Flávio Dino: “Apesar do golpe, temos sinais positivos no horizonte”
Considerando um dos mais expoentes políticos da atualidade, Flávio Dino (PCdoB) governa o Maranhão e tem um dos mais altos índices de aprovação do país. Ao completar 1.000 dias de governo, o balanço foi de um obra entregue a cada dois dias. Como resultado disso, o governador lidera todas as pesquisas de opinião sempre na casa dos 60%.
Em entrevista ao Portal Vermelho, Flávio Dino afirma que as perspectivas para a esquerda em 2018 são promissoras, pois o golpe e a política de retrocesso do governo de Michel Temer deram a população mais clareza para identificar nos agentes do golpe “onde reside os seus principais interesses”.
Rebateu o discurso da direita de que o comunismo está falido e afirmou que o sucesso de seu governo é uma prova disso. “Essas vozes defendem os seus privilégios de casta, de classe. Defendem o modelo excludente. Isso é o que eu acho atrasado. Uma sociedade de poucos e para poucos é a síntese do egoísmo humano, que é tudo aquilo que podemos sintetizar na palavra barbárie”, enfatizou.
Confira a íntegra de entrevista que foi feita durante o 14º Congresso do PCdoB, em novembro deste ano:
Portal Vermelho – Qual é a análise que faz da atual conjuntura e quais são as perspectivas para 2018?
Flávio Dino – Viemos de uma trajetória política difícil, complexa, em razão do retrocesso que nós sofremos com a aprovação do impeachment e toda as suas consequências. Apesar disso, acho que temos sinais bastante positivos no horizonte.
Considero que a conjuntura que se abriu após o equivocado e inconstitucional impeachment que foi feito, permitiu com mais clareza que a população identificasse onde reside os seus principais interesses. E, por isso, acredito na vitória do nosso campo em 2018, na medida em que há um óbvio fracasso da alternativa que se criou após a aprovação do impeachment.
Acho que a população está vivendo e sentindo essa quadra de retrocessos de direitos, de perda da dimensão do projeto nacional de desenvolvimento, perda da soberania, de autonomia energética e de perda do impulso das políticas públicas que nós vivemos após 2003. Acredito que nós temos um quadro desafiador, porém promissor. E a pré-candidatura de Manuela integra esse conjunto de dados promissores.
Portal Vermelho – Ao apresentar os avanços de sua gestão o senhor destaca que esse é o modo comunista de se governar. Por outro lado, a direita e parte da grande mídia dizem que o comunismo é o atraso e que a esquerda quebrou o país. Como o senhor rebate essas afirmações?
Flávio Dino – É esse o contraste que nós buscamos fazer. Em verdade, esses ataques não têm base era. É pura ideologia dominante que busca desqualificar forças que acreditam num país mais justo em defesa de privilégios. Essas vozes defendem os seus privilégios de casta, de classe. Defendem o modelo excludente. Isso é o que eu acho atrasado. Uma sociedade de poucos e para poucos é a síntese do egoísmo humano, que é tudo aquilo que podemos sintetizar na palavra barbárie.
Nós defendemos uma civilização autêntica, verdadeira e para todos. E é isso que nós estamos aplicando em nosso Estado, com os limites por ser uma experiência governamental estadual numa quadra terrivelmente negativa. Porém, estamos apresentando resultados concretos que não são puramente simbólicos. São simbólicos, porque a luta ideológica e política é feita de símbolos, mas são coisas que estão funcionando. As escolas que existem estão funcionando. Hospitais estão atendendo milhares de pessoas. Restaurantes populares que estão de portas abertas para milhares de pessoas se alimentarem a R$ 2,00. São ações práticas que dizem respeito ao dia a dia das pessoas e que mostram que quando você governa – apesar da aridez do momento que nós atravessamos -, com rumo, foco e sabendo o que é realmente prioritário, nós mostramos e iluminamos um caminho diferente.
Portal Vermelho – Nesse período, o país acentuou o discurso da antipolítica e de criminalização das alianças. O seu governo é formado por uma amplo leque de alianças que inclui o campo da esquerda, mas também da direita. Como o senhor acredita que esse tema deve ser tratado em 2018?
Flávio Dino – O Brasil é muito grande territorialmente. É muito plural e em todos os sentidos muito desigual. Por isso, nenhuma força política sozinha tem o monopólio da verdade acerca de qual é o melhor caminho para o Brasil. É preciso ter modéstia para se ter humildade. É isso que nós procuramos exercer todos os dias no Estado.
Nós não fazemos o governo do PCdoB apenas. É claro que ele tem a nossa marca, nosso programa na direção, mas nós respeitamos as outras forças políticas para que elas também contribuam com a ação de governo, nos ajudem na sustentação do governo e na implementação das políticas públicas. Tem dado muito certo e é fundamental exatamente para revalorizar a boa política. São alianças feitas em torno de propósitos, propostas e ações.
Esse discurso da antipolítica e da criminalização de todo o mundo político acaba incorrendo numa grave injustiça da generalização. É óbvio que existem alianças assentadas em bases fisiológicas atrasadas e não-republicanas e que nós repudiamos. Mas, por outro lado, temos o salutar exercício do diálogo entre forças diferentes que compartilham propostas e espaços.
Max Weber, que não é um teórico socialista, mas um grande cientista político, disse que a política é a disputa sobre projetos de organização da sociedade e sobre quem terá ou não o direito de gerenciar postos no estado para implementar ou não esses projetos. Essa dupla dimensão é igualmente legítima. O discurso da antipolítica, ao criminalizar isto, visa na verdade conformar o poder antidemocrático porque não submete ao crivo da sociedade, mas a formas autoritárias, fascistas mesmo, de exercício do poder em que poucos, supostamente mais qualificados que o conjunto da soberania popular, concentram o poder, a riqueza e o conhecimento nas suas mãos. E isso, volto a dizer, é barbárie. Não é civilização democrática, não é republicano e, por isso, nós combatemos.
Portal Vermelho – Em seu discurso no 14º Congresso do PCdoB, o senhor disse que busca fazer política com amor e alegria. Como consegue exercer sua função diante de tantos ataques de ódio e intolerância?
Flávio Dino – É decisivo ter sentimentos que norteiam a sua ação prática, porque se você busca racionalizar todo o exercício da ação politica na verdade você está se desumanizando. O ser humano é integral, ele não é feito apenas do que se convencionou chamar de razão.
É lógico que nós fazemos planejamento, ciência, método e seriedade. Porém, acima de tudo, o que nos movea é você de fato ter essa dimensão: acreditar no que faz, buscar fazer do melhor modo, ter a alegria de servir aos outros, se colocar no lugar do outro, ouvir o outro e ser capaz de envolver as pessoas naquilo que está fazendo. A cada dia renovar a sua crença de que nós, militantes da justiça social, temos que fazer todos os sacrifícios necessários para que outras pessoas possam ter acesso aos bens materiais e não-materiais fundamentais para a vida em sociedade.
Eu e minha equipe somos muito movidos por esse espírito de servir, da solidariedade, da boa caridade cristã, da boa fraternidade. Da busca de valores perdidos como igualdade social, a liberdade verdadeira para todos que imprescinde dos caminhos materiais para a sua concretização.
Nós acreditamos na síntese do nosso programa, mas, sobretudo, muita paixão militante que é o que cimenta a nossa experiência no Estado.
Por Dayane Santos, do Portal Vermelho