Lançado recentemente pela FGV Editora, o livro Bidenomics nos Trópicos mostra a visão de 20 especialistas relativa às diretrizes da agenda Biden, caracterizada por um matiz keynesiano que, como os organizadores Nelson Barbosa e André Roncaglia apontam, acentua uma importante mudança na lógica dominante da política econômica vigente nos Estados Unidos há quatro décadas. Conforme recorda o artigo “É possível um Bidenomics à brasileira?”, escrito por Solange Monteiro para o Blog da Conjuntura Econômica, desde o governo Reagan (1981-1989), a linha predominante foi privilegiar a desoneração da renda do capital para impulsionar investimentos e empregos – efeito que não se concretizou e passou a ser questionado especialmente a partir da crise financeira internacional. “Os planos de Biden são marcados pela recuperação do papel da área fiscal como política econômica; o retorno da política industrial; a ampliação do conceito de bem-estar social de forma ampla, incluindo a oferta de infraestruturas como de telecom, transporte, energia, alinhada à sustentabilidade ambiental; e um maior combate à desigualdade”, enumera Barbosa. Segundo menciona o artigo, no primeiro de uma série de webinares de apresentação do livro promovidos por Roncaglia, a economista Débora Freire (UFMG), autora do capítulo dedicado a proteção social, salientou que a cartilha seguida pelo governo americano para tratar a desigualdade passa não só pela ótica do bem-estar das famílias, quanto pela sustentabilidade do crescimento no longo prazo. “No caso brasileiro, isso implica pensar na necessidade de ampliação do Bolsa Família também pelo filtro da racionalidade econômica”, diz. Em estudo no qual observou a expansão do programa Bolsa Família entre 2009 e 2015, Débora identificou reflexos do programa na estrutura produtiva brasileira, apontando que segmentos como a indústria de bens duráveis e de serviços básicos, intensivos em trabalho, foram os que mais se beneficiaram do consumo gerado pelas transferências do Bolsa Família. Manoel Pires, pesquisador associado do FGV IBRE que também participa do livro, aponta que a pandemia ampliou a avaliação dos benefícios de expansões fiscais mesmo em cenários de demanda agregada e juros não ideais. No caso do Brasil, que já possui um grau de endividamento alto, e uma relação taxa de juros x taxa de crescimento desfavorável para garantir a sustentabilidade da dívida – “taxas de juros inferiores à do PIB só aconteceram aqui de forma episódica” -, Pires defende que ainda assim é possível trabalhar um cenário de expansão fiscal. Bráulio Borges, pesquisador associado do FGV IBRE autor em Bidenomics nos trópicos, recorda que nos últimos 40 anos, o sistema de metas de inflação se disseminou mundo afora – no Brasil, chegou em 1999 – mas passou a ser questionado a partir da crise financeira internacional, por conta da perda de espaço para estimular as economias em recessões. Ele avalia que, em meio à pandemia, enquanto o Federal Reserve (BC dos EUA) substituiu o monitoramento de uma meta pelo de uma média inflacionária e passou a olhar também para a taxa de desemprego, no Brasil, não se observa dentro da ação do Banco Central o novo objetivo, previsto na Lei da Independência do BC, de suavizar as flutuações do nível da atividade econômica e fomentar o pleno emprego.