G7: Alemanha e Itália repelem guerra fria de Biden contra China
O clima esquentou durante a reunião do G7 (grupo assim denominado por reunir as sete maiores economias, denominação que não cabe exatamente, entre outros fatores pela ausência da China) quando, na reunião do sábado (12), a chanceler alemã, Angela Merkel, objetou a posição dos EUA trazida pelo presidente Joe Biden, de organizar uma força-tarefa juntando as economias centrais para uma ação de contraposição e contenção ao crescimento econômico e de influência da China.
Merkel deixou claro que concorda com uma união das economias ali reunidas e mais outras nações para retirar a economia global da crise agravada pela pandemia. “Isto não é sobre ser contra alguma coisa, mas a favor de alguma coisa”, já havia declarado Merkel a jornalistas assim que chegou ao encontro. Em conversa com o premiê inglês Boris Johnson, Merkel enfatizou a preferência por uma “agenda positiva focada em questões climáticas e comércio” a ser adotada por outros países também.
Segundo funcionários da delegação norte-americana que acompanham Biden, também destacaram os investimentos comuns acordados entre a China e a União Europeia, o líder italiano, Mario Draghi e outros líderes europeus.
Biden chegou à Inglaterra pedindo medidas enérgicas contra a China, declarando que o objetivo era “fortalecer a aliança, deixando claro para Putin e para a China que a Europa e os Estados Unidos são unidos”.
Essa postura de nítida reedição da Guerra Fria, foi amplamente contestada pela União Europeia já que o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, saudou o acordo de investimentos com a China como algo marcante e como um “grande passo na direção certa.”
Segundo os funcionários que conversaram com os jornais europeus, a preocupação mais presente em Joe Biden é a contraposição ao acordo chamado de Rota da Seda (Belt and Road Initiative, BRI, na sigla em inglês) que, desde o ano passado, tem tido um crescimento em termos globais de assinaturas, chegando já a 100 países, com 2.600 projetos e um investimento de US$ 3,7 trilhões (em torno de R$ 19 trilhões). De acordo com dados do site voltado para economia, Refinitiv, tais inversões iriam para estimular projetos de água e eletricidade, petróleo e gás, mineração, indústria, comunicações, entre outros.
Entre os pretextos levantados por Biden, que conseguiu apoio da Inglaterra e do Canadá, para uma crítica pública à China por parte do G7, são citadas “práticas econômicas antimercado” e abusos a direitos humanos especificando a ‘denúncia’ de agressão a minorias étnicas como as que seriam submetidas a ‘trabalho forçado’ em Xinjiang.
Segundo o jornalista Kevin Liptak, da CNN, “as divergências, transmitidas durante uma sessão que a certa altura se tornou tão sensível que toda a internet foi fechada”.
Um dos problemas enfrentados por Biden é o da incapacidade de seu país – e das restantes economias capitalistas mais destacadas – de conter o declínio da produtividade resultante do desvio de recursos para o improdutivo setor financeiro.
“À medida que a rentabilidade do investimento produtivo caiu, o investimento em ativos financeiros tornou-se cada vez mais atraente e houve uma queda no que o novo estudo chama de “eficiência alocativa” do investimento. Isso se acelerou durante a queda do COVID”, afirma o economista Michael Roberts.
Tanto assim que a proposta esboçada pela Casa Branca de “catalisar coletivamente centenas de bilhões de dólares em investimentos em infraestrutura, incluindo a mobilização de capital do setor privado em áreas como clima, saúde e segurança sanitária, tecnologia digital”, sem deixar claro como exatamente o plano funcionaria ou quanto capital Biden alocaria no final das contas, soa como uma quimera. As informações são de que Merkel acha a ideia interessante mas adianta que a Alemanha não tem como alocar recursos no projeto norte-americano.
“Não se trata apenas de confrontar ou enfrentar a China”, lamentou-se um alto funcionário do governo Biden à Reuters. “Mas até agora não oferecemos uma alternativa positiva que reflita nossos valores, nossos padrões e nossa forma de fazer negócios.”.
Assim, como resumiu o diretor de pesquisa do Conselho Europeu de Relações Exteriores, Jeremy Shapiro, a Europa para os EUA é em grande parte um lugar grandiloquente onde as autoridades americanas fazem discursos e praticam diplomacia quente em locais pitorescos “para mostrar e entoar os encantamentos rituais de solidariedade transatlântica”.
Para o articulista do The Express Tribune, Azhar Azam, Biden se sente incomodado tanto pela ascensão da China, mas também pela destacada atuação chinesa no combate à pandemia “e pelos elogios globais pela cooperação chinesa em vacinas”, assim como “pela conceitualização da prosperidade universal”, quando da vitória sobre a miséria implementada pelo governo chinês. Para Azam, “Biden está obsessivo com a China”.
Mais uma vez, a chanceler alemã Angela Merkel e o primeiro-ministro italiano Mario Draghi, embora não tenham se enfrentado abertamente com o projeto de Biden, procuraram enfatizar áreas de cooperação com a China.
Azam analisa que Michel, presidente do Conselho Europeu, advoga uma posição objetiva sinalizando para acabar com as diferenças e fortalecer os laços comerciais e econômicos com a China – apesar de ver Pequim como um competidor, mas também importante parceiro de cooperação – mostra o caminho para Washington como um equilíbrio pode ser criado entre os dois lados por meio de um envolvimento contínuo em vez de um confronto absoluto.
Ele acrescenta que o comportamento de Biden “arrisca o renascimento do crescimento internacional e impede que outras nações em desenvolvimento desempenhem seu papel na governança multilateral”.
“A UE, como a China, é vítima da guerra tarifária dos EUA por causa de alegadas preocupações com a segurança nacional. Biden ainda não reduziu as tarifas do aço e alumínio europeus, possivelmente como uma alavanca para pressionar o bloco a atender às suas demandas indevidas. Washington precisa consertar sua abordagem arrogante de que os parceiros dos EUA não podem ser aliados da China. As nações europeias têm o direito de traçar uma política independente e de manter a sua relação tanto com a China como com os EUA. A pressão de Biden – “ou nós ou eles” – é impraticável, irrealista e insustentável. O confronto não favorece ninguém e essa deve ser a mensagem da Europa a Biden no G7”, destaca.
Alegações forjadas
As alegações de Biden – cuja fonte inicial foi uma matéria de Michael R. Gordon, publicada no Wall Street Journal, o mesmo coautor da matéria com a mentira sobre ‘armas de destruição em massa pelo governo de Saddam Hussein” usada como estopim para a invasão do Iraque – foi contestada pelo acadêmico Hor Jungshing, da Universidade de Ciência Política e Direito da China, que questionou em entrevista à TV chinesa CGTN: “Como pode ser bom e legal que pessoas de outras províncias chinesas venham como migrantes trabalhar nas fábricas de Guangzhou ou Shenzhen, mas ser ruim que venham de Xinjiang?”
Há outro lado ainda mais nauseante, ele apontou, que é “difamar a política de eliminação da pobreza, elogiada no mundo inteiro, como se fosse “trabalho forçado”.
São “denúncias ridículas”, afirmou a porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China, Hua Chunying, que prosseguiu: “Ajudar as pessoas a conseguir um emprego e ‘trabalho forçado’ são dois conceitos diferentes”,
Os EUA querem criar ‘desemprego forçado’ e ‘pobreza forçada’ na região autônoma de Xinjiang, reprimindo as empresas locais por meio de sanções?”, questionou Chunying.
São os próprios chineses uigures que repelem essa campanha de difamação. Abibra Mamuti, da cidade de Aksu, relatou como se inscreveu voluntariamente para ir trabalhar em uma empresa de eletrodomésticos em Hangzhou [em outra província], com uma renda anual de 55.000 yuans, e saiu da pobreza em apenas um ano.
À CGTN, a chinesa uigur Atkenm Kuwan relatou como começou a trabalhar de tricotadora em uma fábrica, em abril, em Xinjiang, melhorando sua renda mensal de 960 yuans por mês na reciclagem, para 2300-2500 yuans.