A edição mais recente da Conae foi em 2018, já enfraquecida pelo governo de Michel Temer.

Entre os dias 28 e 30 de janeiro de 2024, a Universidade Federal de Brasília (UnB) sediará a Conferência Nacional de Educação (Conae), um evento para discutir o futuro da educação no Brasil. Sob o tema “Plano Nacional de Educação 2024-2034: Política de Estado para garantia da educação como direito humano com justiça social e desenvolvimento socioambiental sustentável”, a conferência marca uma retomada significativa após seis anos de descontinuidade.

À medida que se aproxima a Conae, as entidades e organizações envolvidas intensificam os preparativos para participar desse importante fórum de debates educacionais. Madalena Guasco Peixoto, coordenadora da Secretaria-Geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) e diretora da Faculdade de Educação da PUC-SP, compartilhou detalhes sobre os esforços do Partido para garantir uma participação estratégica de seus delegados no evento.

Uma das iniciativas destacadas por ela é a realização de um encontro programado para o dia 20 de janeiro, reunindo cerca de 200 pessoas, entre delegados e representantes de diversas entidades. O propósito principal do encontro é fornecer orientações gerais sobre o comportamento que o PCdoB deverá adotar durante a conferência. Além disso, será uma oportunidade para troca de informações, uma vez que os participantes estiveram envolvidos nas conferências estaduais, oferecendo insights valiosos sobre os debates realizados em seus respectivos estados.

“Estamos querendo chamar esse pessoal para não só fazer uma orientação geral do nosso comportamento na conferência, ouvir também, inclusive porque eles participaram das conferências estaduais e vão nos dar também informações de como foi o embate lá, como também nos organizar”, explica.

Um dos pontos de discussão será a elaboração de um documento que representará o posicionamento do partido durante a Conae. A educadora mencionou a importância de decidir se o partido apresentará um documento único ou se optará por posicionar-se em blocos de temas específicos. Dentre esses temas, destaca-se a discussão em torno da possível criação de uma agência reguladora de educação superior privada, proposta que gerou controvérsias e motivou manifestações contrárias em alguns estados.

“Tem um temário que é importante, que é a discussão sobre agência reguladora. Surgiu na mídia que o ministro da Educação queria fazer uma agência reguladora de educação superior privada. Agência reguladora não é regulamentação do Estado. Então a gente conseguiu em alguns Estados tirar uma manifestação contrária a essa posição. Isso vai aparecer também”, ressalta Madalena.

Temário essencial

O encontro estratégico também visa identificar os temas essenciais que serão foco de debates durante a Conae, proporcionando uma visão clara dos assuntos prioritários para o partido. Com essa abordagem planejada e participativa, a expectativa é que o partido possa contribuir de maneira significativa para os debates e deliberações que moldarão o futuro da educação no país.

Madalena ressalta a importância desse encontro prévio para debater a relevância da conferência e o papel que o partido desempenhará durante os três dias de debates.

“Estamos querendo fazer esse encontro com os delegados do partido porque nós temos uma grande responsabilidade. Primeiro porque a gente dirige as principais entidades nacionais, tanto de estudantes como de professores e auxiliares. E segundo, porque nós também dirigimos e participamos de vários movimentos sociais que estão envolvidos nesse debate. Então nós temos uma responsabilidade grande, por isso nós queremos debater com os nossos delegados a importância dessa conferência e qual o nosso papel durante esses três dias de debates que vão acontecer lá em Brasília”, destacou Peixoto.

A educadora enfatizou que o debate sobre educação não se limita apenas ao âmbito educacional, sendo um tema transversal que abrange áreas como ciência, tecnologia, cultura e inovação. Com a ministra de Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, sendo do Partido, a responsabilidade de abordar essas temáticas torna-se ainda mais crucial. “É claro que nós temos uma responsabilidade também aumentada nesse ponto de vista. Nós temos uma ministra de Ciência, Tecnologia e Inovação, que tem uma concepção de ampliação da ciência e da tecnologia e, claro, responsabilidade com o fortalecimento da universidade brasileira, principalmente a universidade pública. Então, isso pra nós também é fundamental”, explica.

Ela complementa que a educação não é um debate só educacional, mas também transversal. “É a discussão da importância da CT&I, da formação de quadros, a importância da discussão sobre a cultura brasileira, o fortalecimento da cultura e da produção cultural brasileira. Então, ela é um tema que atravessa, e vai além da questão da educação escolar propriamente ou educação formal”.

Com isso, a dirigente sindical mostra que os comunistas se preparam para contribuir ativamente com o novo Plano Nacional de Educação. Ela enfatizou que o foco principal dos comunistas na conferência é discutir um projeto que promova a redemocratização da educação brasileira. Os comunistas estarão focados em delinear propostas e estratégias que promovam a redemocratização e aprimorem a educação no Brasil, visando contribuir efetivamente para o novo plano nacional de educação. A Conae promete ser um espaço crucial para essas discussões essenciais.

“O que nós vamos discutir nesse encontro vai ser, que nós estamos lá para contribuir com o novo PNE. Não é uma conferência para debater qualquer tema. É uma conferência que tem por objetivo discutir um novo projeto de redemocratização da educação brasileira e orientar as questões que vão estar presentes no novo PNE. Então o primeiro debate nosso vai ter esse foco”, destaca.

Ela ressalta que, embora haja várias mesas temáticas durante a conferência, o objetivo primordial é alinhar-se ao propósito central da Conae, para evitar desvios de foco e favorecer temas paralelos e diversionistas. Além disso, a educadora destacou a importância de respeitar as contribuições provenientes dos municípios e estados, resultado de debates nacionais realizados anteriormente. Os comunistas assumem a responsabilidade de elaborar uma conferência vitoriosa que cumpra seu papel fundamental.

“Foi feito um debate nacional nos municípios e dos estados, então o documento final tem que respeitar as contribuições que vieram dos municípios e dos estados, e aprovar aquilo que veio, que fortalece o documento básico. Então, os comunistas têm essa tarefa, que é elaborar uma conferência que seja vitoriosa, uma conferência que cumpra o seu papel”, acrescenta.

O encontro programado para o dia 20 de janeiro será uma oportunidade para alinhar estratégias, debater temas essenciais e definir o posicionamento do partido durante a Conae. Com a responsabilidade de dirigir importantes entidades nacionais e movimentos sociais, o Partido busca consolidar uma atuação coesa e significativa nas discussões que moldarão o futuro da educação no Brasil.

Importânica da reconstrução

Madalena destaca a importância deste evento, ressaltando a trajetória conturbada do Fórum Nacional de Educação nos últimos anos.

“O Fórum verdadeiro foi destituído pelo governo Michel Temer e depois foi esvaziado pelo governo Bolsonaro. Uma das lutas nossas quando a gente assumiu o governo, foi exatamente resgatar o Fórum Nacional de Educação. Então, o governo Lula resgatou-o, nos moldes que ele tinha antes, desse fórum democrático e representativo, com participação de todas as entidades”, explica Madalena.

A Conae extraordinária foi convocada devido à iminência do vencimento do Plano Nacional de Educação (PNE) em 2024, que, segundo a educadora e sindicalista, não cumpriu 65% de suas metas. A conferência visa debater as diretrizes do novo PNE, com um enfoque democrático e participativo, envolvendo estudantes, professores, entidades e movimentos sociais.

“Uma grande mobilização popular, em cima de um documento base para debater a educação nacional e apontar as prioridades para o novo PNE. Por isso que essa Conae é extraordinária”, afirma.

Além das conferências municipais e estaduais, diversos movimentos sociais organizaram conferências temáticas para discutir questões específicas, ampliando o alcance e a profundidade das discussões. A Conae representa, assim, um marco na retomada da mobilização popular para debater o futuro da educação no Brasil, destacando a importância da reconstrução da educação democrática.

Debate acalorado

A iminente Conferência promete ser palco de debates acalorados sobre os desafios e metas não cumpridas na educação brasileira. Madalena detalha alguns dos temas centrais que serão discutidos durante o evento.

A educadora destacou a não realização de metas cruciais estabelecidas anteriormente. Um exemplo notório é a meta de ampliação de 40% das vagas nas instituições públicas, especialmente nas federais, ao longo de uma década. Essa meta não apenas deixou de ser cumprida, mas houve uma estagnação e até um enfraquecimento das instituições federais durante o governo Bolsonaro. Madalena aponta para a desregulamentação da educação à distância, principalmente no setor privado, como uma resposta inadequada e prejudicial a essa falta de avanço.

“Essa desregulamentação da educação à distância, privada, de grupos de capital aberto, que ampliaram seu escopo, através de cursos de péssima qualidade. Então, claro, está articulada a ideia da não ampliação das vagas públicas com o fortalecimento de uma educação privada de capital aberto. Esse foi o jogo deles”, esclarece ela.

No contexto da Conae, a regulamentação da educação privada, o fortalecimento da educação pública, a avaliação e a supervisão estatal serão temas centrais de discussão. Os eixos estabelecidos no documento base da conferência buscam orientar as reflexões sobre a elaboração do novo Plano Nacional de Educação, considerando os desafios e as lacunas que se acumularam nos últimos anos.

“Agora o governo Lula tem dito, nós vamos ampliar o número dos institutos e vamos ampliar o número de vagas. Porque é claro, se você não amplia o número de vagas públicas, você fortalece a educação privada”, complementa.

Dessa forma, a Conae se configura como um espaço crucial para a construção de diretrizes que nortearão a educação no Brasil nos próximos anos, buscando superar os desafios e corrigir os rumos diante das metas não alcançadas.

Guerra cultural

A Conae traz consigo não apenas debates sobre metas educacionais, mas também enfrenta desafios decorrentes da intensificação da polarização política no país. Madalena aborda como a extrema direita tenta se inserir no contexto da conferência.

As ameaças e ataques que a Conae vem enfrentando por parte da extrema direita, fazem com que o Fórum reforce medidas de segurança para o evento, que será realizado na UnB. Madalena ressalta a importância da mobilização da sociedade brasileira para entender o caráter democrático da conferência.

“O mais importante é a mobilização, entender o caráter dessa conferência, entender esse caráter e fortalecer, porque é fundamental que a sociedade brasileira faça o diagnóstico da educação nacional e faça também propostas para o novo plano nacional de educação”, enfatizou.

Um dos aspectos-chave dessa inserção é a disseminação de fake news e o envolvimento na chamada “guerra cultural”. Madalena Guasco Peixoto observa que temas como a regulamentação da internet e a sustentabilidade ambiental, embora não sejam eixos específicos do evento, são agora parte integrante do debate educacional. A diretora destacou a necessidade de regulamentar a internet, pois a falta de controle tem permitido a manipulação e a propagação de ideologias extremistas, especialmente entre os jovens.

“No grupo de trabalho que discutiu a violência nas escolas, a gente sabe como é que está sendo manipulado, como é que essa internet desregulada tem agido inclusive como instrumento da ultradireita para aliciar jovens, sem controle nenhum, sem regulamentação”, afirma.

Quanto às propostas mais conservadoras que podem ser apresentadas durante a Conae, Madalena esclarece que as emendas ao texto base já devem ter vindo dos estados, e o processo de discussão e votação ocorrerá em mesas específicas para cada eixo temático. Ela ressalta que qualquer proposta contrária à visão democrática será debatida e enfrentada.

“Não deixa de ser uma disputa”, concluiu ela, destacando a importância da participação ativa dos delegados para garantir que o documento final da conferência represente uma visão de educação inclusiva e democrática.

(por Cezar Xavier)