Escola João Amazonas lança curso sobre História da África e Racismo
Em um esforço contínuo para promover a educação crítica e combater o racismo, a Escola Nacional João Amazonas lançou um novo curso sobre “História da África, do racismo, da escravidão e a formação do Brasil”. O anúncio foi feito por Altair Freitas, historiador e diretor da escola, durante a Live do João, na terça-feira (21), que destaca a importância do tema para a compreensão da sociedade brasileira e a luta pelo socialismo.
Altair Freitas enfatiza a interligação entre a luta de classes, a luta pelo socialismo e a luta antirracista. “Para o PCdoB, a luta de classes, a luta pela superação do capitalismo, a luta pelo socialismo, a luta antirracista e a luta pela emancipação da mulher estão absolutamente vinculadas a esse projeto”, afirma. Ele ressalta que esses elementos são essenciais para a construção de uma nova sociedade.
Estrutura e conteúdo do curso
O curso é composto por sete aulas, todas ancoradas em pesquisas científicas avançadas e no pensamento marxista. Altair destaca aulas provocativas como a intitulada “Marx e Engels eram racistas?”, seguida por uma análise da contribuição do pensamento marxista para as lutas de libertação na África.
O curso inclui:
- O desenvolvimento humano na África: dos pré-humanos ao surgimento do Estado, com Ivaldo Marciano
- Visões acerca da escravidão e a construção do racismo no Brasil, com Ricardo Moreno
- Contribuições do Marxismo na Luta Antirracista, com Muniz Ferreira
O diretor convida todos os interessados a se inscreverem na plataforma de ensino a distância da Escola Nacional João Amazonas. “Qualquer camarada, qualquer pessoa pode fazer o curso. Quem já tem o cadastro é só acessar, quem não tem o cadastro, o cadastro é super rápido, super fácil de ser feito”, explica.
A Escola Nacional João Amazonas oferece uma variedade de cursos voltados para a formação política e ideológica, com uma forte ênfase na ciência e na análise crítica da realidade social. A plataforma de ensino a distância da escola disponibiliza 12 cursos que abordam o pensamento marxista e a visão do PCdoB sobre diversos temas.
Para mais informações e para se inscrever no curso, acesse a plataforma de EAD da Escola Nacional João Amazonas aqui.
Crítica ao capitalismo e defesa da educação crítica
Altair critica a incapacidade do capitalismo de resolver o problema do racismo, destacando a disparidade salarial entre trabalhadores negros e não negros. “O capitalismo, na nossa opinião, é um sistema bastante superado, esgotado, que não dá conta”, afirma. Ele reforça que a educação crítica, fundamentada no materialismo histórico e dialético, é essencial para a compreensão e superação das contradições da sociedade brasileira.
Ele conclama todos a participarem do curso e a utilizarem os conhecimentos adquiridos para fomentar debates e promover a luta antirracista. “Os cursos da escola, qualquer curso, mas em especial esse curso, podem ser assistidos individualmente ou coletivamente. Junta a turma ali, projeta a aula que está na internet, e isso pode gerar debate”, sugere, destacando a importância da formação contínua e do engajamento coletivo.
A importância do estudo organizado e sistemático
Marina Duarte, geógrafa e presidenta do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, além de presidenta da União de Negros pela Igualdade (UNEGRO-Bahia), destaca a relevância do estudo organizado e sistemático dos temas abordados no curso para a militância antirracista e comunista. “A estrutura do curso já se destaca por oferecer uma formação robusta, com início, meio e fim bem definidos”, afirmou. Ela também refletiu sobre a abolição da escravidão no Brasil, destacando a importância de entender o contexto histórico e as consequências da abolição sem um pós-abolição efetivo. “O 13 de maio é um momento de luta, de avaliação de uma libertação inacabada, de uma falsa abolição. A estrutura escravocrata e racista que nos matou e que ainda tenta nos aniquilar precisa ser estudada profundamente para compreendermos suas ramificações na sociedade atual”, explica.
Outro ponto crucial abordado por Marina é a importância de estudar as contribuições do pensamento marxista para a luta antirracista. “Em tempos de fake news, é fundamental fazermos o link entre os estudos marxistas e as lutas atuais. Isso enriquece a nossa formação e fortalece a militância dentro do PCdoB”, afirma. Ela ressalta que a compreensão histórica e teórica permite a construção de estratégias de luta mais eficazes e informadas.
Marina também fala sobre os desafios enfrentados desde o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff e a subsequente derrubada de direitos sociais. “Estamos em um processo de reestruturação após um desmonte planejado das políticas públicas. Enquanto movimento social e movimento negro, lutamos para reconstruir o país e as políticas que foram destruídas”, afirma.
Formação política e luta racial
Manuel Júlio Vieira, conhecido como Julião, membro da coordenação nacional da UNEGRO e dirigente do comitê estadual do PCdoB em São Paulo, destaca a importância deste curso, especialmente após a realização da Conferência Nacional de Combate ao Racismo no ano passado. Julião ressalta que o curso representa uma vitória significativa para os militantes negros e para o PCdoB como um todo. “É um desafio compreender a luta racial em sua dimensão de classe e como parte integrante da luta de libertação nacional. Este curso oferece uma formação política essencial para os quadros do partido, desde a direção nacional até os militantes de base”, destacou.
A primeira Conferência Nacional de Combate ao Racismo do PCdoB, que ocorreu no ano passado, teve um papel crucial na formulação do conteúdo do curso. “A conferência envolveu toda a militância e tratou de temas que agora estão entrelaçados nas aulas deste curso, como o papel da escravidão, a questão racial e racismo, a soberania nacional, a luta das mulheres negras e da juventude negra”, explica Julião. Ele também destaca a liderança de Olivia Santana e Edson França nesse processo.
Julião destaca a importância de abordar o racismo a partir de uma perspectiva marxista. “Existe um certo preconceito em relação à compreensão marxista da luta racial, mas é essencial entender como as revoluções africanas, conduzidas por partidos comunistas, se inspiraram no marxismo. O conteúdo do curso ajuda a esclarecer esses pontos e a compreender melhor o racismo estrutural no Brasil”, afirma.
Julião conclui ressaltando a importância do curso para a militância do PCdoB e para a compreensão das estruturas raciais e sociais no Brasil. “Compreender o racismo estrutural e suas implicações na sociedade brasileira nos ajudará a assimilar a luta de libertação nacional do povo brasileiro. Este curso é um passo importante para nossa formação política e para a luta antirracista”, finaliza.
Desmistificando o marxismo na luta antirracista
O historiador Muniz Ferreira, doutor pela Universidade de São Paulo e professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, tem uma extensa obra publicada sobre marxismo, além do Dicionário Crítico do Pensamento de Direita. “Esse curso oferece uma oportunidade ímpar de instrumentalizar nossos companheiros da Unegro e do PCdoB para o enfrentamento do racismo, tanto no plano geral da sociedade quanto dentro do próprio movimento negro, onde existem discursos que desqualificam a importância do instrumental teórico e político marxista na luta pela emancipação do povo negro”, afirma Muniz Ferreira.
Muniz Ferreira afirma que sua participação no curso incluiu a tarefa de abordar a controvérsia sobre a utilidade do marxismo na luta antirracista. Ele explica que as posições de Karl Marx e Friedrich Engels, desde o século XIX, já condenavam o colonialismo e a escravidão, e que a obra de Lenin no século XX continuou essa tradição, culminando em importantes iniciativas anticoloniais, como o primeiro congresso dos povos do Oriente em 1920.
O professor destaca várias contribuições dos movimentos comunistas e socialistas para as lutas de libertação na África, incluindo o apoio da Revolução Cubana às lutas de independência em países como Angola e Argélia. “É importante lembrar o papel que Cuba desempenhou na consolidação da independência angolana, enfrentando a invasão da África do Sul racista com o apoio militar e armamentista soviético”, disse Muniz Ferreira.
O historiador também menciona importantes intelectuais marxistas como Claudia Jones, pioneira no pensamento sobre interseccionalidade, e outros militantes revolucionários que contribuíram significativamente para a luta antirracista. Ele criticou a invisibilização dessas figuras por discursos antimarxistas e anticomunistas que predominam em alguns setores do movimento negro.
“Para mim, é inimaginável a emancipação do povo negro sem a superação do capitalismo”, declarou Muniz Ferreira. Ele argumentou que o capitalismo é incapaz de resolver o problema do racismo, afirmando que nenhuma sociedade capitalista conseguiu eliminá-lo. “O capitalismo foi o único modo de produção que a Europa exportou para o resto do mundo, enquanto o socialismo, com suas experiências igualitárias e comunitárias, está inscrito na formação de diversas sociedades, incluindo as africanas”, acrescenta.
Muniz Ferreira conclui sua fala expressando a importância de recuperar e refletir sobre a contribuição dos intelectuais marxistas na luta antirracista. “A luta antirracista é necessariamente uma luta anticapitalista”, finaliza.
O desafio da divulgação de ideias
O professor Ricardo Moreno, doutor em História pela Universidade Federal Fluminense e professor da Universidade Estadual da Bahia, abordou temas cruciais sobre os desafios enfrentados pelos marxistas na atual conjuntura. Ele também é dirigente estadual do PCdoB na Bahia e membro do Núcleo Nacional de Ensino e Pesquisa sobre Estado e Classe da Escola João Amazonas, e destaca a importância de reflexões internas dentro do movimento marxista. Ele citou um exemplo de uma palestra em Salvador, onde uma autora em voga, durante um evento organizado pela Secretaria de Política para Mulheres (dirigida pelo PCdoB na época), fez uma declaração anti-marxista que foi amplamente aplaudida. “Isso nos faz refletir sobre onde estamos falhando, porque estamos dando espaço e palanque a ideias que são contra nós”, disse Moreno.
O professor destaca a necessidade de fortalecer a divulgação das ideias marxistas, que atualmente têm sido ofuscadas por conceitos pós-estruturalistas e culturalistas que fragmentam a sociedade. “Nós, marxistas, estamos perdendo essa corrida no plano das ideias porque existe uma massificação de conceitos que são forjados justamente para nos combater”, afirma. Moreno ressalta que essas ideias não apenas se opõem à perspectiva sistêmica e global da luta revolucionária, mas também colaboram para a manutenção do status quo ao dividir e fragmentar as forças progressistas.
Moreno enfatiza a necessidade de os comunistas manterem uma visão estratégica que articule as lutas particulares com a luta geral pela transformação da sociedade. “Aprendi no Partido Comunista que devemos atuar em qualquer frente com a tarefa de articular aquela luta particular com a luta geral de transformação da sociedade. Isso define a nossa tarefa histórica e a nossa visão estratégica”, explicou.
Por isso, ele elogia o curso desenvolvido e ressalta que o curso foi elaborado para oferecer uma concepção científica e instrumentalizada para enfrentar o debate antirracista. “Estamos aqui para nos diferenciar das posturas que fragmentam a sociedade e destruem a perspectiva transformadora”, afirma. Para reforçar sua argumentação, Moreno cita o pensador Domênico Losurdo, que propôs atualizar o conceito de luta de classes, destacando que esta não é apenas uma luta econômica, mas uma concepção geral da emancipação humana. “A luta de classes, como proposta por Marx, é uma concepção geral da emancipação humana. Isso coloca no comunista a condição de se opor a toda e qualquer forma de opressão, sem perder a perspectiva da transformação sistêmica e global da sociedade”, explica.
Moreno reforça a importância de manter uma identidade comunista clara e distinta nas diversas frentes de luta. Ele ressaltou que o curso é uma contribuição significativa para fortalecer essa identidade e para enfrentar os desafios ideológicos contemporâneos. “Devemos nos instrumentalizar cada vez mais para enfrentar o debate sem ingenuidade, separando ideias que nos fragmentam e fortalecendo nossa identidade comunista”, finalizou.
Assista ao lançamento do curso com participação de lideranças da UNEGRO e professores: