Em plena pandemia de Covid-19 – e provavelmente por causa dela –, a concentração de renda e a desigualdade avançaram no Brasil. É o que aponta o relatório Riqueza Global, publicado anualmente pelo Credit Suisse, que analisa o comportamento da renda no topo da pirâmide.

Segundo o levantamento, embora a fatia da riqueza no topo da pirâmide tenha crescido em vários países do mundo em 2020, o caso brasileiro se destaca. Nada menos que 49,6% da riqueza total do País – quase a metade – está concentrada nas mãos de apenas 1% da população.

O relatório cita dados de uma outra pesquisa, da Economist Intelligence Unit (EIU), segundo a qual apenas 193 mil indivíduos concentravam 1% da riqueza do Brasil em 2020. Além disso, 3,2 milhões reuniam 10% da fortuna nacional. O Brasil tem uma população estimada em 213 milhões.

Entre os dez países avaliados no relatório, apenas na Rússia a desigualdade é maior. Lá, o 1% mais rico detém 58,2% da renda nacional. Mas, na pandemia, o acréscimo na fatia obtida pelos mais ricos foi maior no Brasil. A participação dessa superburguesia brasileira na riqueza do país saltou 2,7 pontos percentuais em 2020, enquanto a alta na Rússia foi de 1,1 ponto percentual.

Conforme o Credit Suisse, isso reflete o movimento global de forte queda nas taxas de juros – medida adotada pelos governos para tentar evitar uma queda maior da economia em meio à crise sanitária: “Os grupos mais ricos foram relativamente pouco afetados pela redução no nível geral de atividade econômica e, ainda, se beneficiaram com o impacto da queda de juros na valorização das ações e dos preços de imóveis”.

Em contrapartida, graças à desvalorização do real, o número de milionários no País despencou em 2020. O total de brasileiros com patrimônio superior a US$ 1 milhão caiu de 315 mil para 207 mil. Mas o Credit Suisse prevê que, até 2025, esse número vá aumentar para 361 mil.

Ao mesmo tempo em que foi o país onde o topo da pirâmide mais avançou na fatia da riqueza nacional, o Brasil foi também o local com maior queda na renda e no patrimônio total da população, segundo o levantamento do Credit Suisse. No conjunto da população, a riqueza encolheu US$ 839 bilhões no Brasil em 2020, muito devido à desvalorização do real, que superou 20% de queda. Ou seja, todos os brasileiros ficaram mais pobres, mas entre os ricaços este tombo foi menor.

O aumento da riqueza nas mãos de poucos e a piora na desigualdade têm levado vários países a discutir uma maior tributação dos ricos, ainda mais num contexto em que governos enfrentam déficits públicos crescentes devido aos efeitos da pandemia. O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, por exemplo, propôs aumentar a tributação sobre ganhos de capital e sobre herança.

No Reino Unido, uma comissão independente sugeriu ao governo a criação de um imposto sobre grandes fortunas para arrecadar 260 bilhões de libras (US$ 361 bilhões). Já a Argentina criou um imposto sobre grandes fortunas, que arrecadou US$ 2,4 bilhões neste ano.

O relatório do Credit Suisse destaca que 2020 foi um ano atípico. O primeiro impacto da pandemia sobre o patrimônio das famílias foi forte: entre janeiro e março, houve queda de 4,4% na riqueza mundial. “Mas o que aconteceu no segundo semestre de 2020 foi imprevisível”, aponta o documento.

“As ações alcançaram níveis recordes no fim do ano. Os preços dos imóveis começaram a subir num ritmo não visto há anos. Essa valorização dos ativos é o que explica o aumento na riqueza global”, explica o Credit Suisse. “Países muito afetados pela Covid-19 estiveram também entre os que registraram os maiores ganhos na riqueza por adulto. O contraste entre o que ocorreu com a riqueza das famílias e o que ocorreu na economia em geral nunca foi tão nítido.”

No geral, a riqueza global avançou US$ 28,7 trilhões no mundo, para um total de US$ 418,3 trilhões no fim de 2020 – uma alta de 7,4%. Mas houve disparidades regionais. Na América do Norte, o avanço foi de US$ 12,4 trilhões e na Europa, de US$ 9,2 trilhões. Na China também houve acréscimo, de US$ 4,2 trilhões.

Mas na Índia houve queda, de US$ 594 bilhões, com impacto da desvalorização da moeda local. A América Latina registrou a maior perda, de US$ 1,2 trilhões, devido à perda de valor de suas moedas – mas também, segundo o relatório, aos efeitos da pandemia, já que a região foi uma das mais afetadas pela Covid no planeta.

Com informações do O Globo