento para a continuidade do programa. Para a sua manutenção, seriam necessários R$ 2,5 milhões ao ano.
O projeto era mantido com financiamentos do Forest Investment Program (FIP), administrado pelo Banco Mundial desde 2016. A verba de US$ 9 milhões acabou em dezembro. Os recursos eram repartidos entre o Inpe, destinados à pesquisa, além de duas outras universidades.
“Nós conseguimos organizar um excedente de orçamento para manter o monitoramento até abril, mas já não temos mais recursos. Manteremos até abril com muito menos que o necessário”, afirma Almeida.
São necessárias 20 pessoas para manter o projeto. Desde 2017, a equipe faz monitoramento diário e balanços anuais sobre o Cerrado com uso do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes) e do Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter).
A taxa medida pelo Inpe e a porcentagem de aumento se baseou nos novos limites do bioma, modificados pelo IBGE em 2019. Segundo o Instituto, o Maranhão lidera os índices da destruição, com 2.281 km² de desmatamento, seguido pelo Tocantins (1.710 km²) e Bahia (925 km²). Esses três estados, juntos com o Piauí, possuem as maiores porções de Cerrado e compõem a fronteira agrícola da chamada Matopiba (nome formado pela junção das primeiras sílabas desses quatro estados).
O Cerrado concentra oito nascentes das 12 bacias hidrográficas brasileiras, por isso é considerado a “Caixa d´água” do país, e é lá onde se registra a maior expansão da produção de grãos do Brasil. A atividade foi a responsável por destruir quase 50% da cobertura original do Cerrado.
O aumento na devastação desse bioma é preocupante. Ao desmatar a vegetação nativa para dar lugar à soja e ao milho, as raízes profundas desse ecossistema – que fizeram com que ele fosse conhecido como “floresta de cabeça para baixo” – também são perdidas, tendo como consequência a menor disponibilidade de água para as importantes bacias hidrográficas que o Cerrado abriga.
Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o Agronegócio estima para a safra até 2030/2031 a expansão da área de plantio no entorno do Matopiba de pouco mais de 8 milhões de hectares atualmente para algo próximo entre 9,3 e 11,6 milhões de hectares.
Outro fator importante, é que O Cerrado é responsável por cerca de 50% de toda a vazão da bacia do Rio Paraná, que abastece Itaipu. Já as regiões do São Francisco, do Parnaíba e do Paraguai – esta última ligada ao Pantanal – têm uma correlação hidrológica ainda maior, pois o bioma responde por aproximadamente 94/%, 105% e 153%, respectivamente, de toda o volume de água. Assim, a falta de chuva no Cerrado reflete no país inteiro.