Gorbachov e Herman Kohl em Bonn em 1990. Ata de reunião seguinte em 1991 registra promessa de Raymond Seitz, pelos EUA, de não expansão da Otan para o leste.

A revista alemã Der Spiegel noticiou a descoberta de um documento de arquivo, que reforça a afirmação das autoridades russas de que quando a Alemanha foi unificada, foi prometido à União Soviética que a Otan não se expandiria para o leste, o que tem sido ressaltado pelo presidente russo Vladimir Putin, e que embasa a seriedade das propostas russas para a restauração da segurança coletiva indivisível na Europa e fim da expansão da Otan até às fronteiras russas.

Como observa Der Spiegel, fica claro no documento que os britânicos, norte-americanos, alemães e franceses concordaram que a adesão do Leste Europeu à Otan era “inaceitável”.

Textualmente está registrado que “não podemos oferecer à Polônia e aos demais a adesão à Otan”.

Há inclusive a declaração do representante norte-americano nessas negociações, Raymond Seitz, de que “a Otan não deve se expandir para o leste, nem formalmente nem informalmente”.

Mais uma comprovação do que vem sendo denunciado por Putin de que a Rússia foi “descaradamente enganada” pelos países ocidentais, que prometeram que a Otan não se expandiria “nem um centímetro para leste”.

O documento, ainda segundo Der Spiegel , foi descoberto nos Arquivos Nacionais Britânicos pelo cientista político norte-americano Joshua Shifrinson, professor da Universidade de Boston. Anteriormente, o documento era classificado como “Segredo”, mas depois foi desclassificado.

Pode-se considerar que o destaque dado pela Der Spiegel a um documento que prova que os russos estão certos na questão da “não expansão da Otan a leste” é um sintoma da enorme luta política nos altos escalões de Berlim sobre o que fazer – inclusive quanto ao gasoduto Nord Stream 2.

Ata sai da sombra

Trata-se da ata da reunião dos diretores políticos dos Ministérios das Relações Exteriores dos Estados Unidos, Grã-Bretanha, França e Alemanha, realizada em Bonn em 6 de março de 1991, cujo tema era a segurança na Europa Central e Oriental.

Segundo o documento, o diretor político do Ministério das Relações Exteriores da Alemanha, Jurgen Hrobog, argumentou da seguinte forma: “Deixamos claro nas negociações 2 mais 4 (sobre a unificação da Alemanha, com a participação da RFA e da RDA, bem como os EUA, URSS, Grã-Bretanha e França) que não estamos expandindo a OTAN para além do Elba (o texto esclarece ainda que não estamos falando sobre o Elba, mas sobre o rio Oder). Portanto, não podemos oferecer à Polônia e aos demais a adesão à Otan”.

De acordo com Jurgen Hrobog, esta posição foi acordada com o chanceler federal Helmut Kohl e o ministro das Relações Exteriores Hans-Dietrich Genscher.

O representante dos EUA, Raymond Seitz, diz o documento, concordou: “Deixamos claro para a União Soviética – nas negociações de 2 mais 4, bem como em outras negociações – que não pretendemos nos beneficiar da retirada das tropas soviéticas do leste Europa … A Otan não deve se expandir para o leste, nem formalmente nem informalmente”.

Acrescenta o documento recém encontrado que os participantes da reunião concordaram em fortalecer a estabilidade e a segurança da Europa Central e Oriental por meio de acordos bilaterais com os países da região e no âmbito da Conferência sobre Segurança e Cooperação na Europa (CSCE).

Assim – e essa não é a única prova de que houve tal promessa de não expansão a leste da fronteira alemã – fica reafirmada o embasamento russo em sua exigência de que cesse a expansão da Otan até suas fronteiras, de que a crise na Ucrânia é no momento a ferida mais aberta.

Numa coletiva anual de imprensa em dezembro de 2021, Putin expôs toda a verdade que Washington e a Otan tentam abafar. “‘Nem um centímetro a leste’, nos disseram nos anos 90. E daí? Eles trapacearam. Eles apenas nos enganaram descaradamente: cinco ondas de expansão da OTAN e agora, agora sistemas de ataque estão aparecendo na Polônia e na Romênia”.

Como Putin assinalou, a Rússia se opôs repetidamente à expansão da Otan para leste, referindo-se às promessas relevantes dos países ocidentais. “E eles nos dizem: ‘Onde está escrito em um pedaço de papel? Não há? Bem, isso é tudo, vá embora, não nos importamos com suas preocupações.’ E assim de ano para ano. Cada vez que tentávamos impedir alguma coisa, expressávamos preocupações, ‘não, você que se vá com suas preocupações, faremos o que acharmos necessário”, acrescentou.

Em entrevista ao Der Spiegel o secretário-geral da Otan, cargo que, na real, é apenas de porta-voz já que as decisões vêm prontas de Washington, Jens Stoltenberg, continuou asseverando que “nunca houve tal promessa, nunca houve um acordo tão nos bastidores, simplesmente não é verdade”.