A procuradoria chilena anunciou que apresentará acusações contra 14 carabineiros

O Tribunal de Garantia de Santiago do Chile acolheu uma denúncia contra o presidente Sebastián Piñera por responsabilidade em crimes contra a humanidade ocorridos durante os protestos que deixaram ao menos 20 mortos no país.

Entre as barbaridades cometidas pela repressão, tiros de balas antidistúrbio foram direcionadas contra os olhos de manifestantes. 28 perderam totalmente a visão em pelo menos um dos olhos. A gravidade é tal que a Sociedade Chilena de Oftalmologia fala de uma “emergência sanitária”.

De acordo com a organização, de 19 de outubro a 4 de novembro foram atendidos 136 pacientes com Trauma Ocular Severo. Em 61,4% dos casos, os pacientes tiveram lesões que reduziram sua capacidade visual a de 0 a 10%.

Diante das denúncias, o juiz Patricio Álvarez expediu parecer no qual está registrado que “Admite-se a tramitação da ação interposta; remete-se ao Ministério Público”, ordenando que uma investigação seja iniciada.

A ação foi movida contra o presidente pela “responsabilidade que lhe cabe, como autor, como chefe de Estado e de todos os que resultem responsáveis como autores, encobridores e/ou cúmplices de crime contra a humanidade”, destacou o documento apresentado em Santiago por advogados representando organizações de direitos humanos.

 

O Instituto Nacional de Direitos Humanos (INDH), que centralizou os processos, interpôs 181 ações judiciais por homicídio, torturas e violência sexual supostamente cometidas por policiais.

“Assassinatos ilegítimos, físicos, mentais e sexuais, tortura e restrições foram cometidos, além de abuso sexual, estupro, privação arbitrária da liberdade, em locais não autorizados para esse fim”, denuncia o INDH no processo aberto.

Os advogados ainda acrescentam que o governo de Piñera também é responsável por “detenções seletivas de pessoas, prisões ilegais como resultado de encontrar pessoas em circunstâncias de desobediência civil; toque de recolher decretado de forma ilegal; detenções no domicílio de pessoas; privação de liberdade física”.

PESSOAS COM VISÃO DESTRUÍDA

A denúncia inclui ainda “mutilação de membros importantes e destruição do globo ocular de mais de 150 pessoas”, segundo um comunicado do Medical College, informou a rádio Bío Bío. Os protestos deixaram 20 mortos, sendo pelo menos cinco deles decorrentes de ações de agentes do Estado, agredindo manifestações que tiveram como estopim o aumento da passagem de metrô.

De acordo com o Instituto Nacional de Direitos Humanos, 1.778 pessoas ficaram feridas e cerca de 5 mil foram detidas até a quarta-feira (6). O presidente chileno, por sua vez, disse apenas que não há o que esconder diante de todas as denúncias. “Estabelecemos total transparência nos dados (sobre a violência policial), porque não temos nada a esconder”, finalizou.

Paulina Acevedo, porta-voz do Observatório Cidadão que coordenará o trabalho da Organização Mundial Contra a Tortura (OMCT) no Chile, disse que apresentará suas conclusões na próxima segunda-feira. Outros nove organismos internacionais de Direitos Humanos, chegaram ao Chile “para escutar testemunhos de vítimas de possíveis violações de direitos humanos”.

Mesmo assim, com os abusos expostos abertamente e sem contestação, o presidente reiterou seu total apoio aos Carabineiros (Polícia). Nos primeiros nove dias do conflito, as tropas policiais patrulharam as ruas e agrediram os manifestantes, amparadas pelo estado de emergência decretado pelo governo.

A procuradoria chilena anunciou que apresentará acusações contra 14 carabineiros “por tortura cometida contra duas pessoas”, uma delas menor de idade.

Em ambos os casos “temos vídeos que sustentam as versões das vítimas e temos também as constatações das respectivas lesões”, afirmou o procurador Manuel Guerra.

A Comissão Interamericana dos Direitos Humanos (CIDH) pediu ao governo autorização para fazer uma visita ao país para acompanhar a situação dos direitos humanos, após a onda de protestos.

“Por solicitação de uma centena de organizações, instituições e movimentos de direitos humanos do Chile, a CIDH formalizou o pedido de anuência ao Estado para uma visita ‘in loco’ de observação sobre a situação geral dos Direitos Humanos, no marco dos protestos sociais”, anunciou a Comissão, nesta quarta-feira.

Após duas semanas e meia do início dos protestos, na quarta-feira, 6, centenas de jovens se manifestaram no centro comercial Costanera Center, na entrada do distrito financeiro numa das áreas mais abastadas da capital chilena – bairro até então à margem das manifestações no Chile.

A polícia isolou o local e a administração do local decidiu fechar as portas por volta do meio-dia, após liberar a saída dos funcionários, para isolar o protesto contra as reformas sociais e contra o governo.