Yang Wanming, embaixador da China no Brasil

O governo de Jair Bolsonaro cometeu mais um ato deseducado com a China, que o Itamaraty tentou consertar, embora um pouco atrasado.

Por José Reinaldo de Carvalho*

O gesto de má educação veio do Ministério da Saúde no último sábado (22), que registrou a chegada do Insumo Farmacêutico Ativo proveniente da República Popular da China como originário do “exterior”. Quando o ministério brasileiro das Relações Exteriores se manifestou, o embaixador Yang Wanming, representante do país socialista no Brasil, já tinha publicado no Twitter uma das clássicas frases do filósofo chinês Confúcio (552 a.c e 489 a.c ): “Confúcio disse, feito para amigos, fiel à sua palavra”, escreveu o diplomata na rede social.

Yang Wanming assumiu o posto de Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República Popular da China no Brasil em dezembro de 2018, poucos dias antes da posse de Jair Bolsonaro.

O nosso país é o terceiro da América Latina onde Yang Wanming atua como Embaixador, depois de ter passado pelo Chile e pela Argentina. Tem uma larga experiência diplomática relacionada com a região, tendo sido Diretor-Geral do Departamento da América Latina e Caribe do Ministério das Relações Exteriores da China. É fluente em espanhol e já domina o português, idioma com o qual se expressa em lives e atuando com destreza nas redes sociais.

Yang Wanming trouxe em sua bagagem os novos ares da China moderna, um estilo hábil e competente, revelador de que o país asiático se apresenta no mundo diplomático em linha com os tempos atuais. No manejo das redes sociais, o diplomata exibe essa faceta moderna, alternando comunicados oficiais sobre as realizações políticas, econômicas e sociais do seu país e as relações sino-brasileiras, com uma combatividade retilínea, quando foi necessário enfrentar as diatribes originadas do Palácio do Planalto, do clã Bolsonaro e do Itamaraty na época em que se encontrava sob a direção de Ernesto Araújo.

As redes sociais do diplomata estão repletas também de parábolas, metáforas, citações de provérbios chineses e filósofos da antiguidade, com que muitas vezes faz ironias em respostas a situações políticas. Contorna, assim, conflitos, com educação, paciência e habilidade política e diplomática.

Um exercício complexo porque o governo de Jair Bolsonaro adotou uma linha antichinesa, prejudicando os próprios interesses nacionais, um comportamento hostil que teve sua máxima expressão em pedidos para que a China trocasse de embaixador, que, por óbvio, foram ignorados. As solicitações foram feitas depois de conflitos entre a embaixada e o filho do ocupante do Palácio do Planalto, o deputado federal, Eduardo Bolsonaro.

Vale lembrar. Quando surgiu a pandemia do novo coronavírus, o governo brasileiro, mimetizando o então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, acusou a China de ser a culpada pelo surto mundial da covid. A Embaixada da China rebateu dizendo que as declarações do filho de Jair Bolsonaro eram “extremamente irresponsáveis”. Eduardo tinha “contraído vírus mental”. O embaixador disse que a China repudiava veementemente as declarações do deputado e exigiu pedido de desculpas. Naquele momento, o então chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, pediu o afastamento de Yang Wanming.

O Embaixador chinês também usou de firmeza quando o mesmo Eduardo Bolsonaro acusou a China de espionagem e defendeu que o Brasil deveria deitar por terra a tecnologia chinesa do 5G. A diplomacia chinesa rechaçou as insinuações e deixou claro que haveria “consequências negativas” para quem tumultuasse as relações bilaterais entre os gigantes da Ásia e do Cruzeiro do Sul. Uma pena que o governo Bolsonaro faça questão de apequenar o Brasil a ponto de se jactar de ser um pária internacional.

A China vê as relações com o Brasil desde uma perspectiva histórica e estratégica. São 47 anos de relações diplomáticas, que se desenvolveram em todos os terrenos: político, econômico, cultural, educacional, militar, elevadas ao nivel de parceria estratégica, independentemente das diferenças políticas e ideológicas. Antes de serem intergovernamentais, são relações entre povos e nações que têm futuro, desempenham e desempenharão um papel importante nas transformações mundiais.

Observa-se que o Embaixador Yang Wanming atua com essa perspectiva. Em meio aos confrontos provocados pelo governo Bolsonaro, ele decerto se baseia, além do estilo próprio, numa visão de Estado, na diplomacia da nova China, que cultiva relações diplomáticas, econômicas, comerciais, culturais com todos os países com base em princípios como a coexistência pacífica, o respeito mútuo à soberania e integridade territorial, a não agressão, a não intervenção de um país nos assuntos de outro, a igualdade e o benefício mútuo. A China combina as relações bilaterais com a participação integral nas instituições internacionais e a promoção ativa da diplomacia multilateral em todos os campos. Hoje, propugna a criação de uma comunidade com futuro compartilhado para a humanidade.

No 19º Congresso do Partido Comunista da China, em 2017, o Secretário Geral, Xi Jinping, que é também o presidente da República Popular da China, afirmou sobre a política externa do país: “Fizemos mais progressos na diplomacia chinesa em todas as frentes. Temos feito esforços globais na busca da diplomacia de um país importante com características chinesas, avançando assim a agenda diplomática da China de uma forma abrangente, multidimensional e multifacetada, criando um ambiente externo favorável para o desenvolvimento da China. A China defende o desenvolvimento de uma comunidade com um futuro compartilhado para a humanidade e tem incentivado a evolução do sistema de governança global”.

Ter uma perspectiva histórica das relações com o Brasil faz parte desse balanço e dessa orientação politica.

__

*É jornalista, membro do Comitê Central e da Comissão Política Nacional do PCdoB, Secretário Geral do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz)

 

As opiniões aqui expostas não refletem necessariamente a opinião do Portal PCdoB