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Mais de 400 grupos progressistas norte-americanos instaram o presidente Joe Biden a dar fim à obstrução dos Estados Unidos na Organização Mundial de Comércio (OMC) à quebra emergencial das patentes das vacinas contra a Covid, política iniciada pelo antecessor Trump, e que está inviabilizando a rápida e eqüitativa produção e distribuição global de vacinas, testes e tratamentos contra a pandemia.

Os signatários da carta aberta a Biden enfatizaram a urgência do combate ao “apartheid das vacinas”. A OMC estará se reunindo nesta segunda-feira e terça-feira, e a questão, já proposta em outubro pela Índia e a África do Sul, deve voltar à pauta. Basicamente, sua adoção – já prevista pelo próprio tratado TRIPS de propriedade intelectual – vem sendo barrada por um pequeno grupo de países ricos, com os EUA à frente.

Mais de 100 nações já endossaram essa renúncia emergencial às patentes. O que inclusive já tem o precedente no caso da pandemia de Aids na década de 1990, medida que permitiu a rápida difusão dos novos antivirais.

A China, um dos países com maior número de vacinas aprovadas e um dos maiores fabricantes do mundo, desde o início tem convocado a tornar o imunizante um “bem público global”.

A coalizão de entidades de defesa da saúde e dos direitos divulgou na sexta-feira uma carta aberta conclamando Biden a reverter a obstrução “perigosa e autodestrutiva” do governo Trump ao esforço para encerrar rapidamente o desastre do coronavírus, pela suspensão temporária dos direitos exclusivos da Big Pharma sobre testes, tratamentos e vacinas – aliás, desenvolvidos com enormes subsídios públicos.

Como denunciam as entidades, apesar de ter tido a oportunidade de romper com a nefasta política de Trump em duas reuniões recentes do comitê da OMC, o governo Biden manteve a oposição dos EUA à proposta da Índia e da África do Sul – o que, pelas tendências atuais, os países mais pobres do mundo serão forçados a esperar até 2024 pela imunização em massa, causando sofrimento e morte desnecessários e gerando mais de US $ 9 trilhões em perdas econômicas.

“Como especialista em lei de propriedade intelectual e acesso a medicamentos que salvam vidas, posso garantir ao governo Biden que as barreiras de propriedade intelectual são reais e estão impedindo milhões de pessoas em todo o mundo de ter acesso às vacinas contra a Covid-19 que salvam vidas”, afirmou o Brook Baker, analista sênior de políticas da Health GAP e professor de direito da Northeastern University, durante a coletiva de imprensa.

As entidades sublinharam que o acesso de todos, e não apenas os países ricos, às vacinas é uma necessidade imperiosa dos próprios países ricos. Como assinalou a deputada Jan Schakowsky, “o acesso equitativo é essencial”. “Nossa economia globalizada não pode se recuperar se apenas partes do mundo forem vacinadas e tiverem proteção contra o vírus. Devemos disponibilizar vacinas em todos os lugares se quisermos esmagar o vírus em qualquer lugar.” Ela ressaltou ainda que as novas variantes do Covid-19, que mostram mais resistência às vacinas, “provam que mais atrasos na imunidade em todo o mundo levarão a mutações mais rápidas e mais fortes.”

“Como exemplo do “vasto abismo de desigualdade” criado pela concessão a “apenas um punhado de corporações farmacêuticas gigantes” do controle sobre as tecnologias de salvamento “de que todos precisamos”, apresidente da Oxfam America, Abby Maxman, observou que os EUA, com apenas 4% da população mundial, comprou quase metade do fornecimento total esperado da Pfizer em 2021.

O que se soma à denúncia do secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, de que 10 países ricos açambarcaram 75% das vacinas Covid-19 do mundo, enquanto as pessoas em mais de 130 países não receberam uma única dose.

“Em vez de fatiar a torta de vacinas existentes ainda mais finamente, precisamos compartilhar a receita para que tenhamos o suficiente para todos”, sublinhou Maxman. “Precisamos de uma vacina gratuita para todas as pessoas em todo o mundo, que seja distribuída de forma justa com base na necessidade e não na nacionalidade ou capacidade de pagamento.”

O antropólogo médico Paul Farmer, cofundador da Partners in Health, deixou claro que “o mundo não tem tempo para esperar pela distribuição usual, lenta e desigual de tratamentos, diagnósticos e vacinas”.

“Podemos aprender com os movimentos globais de AIDS e garantir que as leis de patentes não bloqueiem o acesso a terapias que salvam vidas para os pobres”, acrescentou Farmer. “É uma história semelhante para as vacinas, que, no caso da Covid-19, temos a sorte de ter e em tão pouco tempo”.

Ecoando o apelo de Farmer para aprender com as epidemias anteriores, Yuanqiong Hu, co-coordenador de políticas da Campanha de Acesso dos Médicos Sem Fronteiras, disse que “os governos não devem desperdiçar esta oportunidade histórica e evitar repetir as dolorosas lições dos primeiros anos da resposta ao HIV/AIDS.”

A isenção do TRIPS, acrescentou Hu, “daria aos países mais maneiras de enfrentar as barreiras legais para maximizar a produção e o fornecimento de produtos médicos necessários para o tratamento e a prevenção da Covid-19. Defender a proteção do monopólio é a antítese do atual apelo aos medicamentos da Covid-19 – e as vacinas devem ser tratadas como bens públicos globais. “

“Os Estados Unidos devem parar de bloquear a isenção do TRIPS [quebra de patentes] na OMC para compartilhar a vacina com o mundo em desenvolvimento e evitar a morte de nossos irmãos vulneráveis no mundo em desenvolvimento”, destacou a irmã Simone Campbell, diretora executiva da NETWORK, rede de católicos pela Justiça Social, em declaração ao portal Common Dreams.

“Se não conseguirmos a isenção, nós, nos Estados Unidos, acredito, teremos sangue nas mãos e não podemos permitir que isso aconteça. Vamos mudar isso”, ressaltou.

Ela também chamou a atenção para a natureza pública dos testes, tratamentos e vacinas da Covid-19, registrando que “o governo dos Estados Unidos investiu mais de $ 13 bilhões em fundos do contribuinte para criar vacinas, e outras nações desenvolvidas também investiram.”

Em vez de acumular vacinas e causar sofrimento desnecessário e mortes evitáveis, Campbell disse, “as nações ricas têm a obrigação de compartilhar com a comunidade global. Essa é a única maneira de proteger os vulneráveis aqui e no exterior.