Realizada, neste domingo (2), em São Paulo, a reunião entre o Comitê Central do Partido Comunista do Brasil e o Congresso Extraordinário do Partido Pátria Livre, que aprovou a incorporação do PPL ao PCdoB

Por José Carlos Ruy*

O emocionante evento que concretizou, no domingo (2), a incorporação do Partido Pátria Livre ao Partido Comunista do Brasil foi um ato para fortalecer a resistência democrática contra as ameaças de radicalização direitista pelo presidente eleito Jair Bolsonaro e seu governo, que tomará posse no dia 1º de Janeiro de 2019.

Foi a sessão conjunta entre o Comitê Central do Partido Comunista do Brasil e o Congresso Extraordinário do Partido Pátria Livre, na qual ambas as instâncias de direção aprovaram por aclamação a incorporação do PPL ao PCdoB e a nominata com 170 nomes ( os 130 nomes do Comitê Central do PCdoB e um elenco de 40 lideranças indicado pelo PPL). Essa nominata será votada em 17 de março do ano próximo, numa sessão conjunta dos congressos das duas legendas, conforme exigência da lei, quando se coroa esse processo.

A emoção e o caráter festivo desta reunião entre dois partidos de larga tradição da esquerda brasileira foram expressas na própria designação da comissão que, em menos de um mês, articulou a incorporação: Comissão de Enlace.

É o encontro de dois partidos políticos cuja afinidade não se define apenas pelo necessário fortalecimento da resistência contra as adversidades que se anunciam com a próxima posse da extrema-direita no comando da República, e para enfrentar a autoritária, antidemocrática e excludente cláusula de barreira imposta pela legislação eleitoral.

As afinidades entre PCdoB e PPL estão no DNA político das duas organizações, originárias do mesmo tronco comum que, surgido em 25 de março de 1922, deu origem organizada ao comunismo brasileiro – o Partido Comunista do Brasil, então designado com a sigla PCB. DNA político que se manifestou, desde a década de 1960, em diferentes expressões organizativas, com o mesmo objetivo futuro (a conquista do socialismo) mas com táticas políticas que se diferenciaram. O PCdoB como continuidade do Partido Comunista do Brasil, fundado em 1922 e reorganizado em 18 de fevereiro de 1962. O PPL resultou de uma cisão no PCB que, em 1966, era conhecido como Dissidência Guanabara e desde 1969 assumiu o nome de Movimento Revolucionário 8 de Outubro, com a sigla MR-8. Atuou, nas décadas seguintes, dentro do PMDB até que, em 2009, rompeu com este partido, surgindo então o Partido Pátria Livre.

Afinidades expressas afetivamente na palavra “enlace” usada para nomear a aproximação entre os dois partidos.

A incorporação de partidos não é nova nem para os comunistas nem para os democratas brasileiros, no enfrentamento de ameaças à democracia.

O PCdoB, logo após a reorganização de 1962, estava muito enfraquecido. A grande maioria dos militantes e dirigentes não conseguiu romper com a direção partidária de então, nem com os revisionistas que eram maioria nela. Um punhado de dirigentes revolucionários, entre eles João Amazonas, Maurício Grabois e Pedro Pomar galvanizaram a ação de mais ou menos 10% do velho PCB, que continuou hegemônico na esquerda brasileira. As dificuldades, imensas, cresceram ainda mais depois do golpe militar de 1964 e sua fúria antidemocrática e anticomunista. Dificuldade acentuada ainda mais depois do início da Guerrilha do Araguaia, precipitado pela repressão em abril de 1972. Nessa ocasião, o PCdoB recebeu o reforço enorme que representou a incorporação da APML – Ação Popular Marxista Leninista, uma organização socialista e revolucionária, de origem católica e com forte atuação no movimento estudantil, sobretudo na União Nacional dos Estudantes (UNE).

Outro exemplo de incorporação partidária no esforço de resistir às investidas contra a democracia é o que ocorreu nos anos finais da ditadura de 1964. Para derrotar a oposição, que crescia nos movimentos sociais e nas eleições, o governo do general João Figueiredo extinguiu o bipartidarismo Arena e MDB, em 1979, e criou regras para a organização de novos partidos. Nasceram então o PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) e o PP (Partido Popular, que reunia, em torno de Tancredo Neves, democratas moderados, que surgiu em 12 de fevereiro de 1980, mas teve vida efêmera. A legislação eleitoral da ditadura proibiu coligações partidárias em eleições majoritárias e impôs o chamado voto vinculado (o eleitor era obrigado a votar nos candidatos de um só partido), uma manipulação para favorecer os candidatos da ditadura na eleição vindoura, em 1982.

Para Tancredo Neves aquela era uma “pantomima cívica” e disse que “nunca fomos um partido de áulicos, de subservientes”. Em uma convenção ocorrida em 2 de dezembro de 1981 o PP decidiu incorporar-se ao PMDB para fortalecer a resistência democrática e a luta contra a ditadura.

Movimento democrático de sentido semelhante ao ocorrido neste domingo (2) – a incorporação do PPL ao PCdoB para fortalecer a resistência democrática ante a ameaça fascista que se configura desde a vitória eleitoral do extremista de direita Jair Bolsonaro.

Enlace partidário comemorado conjuntamente ao som do Hino Nacional, do Hino da Independência (ou ficar a pátria livre/ou morrer pelo Brasil) e do Hino do PCdoB, a canção “A bandeira do meu partido”, de Jorge Mautner: “Mas a bandeira do meu Partido / vem entrelaçada com outra bandeira / a mais bela, a primeira / verde-amarela, a bandeira brasileira”.

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*Jornalista, escritor, estudioso de história e do pensamento marxista.