Jair Bolsonaro (sem partido)

A instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) destinada a investigar a responsabilidade do governo Bolsonaro no enfrentamento da pandemia é uma das maiores derrotas de seu governo. Se for associada a outras duas grandes derrotas que ele sofreu no STF – a anulação dos “julgamentos” de Moro contra Lula e a oficialização de que Moro foi abertamente parcial nesses julgamentos, o que torna o ex-presidente elegível – tem potencial para encerrar seu mandato, se não pelo impeachment, pelo total colapso do governo, que continuará fingindo que governa sem que ninguém lhe leve a sério.

Por Eron Bezerra*

Assim, a primeira questão que precisa ficar claro é que vai ter início, com a instalação da CPI, a investigação não de um crime qualquer, mas de um genocídio. E as provas para comprovar que se tratou de um genocídio são fartas e devidamente comprovadas por declarações públicas, vídeos e atos oficiais praticados pelo governo Bolsonaro. A CPI, se quiser, encerra esse curto e desastroso mandato.

Mas é preciso focar na essência e não na aparência. Não precisa esmiuçar as 18 irregularidades que serviram de base para justificar a CPI e tampouco as 23 irregularidades que o próprio governo reconhece que praticou, através da Casa Civil, conforme expediente enviado aos ministérios. A situação é tão grave que o próprio governo admite mais crimes do que aqueles que a CPI se dispôs a investigar.

Por isso, insisto, é preciso concentrar a investigação em três blocos: crimes contra a saúde pública, corrupção e incompetência gerencial.

No bloco de crimes estão a recusa em comprar vacinas, incentivo e prática de aglomerações, deboche do uso de máscaras, além da imposição do uso de medicamentos sem eficiência terapêutica e hoje sabidamente nocivos à saúde humana.

No bloco da corrupção está, por exemplo, comprar e distribuir toneladas de contrabando medicamentoso com dinheiro público, como atestam os milhões de doses de cloroquina que o governo comprou e certamente alguém ganhou muito dinheiro com isso. Comprar medicamentos que não curam é desvio de dinheiro público. E ponto.

E no bloco da incompetência, que também pode ser interpretado como má fé e sabotamento à saúde pública, estão a absoluta falta de coordenação nacional no enfrentamento da pandemia, a qual exigia medidas objetivas tais como: plano nacional de isolamento rigoroso para conter a propagação e garantir, com segurança, o retorno as atividades econômicas; auxílio social de R$ 1 mil compartilhado (federal, estadual e iniciativa privada) para efetivamente assegurar que a população não fosse obrigada a arriscar a vida para sobreviver; ampliação de leitos hospitalares, insumos como oxigênio e UTI; campanha massiva de esclarecimento e do papel de cada um no enfrentamento da pandemia, além do incremento da pesquisa na busca de soluções nacionais para a superação da Covid 19.

Nada disso foi feito e agora pouco importa saber se por criminoso negacionismo, incompetência, mau uso do dinheiro público ou por tudo isso combinado. O fato é que nos aproximamos dos 400 mil mortos e esse governo precisa ser parado antes que as mortes se ampliem e o colapso econômico se torne irreversível, na medida em que só é possível a retomada da economia com a plena superação da pandemia. O Brasil precisa de paz, tranquilidade e governo e, por enquanto, não temos nada disso.

Eis porque a CPI é tão importante e porque Bolsonaro tentou (e ainda tenta) manobrar para desviar seu foco investigativo, fazendo com ela se perdesse numa sequência sem fim de investigações secundárias a nível dos estados.

Mas o fato de a CPI ser presidida e relatada por senadores que já foram governadores, respectivamente Omar Aziz (PSD-AM) e Renan Calheiros (MDB-AL), não indica que os governadores serão o principal alvo da CPI, que deverá se concentrar naquilo que lhe deu causa: a responsabilidade do governo Bolsonaro na gestão da crise sanitária. E aí sobram fatos e evidências de sua culpabilidade, seja sabotando a compra de vacinas, o distanciamento social, o uso de máscaras e ou impondo o uso de medicamentos sem qualquer eficiência terapêutica e com graves efeitos colaterais.

O Senado tem o dever histórico de nos oferecer uma saída que possibilite ao país superar essa tragédia.

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Eron Bezerra* é professor da UFAM, doutor em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia, coordenador nacional da Questão Amazônica e Indígena do comitê central do PCdoB.

 

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