Ataque mais recente foi na sexta (16): um atirador matou 8 pessoas em prédio da FedEx em Indianápolis

A “doença americana”, a matança indiscriminada de outros seres humanos por um atirador ensandecido, armado com fuzis de guerra vendidos em qualquer biboca, voltou a se mostrar em toda a intensidade nos Estados Unidos, com 41 mortos e dezenas de feridos em sete estados diferentes, no período de um mês.

O ataque mais recente foi na sexta-feira (16), quando um atirador massacrou oito pessoas a tiros e feriu outras seis em um prédio da empresa de entregas FedEx em Indianápolis, no estado de Indiana. Um funcionário da FedEx relatou à agência AFP ter visto o atirador em ação. “Eu vi um homem disparando uma metralhadora automática”.

Outro funcionário disse que estava comendo quando ouviu o que parecia ser “dois barulhos altos de metal”, seguidos de tiros. “Alguém foi atrás de um carro, até o porta-malas, e pegou outra arma. Então eu vi um corpo no chão”.

Parminder Singh disse à TV que sua sobrinha estava sentada no banco do motorista de seu carro quando o tiroteio começou e ela foi ferida. “Ela levou um tiro no braço esquerdo”, disse a testemunha. “Ela está bem, ela está no hospital agora”. Ele disse que sua sobrinha não conhecia o atirador.

O ataque ocorreu por volta das 23h em um armazém perto do Aeroporto internacional de Indianapolis, onde trabalham 4.500 pessoas, mas os voos não chegaram a ser afetados. A polícia depois identificou o assassino como Brandon Scott Hole, de 19 anos, um ex-funcionário. Ele se suicidou com um tiro assim que os policiais chegaram ao local.

O subchefe do departamento de polícia de Indianápolis, Craig McCartt, disse à rede de televisão CNN que a polícia não disparou nenhum tiro. “Parece haver uma falta de habilidades de resolução de conflitos e as pessoas são muito rápidas para pegar uma arma e resolver seus problemas com uma arma hoje”, afirmou McCartt. “Mas todos deveriam se preocupar com a frequência com que isso está acontecendo”.

Na segunda-feira (12), quatro pessoas foram mortas em uma escola de ensino médio em Knoxville, no Tennessee. Um aluno foi baleado e morto após abrir fogo contra policiais, e um agente ficou ferido.

No dia 8, na Carolina do Sul, na cidade de Rock Bill, um homem matou quatro vizinhos (um médico, a esposa dele e dois netos que estavam na casa), um técnico de ar condicionado e uma outra pessoa. Ao final de tudo, o atirador se matou com um tiro.

No mesmo dia, mas no Texas, em Bryan, um atirador abrir fogo em uma loja de móveis de que era funcionário e matou uma pessoa. Foi preso após trocar tiros com policiais.

Em 1º de abril, um homem armado matou quatro pessoas (entre elas, uma criança de 9 anos) em uma corretora de imóveis em Los Angeles, na Califórnia.

Antes, no dia 22 de março, um atirador abriu fogo em uma mercearia na cidade de Boulder, no Colorado, e chacinou dez pessoas. Menos de uma semana antes, o morticínio que reacendeu os holofotes sobre essa chaga da sociedade norte-americana, oito pessoas assassinadas por um atirador em três casas de massagens em Atlanta, na Geórgia.

Em 2018, outro massacre, o da escola Parkland, levou à maior manifestação em Washington contra essa violência absurda e que, entra ano, sai ano, se perpetua nos EUA. 500 mil jovens foram exigir do governo e do Congresso medidas efetivas.

A situação foi considerada pelo presidente Joe Biden como uma “epidemia” e “vergonha internacional” e voltou pela enésima vez, em se tratando de um mandatário norte-americano, a falar em “controlar as armas” no país.

Embora haja o excesso de armas, o absurdo da posse praticamente irrestrita de fuzis de guerra, a doença mental, o descontrole na venda, como várias vezes enfatizou o cineasta de Michael Moore, de “Tiros em Columbine” – a matança que acendeu o debate sobre o que estava acontecendo -, as armas não explicam tudo.

No vizinho Canadá ou na Suíça, é comum a posse de armas, mas não acontecem esses reiterados massacres nas escolas, locais de culto, cinemas e centros comerciais.

O buraco é mais embaixo. A ‘epidemia americana’, no seu sentido mais profundo, – apontam os analistas – são os ‘Mi Lai’, as chacinas, indiscriminadas e aleatórias, cometidas por tropas americanas contra civis nas guerras no exterior, voltando para casa.

E voltando depois de décadas de genocídio, invasões e tortura, contra outros povos, sempre glorificados pelo establishment, a mídia e Hollywood, em paralelo com a apologia do egocentrismo e da revanche dos apóstolos do neoliberalismo.

A decadência do Império como que implode em cada episódio dessa “epidemia americana”, expondo suas vísceras. A incapacidade de identificação com o próximo, a miséria espiritual, a doentia revanche, a violência indiscriminada e ensandecida. Tudo isso em meio à metástase da especulação em Wall Street, à carreira armamentista e à desigualdade que não cessa de inchar.

Esse tipo de tiroteio tresloucado traz a marca de uma sociedade que nos últimos 50 anos se dedicou a invadir terra alheia, pilhar, humilhar, seviciar e matar outros povos, deixando um rastro de devastação também nos que se viram reduzidos eles próprios a carne de canhão.

Sem falar no histórico, na formação dos EUA como nação, dos massacres de escravos e indígenas, aos quais se negava a condição humana. Sociedade, ademais, individualista ao extremo, crescentemente incapacitada à empatia, entorpecida pelo culto ao ódio nas redes e empurrada a se armar.