Foto: Divulgação/Coppe-UFRJ

Em evento de homenagem ao professor Luiz Pinguelli Rosa, que presidiu a Eletrobras durante o Governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e faleceu vítima da Covid-19, acadêmicos criticaram a privatização da estatal, os cortes na ciência e nas universidades realizados por Bolsonaro assim como defenderam a soberania nacional.

Na avaliação da reitora da UFRJ, Denise Pires, o Brasil atravessa um grave problema no que diz respeito ao ataque às instituições de Estado. “Pinguelli era muito crítico a isso porque ele era um homem da institucionalidade. Ele era um homem da luta coletiva. Ele era um homem não somente que foi um dos criadores da nossa associação docente como de associações contra as privatizações em áreas importantes brasileiras”, destacou. “Pinguelli, na verdade, lutou muito na nossa universidade e fora dela e é correto que se diga que ele era cidadão do mundo, porque onde estava a ciência, a tecnologia e a possibilidade de avanço do Brasil como nação soberana e verdadeiramente independente, Luiz Pinguelli Rosa estava”, acrescentou, em referência ao evento realizado nesta terça-feira (21), “Pinguelli, Cidadão do Mundo”, o primeiro de uma série de homenagens que serão realizadas ao ex-presidente da Eletrobras.

O físico Luiz Pinguelli Rosa (Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado)

“Nós vemos o Brasil, infelizmente, sofrendo um desmonte de universidades públicas mas também a instituições de ciência e tecnologia como o INPE, o Instituto de Pesquisas Espaciais, o Instituto de Pesquisas da Amazônia, o INPA, o Instituto de Matemática Pura e Aplicada sofrendo muito, para manter o instituto de excelência que é o nosso INPA”, denunciou.

A reitora da UFRJ reagiu também ao desmonte da universidade pública e outras instituições de ensino e pesquisa. “E não é a favor do agronegócio, porque a Embrapa é a favor do agronegócio. As universidades são a favor de um modelo de Brasil de nação soberana. Por que atacar as universidades públicas que geram mais de 95% do conhecimento nacional¿ Por que não entregar a a Amazônia não a universidades, institutos de pesquisa como o Instituto de Pesquisas da Amazônia e tantas outras que lá existem¿ Há vários campi de universidades, a Fiocruz na região amazônica, há museus na região amazônica todos sendo desmontados”, questionou Denise, lembrando que em 2011 esteve com Pinguelli, em Brasília, lutando pela manutenção da carreira de docente em regime de dedicação exclusiva e em defesa das universidades.

Bicentenário da Independência

Presidente da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência (SBPC), Renato Janine descreveu o professor como uma pessoa preocupada em gerarmos um país descente, equilibrado, que tem soberania. Lembrando que o ano é marcado pelo bicentenário da independência do Brasil, Janine questionou se hoje o país é efetivamente independente.

“Somos efetivamente soberanos? Eu tendo a pensar que a soberania hoje existe mesmo em poucos países. Mas são poderosos: Estados unidos, China, União Europeia como um todo, talvez possa se acrescentar a Rússia. Outros países têm a soberania mais limitada. Mas nós podemos lutar. Somos um grande país, grande população, grande território, grandes recursos. Nós podemos lutar para isso. E o empenho do Pinguelli, do governo que ele participou, foi o empenho de colocar a ciência e a pesquisa e a tecnologia a serviço da soberania nacional para que nosso país decida dentro de suas fronteiras pela vontade soberana de seu povo”, afirmou.

O povo na luta pela Independência – professormanujr.blogspot.com

No evento realizado pela Coppe – Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Janine enfatizou que os rumos do país passam pela ciência, sendo o conhecimento científico o fator mais importante junto com a educação no desenvolvimento econômico, como forma de formação de mão de obra qualificada.

“Hoje é um dia em que dizemos não aos cortes. Se estivesse aqui, estaria dizendo não aos cortes, estaria dizendo: ‘o que você está fazendo é acabando com o futuro de uma geração e a soberania de uma nação. Era importante fazermos essa homenagem a mais este brasileiro que se foi nesta pandemia. Pinguelli, você está fazendo falta. Gostaria de ter você agora nas nossas fileiras”, disse a presidenta da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Helena Nader, acrescentando que Pinguelli só trouxe orgulho para a comunidade científica, os empresários e a sociedade brasileira: “Ele não era um cidadão comum, mas se preocupava com o cidadão comum”.

Desmonte

O diretor executivo da Fundação Coppetec e presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Confies), Fernando Peregrino, também participou da homenagem realizada pela Coppe-UFRJ a Pinguelli e mencionou o atual momento difícil do país, lamentando o assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips e a falta de recursos para ciência: “Isso não é um corte, é um desmonte de um pilar de uma nação”.

Diretor da Coppe – UFRJ, Romildo Toledo lembrou que o professor acreditava na força da inserção da universidade na sociedade. “Sentimos falta do Pinguelli. As surpresas que este governo reserva são diárias. O Pinguelli estaria muito incomodado com o que está acontecendo no setor energético”, afirmou Toledo, que rememorou um trecho da autobiografia recém-lançada do professor da Coppe-UFRJ, “Memórias de Vargas a Lula: a resistência à ditadura e ao neoliberalismo”, na qual Pinguelli menciona uma carta ao presidente da República, na qual diz que o setor energético não pode ser gerenciado como um setor comum, porque podem resultar prejuízos aos consumidores por aumento de tarifa e ao país. Em seu legado, Pinguelli também escreveu que as tarifas não diminuiriam com a privatização das empresas.

Ex-diretor geral de Itaipu Binacional, Jorge Samek, lembrou que Pinguelli esteve à frente da retomada do setor de energia em seu momento mais difícil. “Em 2002 e 2003, na maior crise que esse país já viveu, quem recompôs esse processo chama-se Luiz Pinguelli Rosa”, disse Samek, relembrando que, com Pinguelli à frente da Eletrobras, Itaipu gerou 103 milhões de megawatts em 1 ano. “Foi a maior produção de energia de Itaipu e acho que não vai se repetir”, continuou.

O decano do Centro de Tecnologia, Walter Issamu Suemitsu, recordou que, quando chegou ao Rio de Janeiro como mestrando à PUC, em 1976, Pinguelli já era admirado entre os estudantes e veio a ser o primeiro presidente da associação de docentes da UFRJ. Emocionado, Luís Fernando Lomba Rosa, um dos filhos de Pinguelli, que representou a família no evento, lembrou que o pai não se deixou intimidar nem mesmo pela ditadura militar.