Frente política e social para barrar criminalização de movimentos
Projeto em análise no Senado altera Lei Antiterrorismo para criminalizar manifestações. Parlamentares e representantes de organizações da sociedade civil formam frente ampla para impedir retrocessos.
Por Christiane Peres*
Desde que se elegeu presidente da República, Jair Bolsonaro vem suscitando a retomada de propostas antidemocráticas no Parlamento. Crítico voraz das ações de movimentos de luta pela terra, como o MST, ou por moradia, como o MTST, Bolsonaro vem defendendo a criminalização das ocupações feitas, sobretudo, por esses grupos.
Durante campanha, o presidente eleito chegou a afirmar que esses movimentos são compostos por “marginais que devem ser tratados como terroristas”. A ideia de Bolsonaro tem reverberado no Congresso e uma mudança na Lei Antiterrorismo voltou a ganhar destaque. A proposta (PLS 272/16), relatada por Magno Malta (PR-ES), aliado de Bolsonaro, voltou à pauta da CCJ do Senado e reacendeu um alerta nos movimentos sociais e em parlamentares progressistas.
Para garantir o direito à livre manifestação, previsto na Constituição Federal de 1988, parlamentares do PCdoB, PSol, PT, PDT, PSB e representantes de movimentos sociais lançaram nesta quarta-feira (21) uma frente ampla para impedir tais retrocessos.
“Estamos alinhados nessa frente. Nossa âncora é a Constituição Federal, que diz que é possível reivindicar por terra, trabalho, educação pública e gratuita. Estamos de pé e os movimentos sociais não estarão sozinhos. Aqui no Parlamento e nas ruas, o PCdoB, que perdeu centenas de militantes na última ditadura, não se calará. Contra a criminalização dos movimentos sociais, unidade na luta”, afirmou a vice-líder do PCdoB na Câmara, Alice Portugal, durante coletiva concedida na Câmara.
Guilherme Boulos, coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), afirmou que o objetivo da proposta é perseguir a Oposição. “Democracia pressupõe o respeito às oposições, às minorias e aos movimentos sociais. Se há pessoas que lutam por moradia e por terra no Brasil, isso não vai se resolver nem com lei nem com violência, mas com políticas públicas. A forma de acabar com MTST é construir 7 milhões de casas para todos os sem-teto do país. A forma de acabar com o MST é fazer reforma agrária para que todo trabalhador sem-terra possa ter terra para trabalhar. Não se lida com movimento social na pancada, mas com políticas públicas”, disse.
O PLS 272/16amplia o conceito e as condutas consideradas como atos de terror. O texto recupera itens vetados pela então presidente Dilma Rousseff na Lei Antiterrorismo. À época, os vetos foram justificados pela intenção de afastar qualquer possibilidade de criminalização de manifestações ou protestos organizados pela sociedade civil. No entanto, Lasier Martins, autor do projeto em discussão no Senado, acredita que a ex-presidente mutilou a legislação, tornando-a inócua.
O projeto considera como atos de terrorismo as seguintes condutas: incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público ou privado, além dos atos de interferir, sabotar ou danificar sistemas de informática ou bancos de dados. A pena estipulada para todas essas condutas será de 12 a 30 anos de reclusão, bem como sanções correspondentes à prática de ameaça ou violência.
De acordo com a vice-líder da Minoria, deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), o objetivo da frente é garantir os direitos conquistados na Constituição. “Ampliação da Lei Antiterrorismo e quaisquer outros retrocessos terão nossa total e absoluta resistência, não só aqui dentro, mas nas ruas e nas redes. Saímos da eleição com 47 milhões de brasileiros gritando por liberdade e por direitos. Então, a gente não parte do zero: estamos apenas fazendo uma articulação política, institucional e organizada junto com os movimentos sociais. Não há retrocesso possível. Pode vir quem vier, mas nossa luta por direitos será mantida”, destacou.
O ato contou ainda com a participação do candidato à Presidência da República pelo PT, Fernando Haddad. Para ele, a criminalização de movimentos sociais é “equivocada e fere o direito à livre organização”.Haddad afirmou ainda que direitos civis e sociais são complementares e que a defesa deles pode agregar parlamentares das mais variadas correntes políticas.
“Entendemos que esse binômio pode congregar a maioria dos parlamentares eleitos nas últimas eleições, que vão agir para impedir retrocessos nessas duas áreas. Vamos defender os direitos dos brasileiros se manifestarem”, afirmou.
O PLS 272/16 tramita de forma terminativa na CCJ e poderá ir diretamente à Câmara caso não haja recurso para votação no Plenário do Senado.