Huawei lança seu HarmonyOS e China supera bloqueio dos EUA
A Huawei, a gigante chinesa das telecomunicações, apresenta nesta quarta-feira (2) seu próprio sistema operacional, o HarmonyOS, feito concretizado menos de dois anos após a Huawei ser bloqueada e perseguida pelo governo Trump, política que não mudou sob Biden
Assim, a Huawei logra, em tempo recorde, quebrar o monopólio de praticamente 99% exercido pelas norte-americanas Google, com o Android, e Apple/iOS, e marcando um gol de placa no projeto da China de autossuficiência na alta tecnologia e avanço de seu desenvolvimento soberano, consagrados nos 14º e 15º Planos Quinquenais, recém aprovados.
O projeto havia sido revelado em agosto de 2019, após a proibição da instalação do sistema Android nos novos celulares da Huawei, boicote acompanhado pelo corte no fornecimento de semicondutores e veto até do uso de máquinas ou processos norte-americanos para terceiros fornecerem chips à empresa chinesa.
“Um ponto de viragem histórico”, comemorou o Global Times, citando um pesquisador, Zhang Yi. “Isso envia o sinal de que as empresas chinesas têm a capacidade de superar o bloqueio tecnológico dos EUA, desde que insistam na inovação independente”.
“O mito da tecnologia dos EUA não é imbatível como muitos pintam”, sublinhou.
O Harmony é “sem dúvida o maior empurrão da Huawei para construir seu próprio ecossistema de software”, assinalou o Diário do Povo, principal jornal chinês.
Com o tamanho da população chinesa e o grau de utilização dos recursos digitais a que chegou, parece que o tiro de Trump vai acabar saindo pela culatra.
“Estamos construindo o HarmonyOS e convidando mais desenvolvedores estrangeiros para se juntarem ao nosso ecossistema, a fim de quebrar este monopólio”, disse Wang Yanmin, responsável pelo desenvolvimento do ecossistema global da Huawei.
Assédio do 5G
A Huawei se tornara o alvo preferencial do ataque do establishment norte-americano para deter o assombroso progresso da China, exatamente por ter assumido a liderança na questão chave do sistema 5G de redes digitais de alta velocidade – com soluções mais avançadas e mais baratas – e por estar desenvolvendo a Inteligência Artificial. De quebra, ainda havia ultrapassado a Apple nos celulares vendidos.
Desse ataque, sequer escapou a executiva do grupo, e filha do fundador da Huawei, Meng Wanzhou, retirada de um voo de escala em Vancouver, acusada de violar sanções unilaterais e ilegais dos EUA contra o Irã e por isso sob ameaça de extradição.
O pretexto para o veto de Washington à Huawei não podia ser mais cínico: ‘evitar a espionagem’ pelos ‘comunistas chineses’ dos demais países – quando, desde Edward Snowden, o que foi relembrado agora com o escândalo da cumplicidade dinamarquesa, é amplamente sabido que quem fez e faz isso é a Agência Nacional de Segurança (NSA) norte-americana, que grampeia líderes dos demais países, empresas concorrentes e cidadãos comuns, dia e noite.
Sob a pressão dos EUA, países como Austrália, Reino Unido, Canadá, Japão e Suécia obstruíram a participação da Huawei nas redes de telefonia móvel de quinta geração. No Brasil, a Huawei pode participar do leilão do 5G depois de meses de ensaio de veto de Bolsonaro, mas não na rede do próprio governo.
Sob a investida de Trump, foi um ano difícil para a Huawei que, sem os semicondutores norte-americanos vetados, acabou caindo de primeiro para sexto, entre os maiores fabricantes de smartphones do mundo.
Ainda assim, de acordo com o órgão da ONU para a propriedade intelectual (OMPI), a Huawei foi, no ano passado, pelo quarto ano consecutivo, a maior requerente de patentes internacionais, com 5.464 pedidos. O que desmoraliza aquela conversa de Washington sobre “roubo da propriedade intelectual”.
Dupla circulação
Com a China transformada na ‘fábrica do mundo’, com uma infraestrutura pujante, tendo acabado de tirar da pobreza extrema os últimos 100 milhões de habitantes, se tornado o primeiro parceiro comercial da maioria dos demais países e sendo já a maior economia do planeta sob o critério de paridade de poder de compra, a questão que volta e meia ressurge é se os Estados Unidos perderão ou não sua primazia, vista nos últimos 25 anos de ‘excepcionalismo’, e que papel pode jogar nisso a corrida tecnológica em curso.
Enquanto a China endossou na atual temporada legislativa a definição de aplicar o conceito da dupla circulação ao progresso do país, em que a sustentação das exportações complementa o dinamismo do mercado interno, o maior do mundo, o governo Biden segue sem saber quando terá desembaraçado o caminho, no Congresso, para a aprovação de seu plano de reconstrução da infraestrutura. Item no qual indiscutivelmente a China já passou bem à frente.
Até aqui, Washington se fiou nos gargalos que foi deixando na fronteira tecnológica, que cuidara para que ficassem na mão dos seus monopólios. Como mostrado dramaticamente no bloqueio de semicondutores para os fabricantes chineses concorrentes e do Android para a Huawei.
Mas a China se mostra determinada, exatamente, a eliminar tais gargalos, como já fez no 5 G e está fazendo na exploração espacial, nos supercondutores, nos materiais compostos, na Inteligência Artificial, Fusão Nuclear e Computação Quântica.
Sendo que, nesse aspecto, sua grande vantagem é ser uma sociedade baseada na ciência e no planejamento da economia. Não apenas seu mercado interno é gigante, como também a capacidade do país de gerar mão de obra especializada e de se unificar por uma causa.
As universidades chinesas formaram 4,7 milhões de estudantes em ciência e tecnologia, contra 568 mil nos EUA, em 2017, de acordo com o Fórum Econômico Mundial. A previsão é de que a defasagem irá aumentar muito até 2030.
Aliás, do ponto de vista dos avanços tecnológicos recentes da China, o que não faltou foram boas notícias nas duas últimas semanas. A construção da estação espacial chinesa começou, o rover está mandando fotos de Marte, o “sol artificial” chinês – um protótipo de reator de pesquisa de fusão nuclear – bateu novo recorde mundial, alcançando 120.000.000 de graus Celsius por 101 segundos na sexta-feira, e o país anunciou o maior túnel de vento do mundo, para pesquisa de foguetes hipersônicos com 30 vezes a velocidade do som. Em tempo: na província de Shanxi, no norte da China, foi iniciada na semana passada a construção de uma linha de testes para trens de levitação magnética (maglev), com velocidade de 1.000 km/h.