Intervento dell'esercito al cimitero monumentale di Bergamo per smaltire le bare dei deceduti di coronavirus in altro forno crematorio, 18 marzo 2020. ANSA/FILIPPO VENEZIA

“Jogamos fora as primeiras semanas”, afirmou Attilio Fontana, governador da Lombardia, o epicentro na Europa da pandemia do novo coronavírus, sobre a relutância do governo de Roma em tomar medidas frontais de contenção da transmissão da pandemia covid-19, em entrevista ao jornal espanhol El País.

“Na noite em que a notícia do vírus foi divulgada, eu disse para fechar tudo: empresas, reuniões públicas e privadas, lazer … Foi uma decisão difícil de tomar”, enfatizou. Não foi o que prevaleceu. O ‘paciente zero’ entrou no hospital de Codogno no dia 19 de fevereiro, faleceu dois dias depois, e contaminou 13 pessoas. Apenas duas semanas mais tarde, no dia 8 de março, a quarentena seria afinal decretada na Lombardia e, no dia seguinte, estendida ao país inteiro. Indagado se ele teria fechado a Lombardia antes, Fontana afirmou que “sim, claro”.

Hoje são mais de 12 mil mortos – quatro vezes mais que a China – e mais de 100 mil casos de contágio. Tragédia de que o comboio de caminhões militares, levando de Bérgamo dezenas de caixões, após o colapso dos hospitais e crematórios da cidade, é o mais preciso retrato. Fontana diz que, se pudesse voltar no tempo, teria “acionado o alarme mais forte, mesmo ao custo de ser insultado”.

“Eu pedi medidas mais severas e rigorosas desde o início”, admitindo que talvez devesse ter sido mais duro contra a protelação das medidas de fechamento da área de contágio. “Mas é claro que seria preciso ir a Roma e me acorrentar no palácio Chigi. E eu não sou médico, nem especialista”.

Quando apareceu na tevê de máscara, foi esculhambado por estar tirando a “credibilidade da Itália”. Aliás, o prefeito da principal cidade da Lombardia, Giuseppe Sala, já fez autocrítica da campanha “Milão não para”, contra a quarentena. “Dizer para não fechar a cidade foi um erro”, reconheceu em vídeo.

Para completar, Fontana, quando sugeriu que todos os cidadãos vindos da China fossem colocados em quarentena foi prontamente chamado de racista, o que não é de espantar, já que foi eleito pela Liga Norte, o partido de Matteo Salvini.

Para o governador, houve desde o início um erro de comunicação sobre a pandemia. “Não havia necessidade de desencadear pânico, mas também não se podia permitir a imprudência”. Como relatou, “duas semanas depois de descoberto o vírus, as pessoas continuaram a cometer a imprudência: ir a restaurantes, shoppings, fazer um lanche, praticar esportes”.

Sobre a situação atual, Fontana admitiu que os números da pandemia “não são bons”. “Tivemos um aumento exponencial de quatro semanas. Então, por quatro ou cinco dias, o aumento é constante, não é mais exponencial”, assinalou, na expectativa de que isso seja “o prelúdio para a descida”.

Ele acrescentou ter “muita esperança de que nos próximos dias a paz comece a ser sentida e a chegar aos nossos hospitais” e que a descida [da curva de contágio] “comece”.

Fontana agradeceu ainda à chegada dos especialistas e equipes médicas da China, Cuba e Rússia, em um momento em que os hospitais italianos estavam perto do colapso e seus profissionais da saúde à beira da exaustão.

O jornal espanhol perguntou a Fontana o que deu errado para que Bérgamo, uma área rica e líder em saúde, se tornasse “uma ratoeira”.

“Pedimos que a zona vermelha [quarentena] fosse feita em Bérgamo desde o início, mas o governo preferiu criar uma área laranja limitada a toda a Lombardia”. Escolha que, diplomaticamente, diz que “talvez” tenha ajudado o vírus a avançar.

Fontana disse acreditar que o vírus está na região “há muito tempo”, circulando “sem que soubéssemos”. Apontou que uma série de casos tratados como gripe ou pneumonia inespecífica “eram na verdade manifestações desse problema”. Também citou o jogo Atalanta-Valência como um fator da disseminação.

“PROLONGAR A AGONIA”

Apesar de concordar que a Lombardia é “o motor da Itália”, para Fontana a opção por “prolongar a agonia” – isto é, de não fazer a quarentena imediatamente – implica agora no risco de ter que tomar “longas decisões sobre uma economia que sofrerá mais”. “Hoje, as medidas são drásticas o suficiente e darão resultados, mas jogamos fora as primeiras semanas”.

Sobre quanto tempo terá de durar o confinamento na Lombardia, Fontana acredita que é preciso “ir até o final do contágio para recomeçar a vida normal” e promete ouvir “o que os cientistas dizem”. Segundo ele, a pandemia, além das dramáticas conseqüências pessoais, “mudará radicalmente nosso futuro”. Essa sociedade era considerada “invencível” – destacou – mas é “muito mais frágil do que eu pensava”.

Fontana disse que o impacto da crise sobre a Lombardia será muito sério, mas isso “também depende do que o governo decida”. “É o momento de assumir responsabilidades com determinação” e “meias medidas” não funcionarão, destacou

“A parte mais frágil deve ser protegida imediatamente. Há pessoas que não têm dinheiro para fazer compras, e isso é uma bomba social”, advertiu. Indagado se ficara decepcionado com o papel da União Europeia diante da pandemia, Fontana disse que a Europa “inexiste nos momentos que contam, quando seria apropriado ter alguém por perto com uma voz que ofereça segurança e enfrente problemas e ajude os mais fracos”. “A Europa demonstrou sua inutilidade nesta crise. De que serve uma Europa que não é próxima daqueles que sofrem?”, ressaltou. Ele também se declarou “muito ofendido” “com os ridículos recursos financeiros que a UE disponibilizou para a Itália”.

Na entrevista, o governador da Lombardia aconselhou a Espanha a ser “o mais rigorosa e radical possível” no isolamento social. “Não tome isso como uma piada. E prepare camas de ressuscitação com a máxima urgência”, insistiu Fontana. Como ele explicou, a covid-19 “ocorre inesperadamente e 10% deve ser revivida para se curar”, apesar de não ser grave para todos. “Passei muitas noites sem dormir pensando que não teríamos camas e alguém poderia morrer sem ajuda”.

Ele também tinha uma mensagem para os brasileiros, de acordo com o Antagonista. Durante a entrevista coletiva da última quinta-feira, Fontana recomendou a estratégia de distanciamento social para conter a pandemia. “Tenho tido contato com um amigo no Brasil e digo a ele para ficar o máximo possível em casa, evitar contato com pessoas e difundir esta mensagem”.