Pandemia da Covid-19 “exige ação global coordenada, solidariedade e cooperação”, aprova documento da cúpula do G20

O G20 – que é formado pelas 20 maiores economias do planeta – anunciou ao final de sua cúpula virtual de dois dias no fim de semana (21/22) seu compromisso com uma distribuição equânime de vacinas contra a Covid a todos os países e o apoio à recuperação econômica.

Realizada por videoconferência em meio a uma crise sem precedentes desencadeada pela pandemia, a cúpula teve como anfitriã a Arábia Saudita, reunindo Estados Unidos, China, Rússia, Índia, Alemanha, Grã Bretanha, França, Japão, África do Sul, Austrália, Turquia, Indonésia, União Europeia, Espanha, Itália, Brasil, México, Argentina, Canadá e Coreia do Sul. Juntos, eles constituem 90% do PIB mundial e 80% do comércio.  Também participou o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres

“Não pouparemos esforços para garantir acesso equitativo das vacinas para todas as pessoas”, diz a carta do G20, enfatizando o papel crucial da ONU e da Organização Mundial da Saúde, OMS.

A pandemia já causou 57 milhões de contágios e 1,4 milhão de mortos. Dura realidade que levou os líderes do G20 a reconhecerem a imunização extensiva como “um bem global público”, como defendido pelo presidente chinês Xi Jinping. Em nome da Rússia, o presidente Vladimir Putin pôs a vacina Sputnik V à disposição dos países que dela precisem.

“O acesso à vacinação deve ser possível e acessível para todos os países”, enfatizou a primeira-ministra alemã, Angela Merkel. “Estaremos preparados para garantir o acesso [às vacinas] em escala global e evitar a todo custo o cenário de um mundo em duas velocidades?”, questionou Emmanuel Macron, presidente da França.

Xi também exortou mais países a aderirem a um mecanismo de reconhecimento mútuo de certificados de saúde, proposta da China, que faz uso de um código QR, e que pode facilitar a retomada segura das viagens internacionais

COOPERAÇÃO

No crash de 2008, o G20 assumiu um papel de coordenação e cooperação que foi essencial para a superação da crise, um processo em recuo desde a ascensão de Donald Trump à Casa Branca, mas que a pandemia recolocou na ordem do dia.

A Cúpula do G20 salientou que o contexto provocado pela pandemia da covid-19 “exige mais do que nunca ação global coordenada, solidariedade e cooperação multilateral entre os países”. “Estamos comprometidos em liderar o mundo na formação de uma era pós-covid-19 forte, sustentável, equilibrada e inclusiva”, afirma o comunicado.

“Apoiar o sistema multilateral de comércio é agora mais importante do que nunca”, afirma a Carta de Riad.

O documento chama ainda a continuar a usar “todas as ferramentas políticas disponíveis para proteger a vida, o emprego e a renda das pessoas, ao mesmo tempo em que nos protegemos contra os riscos de desaceleração econômica, apoiando a recuperação da economia global e fortalecendo a resiliência do sistema financeiro”.

Reiterou também que, conforme a Organização Internacional do Trabalho (OIT), as medidas emergenciais e a expansão temporária das medidas de proteção social “forneceram suporte para a subsistência de quase 645 milhões de pessoas”.

Em seu pronunciamento, Guterres conclamou a “primeiro, recuperar de forma inclusiva (…), segundo, recuperar de forma sustentável, ou seja, que todos redobrem sua ação contra as mudanças climáticas”.

A cúpula virtual também registrou possivelmente a última participação do presidente Donald Trump em um encontro multilateral, caracterizada pela falta de foco. Durante a manhã, foi flagrado tuitando fake news sobre a ‘fraude eleitoral’. Depois, deu uma saidinha para ir jogar golfe. Na volta, disse aos demais chefes de Estado que o Acordo do Clima de Paris não foi feito para “proteger o meio ambiente, mas para destruir a economia dos EUA”.

Não foi o único a dar vexame. Jair Bolsonaro, em sua intervenção, tentou provar ao mundo, no dia em que um negro foi espancado e assassinado em um supermercado, que não existe racismo no Brasil. E ainda repetiu que não há queimadas na Amazônia.

 VIDA E SAÚDE

Em seu pronunciamento, Putin disse ainda que a Rússia colocou em primeiro plano “o valor mais fundamental: a vida e a saúde das pessoas”. Ele assinalou que o governo russo implementou um plano abrangente para ajudar a população, as pequenas e médias empresas e as indústrias em risco, e para fortalecer o sistema de saúde. Ele revelou que o orçamento anticrise atingiu 4,5% do PIB.

Putin manifestou sua preocupação com as economias mais fracas, em que as receitas fiscais caíram significativamente e a necessidade de alocar fundos significativos para combater a pandemia cresce quase todo dia, e com a desvalorização das moedas nacionais, e consequente aumento no custo do serviço da dívida, em geral denominada em dólares.

O líder russo também conclamou ao fim das sanções unilaterais e restauração das cadeias de abastecimento e defendeu um sistema de comércio multilateral baseado em normas e princípios universais.

“Destaco: é necessário aproveitar a crise atual como uma oportunidade para mudar a trajetória do desenvolvimento global, preservar o meio ambiente e o clima, garantir condições iguais para todos os países e povos, fortalecer mecanismos eficazes de cooperação multilateral e as instituições internacionais fundamentais, ao mesmo tempo em que se apoia na Carta das Nações Unidas e nos princípios da lei internacional”, sublinhou

Para Merkel, a declaração final do G20 respirou “o espírito de cooperação multilateral”. “Eu acredito que isso é muito importante neste momento.

O presidente Xi voltou a salientar o quão crucial é manter o crescimento, combater a pobreza – como a China fez – e avançar no sentido de uma comunidade de futuro compartilhado

O G20 também decidiu prorrogar até junho do próximo ano a moratória temporária da dívida dos países muito pobres, que atualmente beneficia 46 países. Apesar de ser uma iniciativa meritória, o alívio não inclui as dívidas a credores privados e, segundo as fontes, afeta menos de 4% do custo total do serviço da dívida dos países em desenvolvimento neste ano.

O presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, chamou a intensificar esse mecanismo de alívio da dívida e propôs que os países de renda média tenham acesso a créditos com taxas de juros equivalentes às vigentes nos países ricos.

Ele alertou para outro mecanismo perverso, um efeito colateral da pandemia. “Sem que tenhamos contraído dívida adicional, a consequente perda de riqueza elevou a dívida pública de 44,8% para 55,2% do Produto Interno Bruto nacional.”

Ele assinalou que esse fenômeno de aumento da dívida pública em proporção do PIB ocorre em outros países. “O mesmo aconteceu em todo o mundo: a dívida cresceu em média 20% com a pandemia e, se não resolvermos esse problema agora, no futuro ele se tornará mais uma ameaça à estabilidade econômica e ao bem-estar social”, alertou AMLO.

O G20 comprometeu-se a disponibilizar os meios financeiros para a iniciativa internacional de distribuição de vacinas (Covax). Calcula-se em US$ 6 bilhões o déficit até o final de 2021. Cerca de 170 países participaram da iniciativa, incluindo a China, mas não os EUA – pelo menos, não com Trump.

Como resumiu o comunicado, trazer o vírus sob controle é a chave para a recuperação da economia global: “estamos determinados a continuar usando todos os instrumentos políticos disponíveis para proteger a vida, o emprego e a renda das pessoas”.