Quase quatro décadas passadas do término do período dos governos militares, ainda não foi encerrado aquele que significou o primeiro grande incidente diplomático da ditadura e que se tratou de uma fake news usada como evidência para justificar o golpe: a prisão, em 3 de abril de 1964, de 11 integrantes de uma delegação chinesa que estava no Brasil, sob alegação de que agulhas de acupuntura eram artefatos homicidas e que pipas seriam mísseis direcionados ao assassinato de autoridades.

Ciente desse fato a partir de informações da Comissão da Verdade, João Vicente Goulart, filho do ex-presidente Jango e que é pré-candidato ao Governo do Distrito Federal pelo PCdoB, impetrou habeas corpus para o pronto encerramento do feito, com a declaração da extinção da punibilidade e a devolução dos recursos retidos.

Na ocasião, foram apreendidos US$ 49.277, 189.022 cruzeiros, 2260 francos suíços,138 libras, 3 rublos e 3 kopekas, que eram destinados à compra de algodão e à realização de uma exposição China-Brasil já autorizada pelo Governo Brasileiro, dando origem ao processo n. 34.582/65.

Condenados em primeira instância, para resolver a questão diplomática, foi a delegação expulsa, sem que seu recurso jamais fosse julgado, estando engavetado até hoje. O dinheiro ainda está à disposição da Justiça e, a rigor, estão válidas as ordens de prisão.

Segundo Victor Neiva, advogado do caso, “é um absurdo que a Justiça Militar não tenha se dignado nem mesmo a pronunciar a prescrição, legitimando que até hoje se reafirme a fake news da suposta ameaça comunista para justificar o tenebroso período de arbítrio que o país viveu por 21 anos, permitindo que viúvas da ditadura ainda nos governem”.

Para João Vicente Goulart, a medida se mostra de extrema importância, uma vez que até hoje é tida pela China como uma questão de honra, sendo consideradas todas as vítimas chinesas do incidente heróis nacionais naquele país. Ainda segundo o autor o “presidente Jango foi quem abriu os laços de amizade, Brasil-China, em sua histórica viagem à China em 1961, quando deu-se a renúncia de Jânio Quadros”, e ainda conclui ressaltando que é “impressionante que, mesmo sendo hoje a China o nosso principal parceiro comercial, não nos dignamos a resolver nossas pendências e conflitos diplomáticos do passado”.