Jair Bolsonaro e Donald Trump | Foto: Alan Santos/PR

A posição do governo brasileiro na eleição do novo presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) neste fim de semana não é só anti-América Latina e pró-America do Norte. Ela é pura adesão a Trump.

O nome do cubano-americano Mauricio Claver-Carone, apoiado pelo Planalto, representa o trumpismo mais retrógrado e obscurantista. Carone esteve à frente do programa América Cresce e é um agente ativo da Casa Branca em sua luta desesperada contra a hegemonia econômica da China.

O episódio do telefonema de Guedes a Steven Mnuchin para falar da eleição revela bem a que nível chegaram as relações entre os Brasil e EUA depois que Bolsonaro chegou ao Planalto.

Em junho Paulo Guedes liga para o secretário do Tesouro americano, Steven Mnuchin, para informar o nome do empresário Rodrigo Xavier, indicado por ele para o cargo. Pelo rodízio tradicional entre países latino-americanos, o Brasil tinha grande chance na disputa.

A resposta do americano foi lacônica. “A questão já está decidida. O indicado será Mauricio Claver-Carone”. Guedes calou-se e, imediatamente, Bolsonaro abriu mão do nome brasileiro e passou a apoiar a indicação de Trump.

“A questão já está decidida. O indicado será Mauricio Claver-Carone”, disse o Secretário do Tesouro dos EUA.

Desde que foi fundado, fruto de gestões do presidente Juscelino Kubitschek, em 1959, o presidente do BID, que tem sede em Washington, é um latino-americano.

“O acordo de fundação no BID se deu nesse ambiente de Guerra Fria. O Brasil usou de maneira inteligente sua relação com os EUA e foi uma vitória para a região. Ficou acertado que a sede seria em Washington e o presidente sempre latino-americano”, afirmou Claudio Puty, ex-secretário Internacional do Ministério do Planejamento e professor da Universidade Federal do Pará.

Claudio Puty, que foi representante do Brasil no BID, acredita que a eleição de Claver-Carone, único candidato registrado para a eleição deste sábado, confirma que o Brasil abriu mão de sua liderança. “Desmontamos todas as instituições de articulação regional”, disse ele.

Para o professor, o enfraquecimento da posição brasileira é anterior ao governo Bolsonaro, já que “os governos do PT tampouco apresentaram um candidato brasileiro para ocupar a presidência”. Em sua opinião, o que está ocorrendo agora é um agravamento da situação.

A decisão de Bolsonaro de apoiar o nome de um norte-americano para o cargo rompe uma tradição de 60 anos do BID e consolida o seu alinhamento automático com os Estados Unidos de Donald Trump. Significa também a renúncia por parte do governo brasileiro a qualquer tipo de liderança regional.

A decisão brasileira, além de ser prejudicial ao Brasil, enfraquece ainda mais o seu peso no Mercosul. O reconhecimento por parte dos EUA passou a ser prioritário na política externa do Brasil. Nenhuma articulação com os europeus foi feita pelo Brasil.

“O BID é muito importante como âmbito onde são definidas regras de investimentos para toda a região. Pode ajudar os americanos na disputa com os chineses”, opinou Feliciano de Sá Guimarães, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP).

O Mercosul unido teria conseguido impedir a eleição de Claver-Carone. Um dos temores que existe entre funcionários e autoridades do BID é justamente que a instituição se transforme numa ferramenta de política externa do governo Trump em sua guerra contra a China.

A eleição do BID é neste sábado (12). Os EUA têm 30% dos votos, enquanto o Brasil tem 11%, o segundo maior participante. Para vencer, é preciso alcançar a maioria dos votos e ter 15 dos 26 apoios regionais.

Caso seguisse a habitual rotação com presidentes de países que ainda não presidiram o BID, candidatos do Brasil ou da Argentina seriam os com mais chance de receber apoio significativo na disputa deste ano.

O Brasil pretendia disputar mas foi enquadrado por Trump. O presidente americano, mais uma vez, indicou que seus interesses são muito mais importantes do que qualquer tipo de aliança com outros países.

O mandato do presidente do BID é de cinco anos e, portanto, a linha-dura de Carone permaneceria à frente da instituição mesmo que Trump não seja reeleito em novembro.