Para o economista e professor da Universidade de Brasília (UnB), José Luis Oreiro, a Proposta de Emenda Constitucional 187/2019 que extingue os fundos públicos “é o caminho para a barbárie e a destruição das políticas públicas no Brasil”.
Oreiro participou na terça-feira (11) de audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que reuniu especialistas de vários setores para debater a PEC 187 de autoria do governo Bolsonaro. A PEC propõe a extinção dos fundos públicos que financiam políticas sociais e projetos de nas áreas de ciência, educação, segurança, meio ambiente, entre outras, para desviar os recursos para pagamento da dívida pública.
Segundo o governo, os fundos públicos têm um superávit de R$ 219 bilhões de reais e é esse montante de recursos públicos que o ministro Paulo Guedes quer desviar para os bancos.
“A PEC tem por objetivo destruir sem criar nada ou botar nada no lugar”, afirmou Oreiro. “Resumindo-se a destruir a institucionalidade existente, construída arduamente ao longo de várias décadas, por intermédio de dois mecanismos: primeiro, a desvinculação das receitas públicas aos fundos públicos ao final do exercício financeiro em que ocorrer a promulgação da emenda constitucional”, completou. Segundo a PEC propõe a extinção de todos os fundos que não forem confirmados por lei complementar, no prazo de dois anos após sua aprovação.
“Como os programas que são atualmente financiados pelos recursos desses fundos serão financiados?, questionou o economista. “A PEC deixa implícita a ideia de que as destinações desses recursos serão extintas, pois somente desta forma será possível abrir espaço fiscal’’.
Oreiro levantou para os senadores “uma questão para reflexão”. “O Congresso Nacional acha que as políticas públicas financiadas por intermédio desses fundos, de fato, não representam mais as preferências e as necessidades da sociedade brasileira? Vamos acabar com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, com o Fundo Social, com o FIES, com o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, entre outros? Como as políticas públicas financiadas pelos mesmos serão executadas? Com quais recursos? O que vai ser posto no lugar desses fundos?”
O economista contestou o argumento do governo Bolsonaro de que esses recursos estão ociosos e que por isso deveriam ser utilizados em outras atividades e para abatimento da dívida pública.
Segundo Oreiro, o efeito combinado da meta de resultado primário e teto de gastos impede a realização de uma despesa discricionária mesmo quando existe previsão orçamentária para a mesma, além disso, há os seguidos contingenciamentos de recursos feitos pelo governo.
De acordo com o professor da UnB, “a desvinculação de receitas, por si só, não aumenta a arrecadação de impostos e nem diminui a despesa primária, tendo impacto nulo sobre o resultado primário e, portanto, sobre a evolução da dívida pública. Logo, a simples desvinculação de receitas e despesas não abre espaço fiscal no orçamento da União, Estados e Municípios”.
O segundo mecanismo destacado por José Luis Oreiro para a extinção dos fundos públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios é a exigência de lei complementar em relação aos fundos já existentes. A PEC obriga que os fundos sejam ratificados pelos respectivos Poderes Legislativos, por meio de Lei Complementar específica para cada um dos fundos públicos, até o final do segundo exercício financeiro subsequente à data da promulgação desta Emenda Constitucional.
“Considerando que atualmente existem 248 fundos públicos infraconstitucionais e que a existência de cada fundo teria que ser ratificada pelo poder legislativo competente, de forma individual e por intermédio de lei complementar, num prazo máximo de dois anos, o cenário mais provável é que a imensa maioria desses fundos seja extinta em função da incapacidade, técnica, de tempo, dos poderes legislativos de avaliar de forma adequada os custos e benefícios de cada fundo e assim deliberar sobre a conveniência ou não de cada um deles”, disse o professor da UNB.
O economista lembrou que, como ocorreu com a reforma da Previdência, o ministro Paulo Guedes, mais uma vez, não apresentou estudos ou dados que justifiquem a extinção dos fundos públicos.
“O Ministério da Economia não elaborou, até o presente momento, nenhum estudo pormenorizado sobre a eficiência e/ou conveniência dos fundos atualmente existentes, delegando para os parlamentares a tarefa de julgar, sem o necessário embasamento técnico, e a ‘toque de caixa’, uma PEC que muda de forma radical e profunda a institucionalidade da gestão orçamentária e financeira do Estado Brasileiro”.
Ao afirmar ser favorável à reprovação da PEC 187, Oreiro sugeriu ao Senado Federal, se assim julgar conveniente, solicitar aos “parasitas” – ironizando a declaração de Guedes – do Departamentos de Economia das Instituições Federais de Ensino Superior um estudo detalhado sobre os custos e benefícios dos fundos públicos existentes.
Na sua exposição, José Luís Oreiro destacou alguns fundos que poderão deixar de existir caso a proposta do governo vigore, entre eles estão:
Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT): fundo que financia programas de construção, modernização e manutenção dos laboratórios de pesquisas do país e infraestrutura em universidades, além da aquisição, instalação e manutenção de equipamentos, programas de interação de Institutos de Ciência e Tecnologia (ICTs), projetos e plantas industriais de tecnologia avançada ou em desenvolvimento, entre outros.
Fundo Nacional de Assistência Social: Proporciona recursos para o Benefício de prestação continuada (BPC) e para serviços, programas e projetos de assistência social; sendo de fundamental importância na política de assistência social aos municípios.
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação: Trata-se de uma autarquia federal que é responsável pela execução das políticas educacionais do MEC. Em 2018 os programas do FNDE distribuíram cerca de R$ 18,5 bilhões entre Estados e Municípios.
Fundo Nacional sobre Mudança do Clima: fundo vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e gerido pelo BNDES, que tem por objetivo oferecer suporte financeiro para o desenvolvimento dos programas e metas da Política Nacional de Mudança do Clima.
Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES): através deste fundo o governo oferece bolsas para estudantes em universidades privadas e a após a conclusão do curso o aluno se compromete a ressarcir os recursos do fundo.