O governador de São Paulo João Doria enviou para a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), nesta quarta-feira (12), um projeto de lei de reforma administrativa que visa extinguir 11 empresas, autarquias e fundações até o início 2021, essenciais para moradia, transporte e saúde pública. O argumento do governo para tal decisão é cortar os gastos por prever uma queda na arrecadação provocada pela pandemia do coronavírus e a falta de apoio federal para enfrentar a crise.

Entre as empresas que o governo quer acabar estão a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) e a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU) (veja lista completa abaixo). Com o projeto, a gestão João Doria (PSDB) pretende deixar 5.600 funcionários públicos desempregados e diz que com isso irá aumentar a arrecadação em R$ 8,8 bilhões.

Além do desemprego, Doria pretende acabar completamente com a política de habitação da cidade. A justificativa do governo é não ter perspectiva de auxílio do governo federal para enfrentar as dificuldades no próximo ano.

A CDHU é hoje uma das maiores companhias habitacionais do mundo e movimenta perto de 1,5 bilhão de reais por ano, orçamento superior à receita da maioria dos municípios paulistas.

Desde que iniciou suas atividades, construiu e comercializou por volta 539 mil novas unidades habitacionais, número que compõe cerca de 3.600 conjuntos habitacionais em 639 municípios (97%), de um total de 645 em todo o Estado (dados de 2019).

Nessas casas moram cerca de 2,2 milhões de pessoas, número superior à população da grande maioria dos municípios brasileiros.

A produção em massa de moradias consome toneladas de materiais de construção, movimenta centenas de máquinas e equipamentos e emprega grande contingente de trabalhadores. Além da geração indireta de milhares de empregos.

Os funcionários da Companhia detêm amplo conhecimento na condução e produção de moradias habitacionais. Esta experiência acumulada permite implementar a política habitacional do Governo do Estado.

É importante observar que a atuação da CDHU vai além da construção de moradias. Desde 1989 a Companhia tem promovido também importantes ações de desenvolvimento urbano.

Ações tais como o Programa de Atuação em Favelas e Áreas de Risco e o Programa de Atuação em Cortiços, por exemplo, extrapolam a simples provisão de moradias e inserem-se num processo de renovação urbana.

A empresa vem atuando também no que diz respeito à regularização fundiária de inúmeros empreendimentos e recuperação ambiental de diversas áreas.

Além das extinções das empresas, o texto do projeto de lei prevê ainda um corte de 20% de todos os benefícios fiscais concedidos a todos setores da economia. Atualmente, o governo deixa de arrecadar R$ 40 bilhões ao ano com a isenção de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

A proposta de Doria precisa passar pelas comissões da Alesp antes de ser avaliada pelos deputados estaduais. Antes mesmo de chegar a qualquer comissão, o projeto já é rechaçado. Em um manifesto, 84 pesquisadores saem em defesa da Fundação Florestal.

“Os recursos financeiros no primeiro semestre de 2020 foram pouco mais de R$ 174 milhões, dos quais apenas 30% vieram do Tesouro do Estado de São Paulo e o restante composto por projetos, compensação ambiental e receita própria”, argumentam os pesquisadores.

“Estes valores permitem ganhos para a sociedade paulista superiores a 15 vezes o investimento e garantem a manutenção de milhares de postos de trabalho bem distribuídos. A economia de sua extinção é praticamente nula frente às projeções de necessidade de redução de déficit do governo do estado”, continuam no manifesto.

Entre outros pontos, o grupo lembra que:

  • o planeta vive uma crise do clima e da biodiversidade, com um milhão de espécies ameaçadas e cerca de dois terços dos habitats naturais comprometidos no mundo;
  • o governo do estado assumiu o compromisso, em fevereiro, durante a conferência BIO 2020, de se engajar em um acordo global pela natureza e pelas pessoas;
  • os impactos sociais e econômicos da pandemia da Covid-19 têm origem justamente na degradação da natureza e na falta de cuidados com a vida silvestre;
  • além de proteger um patrimônio público, o investimento em áreas de proteção gera movimento da economia, com postos de trabalho e milhões de reais em carbono estocado;
  • as unidades de conservação são fundamentais para pesquisa científica de institutos e universidades;
  • as unidades de conservação são obrigações constitucionais, visto que são ferramentas para a proteção da natureza e dos valores culturais, conforme o artigo 225 da Constituição Federal;
  • das 130 unidades de conservação sob responsabilidade do estado de São Paulo, 102 estão sob gestão da Fundação Florestal, que correspondem a cerca de 4,6 milhões de hectares, além de 56 reservas privadas (RPPNs), com mais de 17 mil hectares;
  • os números mostram que o órgão conseguiu reduzir os desmatamentos no estado, investir no ecoturismo, aumentar o número de visitantes e gerar renda para comunidades locais

“Concluímos que o estado de São Paulo, enquanto guardião dos maiores remanescentes da Mata Atlântica (segundo maior bioma florestal do Brasil e o mais devastado bioma do país), de trechos de Cerrado ameaçados em alto grau, e da importante biodiversidade costeira e marinha em suas costas, tem uma responsabilidade intransferível de zelar pela boa gestão de suas unidades de conservação – principal razão de ser da Fundação Florestal de São Paulo”, afirmam os pesquisadores.

O Sindicato dos Trabalhadores Públicos na Saúde do Estado de São Paulo (SindSaúde-SP) se manifestou contra a extinção da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), da Fundação para o Remédio Popular (Furp) e da Fundação Oncocentro de São Paulo (Fosp), todos ligados à saúde pública. “Temos de ficar atentos e mobilizados para que não tratem desse assunto de forma atropelada. Tentam repetir o que fizeram com as discussões da reforma da Previdência”, alerta a presidenta do SindSaúde, Cleonice Ribeiro.

Para o SindSaúde-SP, a medida é mais um ataque do governo aos trabalhadores. “Quer colocar nas costas dos profissionais a responsabilidade da má gestão. Usa termos como ‘modernização administrativa’ para tentar disfarçar mais essa crueldade”, avalia a entidade.

O sindicato alerta ainda que, além de prejudicar os trabalhadores, a extinção da Sucen “pode agravar o terrível momento que estamos enfrentando”. A autarquia é responsável pelo controle de doenças como a dengue, em municípios que não possuem equipes para realizar esse serviço. Além disso, oferece formação a profissionais municipais e insumos para o controle dos mosquitos Aedes aegypti, que transmitem a doença.

Se a Fosp for extinta, questiona o sindicato dos servidores, como ficará, por exemplo, a reabilitação dos pacientes mutilados por câncer nas regiões da cabeça e pescoço? “É um serviço de excelência, que atende pacientes de todo o Brasil por meio do SUS”, reforça Cleonice.

A fundação possui um laboratório que atende a 540 unidades de saúde espalhadas pelo estado. Além disso, são realizados cerca de 250 mil exames Papanicolau e 13,7 mil biópsias de colo, mama e pele por ano. Além disso, mais de 3 mil municípios em todo o país são atendidos pela Furp, que produz medicamentos a baixo custo. Também não se sabe o que seria feito dos trabalhadores das duas fábricas, em Guarulhos, região metropolitana da capital, e em Américo Brasiliense, no interior. Só na unidade de Guarulhos, cerca de mil funcionários temem perder seus empregos caso o governo do estado mantenha os planos de desmantelar o sistema público de saúde.

Veja todas as empresas que o governo pretende extinguir:

1. Fundação Parque Zoológico de São Paulo;

2. Fundação para o Remédio Popular “Chopin Tavares de Lima” (FURP);

3. Fundação Oncocentro de São Paulo (FOSP);

4. Instituto Florestal;

5. Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano de São Paulo (CDHU);

6. Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo S. A. (EMTU/SP);

7. Superintendência de Controle de Endemias (SUCEN);

8. Instituto de Medicina Social e de Criminologia (IMESC);

9. Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo (DAESP);

10. Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo “José Gomes da Silva” (ITESP);

11. Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual de São Paulo (IAMSPE).