Cerca de 20 deputados republicanos atenderam à cobrança de Trump e partiram para tumultuar os trabalhos do impeachment. (Foto: Mandel Ngan/AFP)

Uma tropa de choque de aproximadamente 24 deputados republicanos na quinta-feira (24) tumultou os trabalhos do inquérito de impeachment, mantendo ocupada, por cinco horas, a sala do Congresso norte-americano em que são ouvidos os depoimentos daqueles que são convocados pelas comissões da Câmara envolvidas.

“A batalha política transformou-se assim por várias horas em um ato de teatro, com o presidente como um personagem tragicômico que continuou a acusar todos os seus críticos de inimigos da democracia, incluindo hoje os republicanos de seu próprio governo, que ele suspeita serem injustos”, registrou o colunista do La Jornada, David Brooks, direto de Nova Iorque, descrevendo a tentativa de Trump de questionar o processo de impeachment como “uma tentativa de golpe de estado dos democratas”.

O depoimento de Laura Cooper, oficial do Pentágono que supervisiona a política sobre a Ucrânia, finalmente começou no meio da tarde, depois que a tropa de choque deixou o local, denunciando “o viés” e “a falta de transparência”. O líder da bancada republicana, Steve Scalise, se entusiasmou tanto que até acusou os próceres democratas de “táticas no estilo soviético” – seja lá o que isso queira dizer.

A brigada trumpiana foi a primeira consequência do puxão de orelha nos parlamentares republicanos por Trump, que exigiu deles que suem a camisa para defender o incomparável presidente que vem ousando fazer a América grande de novo.

Pesquisas de opinião apontam que está aumentando o apoio ao impeachment. O processo de impeachment foi desencadeado quase um mês atrás, quando um agente da CIA denunciou que tinha ouvido de outros agentes que teriam presenciado um telefonema do presidente Trump ao presidente ucraniano Volodymyr Zelensky em julho, em que, abusando de seu poder, pediu a um governo estrangeiro para interferir nas eleições de 2020 nos EUA em benefício de seus fins políticos pessoais.

As preocupações de Trump cresceram com o depoimento do embaixador interino dos EUA na Ucrânia, William Taylor, a portas fechadas na Câmara de Deputados, na terça-feira.

Depoimento que, segundo o portal progressista Peoplesworld, “dizimou” a alegação do presidente Trump de que não houve contrapartida – ‘quid pro quo’, em termos jurídicos – na pressão sobre Zelensky, para que investigasse a corrupção do então vice de Obama Joe Biden na empresa de gás Burisma e a ingerência nas eleições de 2016, para que uma ajuda militar de quase 400 milhões de dólares fosse liberada.

De acordo com as versões vazadas de suas declarações na terça-feira (22), Taylor disse que em agosto e setembro deste ficara “cada vez mais preocupado que nosso relacionamento com a Ucrânia fosse fundamentalmente prejudicado por um canal informal e irregular de tomada de decisão e retenção nos EUA de assistência vital à segurança por razões políticas domésticas” nos Estados Unidos.

A alegação usada pela presidente da Câmara, a democrata Nancy Pelosi, para desencadear as investigações para impeachment é que Trump, com auxílio de seu advogado, Rudy Giuliani, pressionou o governo da Ucrânia para obter vantagem na disputa eleitoral de 2020, em que Joe Biden é pré-candidato democrata, e inclusive chegou a ser o mais cotado, embora venha murchando.

O depoimento de Taylor teria se chocado com o testemunho de Gordon Sondland, embaixador americano na União Europeia (que ganhou o cargo em retribuição à doação de mais US$ 1 milhão à campanha de Trump na eleição passada), que asseverara aos deputados que a questão de investigar a família Biden nunca havia sido abordada.

Conforme o relato de Taylor às comissões da Câmara, foi o próprio Trump quem disse a Sondland, pelo telefone em 7 de setembro, que Zelensky teria que anunciar publicamente que estava iniciando as investigações sobre Biden (e seu filho, colocado na diretoria da Burisma – graças ao charme do pai, provavelmente).

A Casa Branca, através de sua porta-voz Stephanie Grisham, desqualificou o depoimento de Taylor, asseverando ter se tratado de mais um “relato do que outros disseram”. Ela acrescentou que tudo não passava de uma “campanha coordenada” dos deputados de extrema-esquerda e dos burocratas radicais não-eleitos radicais que estão “em guerra contra a Constituição”. Trump não fez nada de errado, insistiu.

Na quarta-feira, o contra ataque veio do próprio Trump, pelo Twitter: o processo de impeachment é “um linchamento”. Declaração que lhe valeu pronta condenação de entidades afroamericanas – num país em que milhares de negros foram seviciados e mortos por turbas racistas. “Você está comparando um processo constitucional à tortura brutal frequente e sistemática neste país de gente que se parecem comigo?”, indignou-se Karen Bass, que preside o caucus de legisladores negros.

Trump também chamou Taylor de “never Trump” e tuitou que “seria ótimo se as pessoas dentro do governo Trump … parassem de contratar os never Trump, que são piores que os democratas” e “escória humana”. Taylor foi instalado em seu cargo pelo secretário de Estado Mike Pompeo em maio. Em outro front, a Casa Branca anunciou que não renovará as assinaturas, nos órgãos federais, dos jornais Washington Post e New York Times, que são os campeões das fake news, segundo Trump – além de estarem em campanha aberta pelo impeachment.