A democrata Nancy Pelosi, no dia seguinte da audiência televisionada. “O que o presidente admitiu e diz ser perfeito, eu digo ser perfeitamente errado”

A primeira audiência pública do impeachment de Donald Trump na Câmara dos Representantes já trouxe uma mudança significativa: o tal ‘qid pro quo’ de que o presidente magnata era acusado – termo jurídico um tanto incompreensível – passou a ser abertamente chamado de “suborno”.

“Isso é suborno”, afirmou a presidente da Câmara, a democrata Nancy Pelosi, no dia seguinte da audiência televisionada. “O que o presidente admitiu e diz ser perfeito, eu digo ser perfeitamente errado”.

“O suborno é para conceder ou reter assistência militar em troca de uma declaração pública de uma investigação falsa sobre as eleições”, enfatizou.

A ‘arma fumegante’ para a acusação de suborno é a informação, trazida pelo embaixador interino em Kiev, Bill Taylor, de que um assessor seu ouviu um telefonema do embaixador junto à União Europeia, Gordon Sondland, do ramo hoteleiro e doador da campanha presidencial, em que este falava da questão diretamente com Trump.

A comissão aprovou a convocação para depor do assessor citado por Taylor, David Holmes.

Até aqui, Trump tem dito que tudo não passa de uma “caça às bruxas” de parte dos perdedores de 2016, e que ele fez tudo “correto”. Como supostamente estaria mostrado no resumo da transcrição do telefonema de julho para o presidente Volodymyr Zelenskiy, que – aliás – se viu forçado a liberar, tentando gerenciar os danos.

FAVOR

De acordo com a transcrição, Trump pediu a Zelensky “o favor” de investigar a interferência nas eleições de 2016 em favor dos democratas a partir da Ucrânia, além de escrutinar as lambanças do vice de Obama, e operador-chefe do golpe, Joe Biden, no submundo das empresas de gás natural da Ucrânia. À época do telefonema, Biden era o pré-candidato presidencial democrata a 2020 melhor posicionado, o que já desandou.

Em suma, o clima no pântano de Washington que Trump prometeu drenar está, como diz o velho ditado carioca, que “em rio de piranha, jacaré nada de costas”.

Há rumores de que, se aparecer alguma “arma fumegante” realmente fumegante sobre o imbróglio da retenção da ajuda militar de quase US$ 400 milhões, Trump já estuda fazer de seu advogado pessoal, Rudy Giuliani, o conveniente bode expiatório.

Cronistas dos bordeis de Washington apostam que não haveria como provar o ‘quid pro quo’ já que Trump não teria diretamente feito a oferta a Zelensky. É essa linha de argumentação que o depoimento público do embaixador Taylor deixou vulnerável.

Na audiência pública de quarta-feira, Taylor relatou como Sondland contou a ele que Trump, como empresário que é, queria receber o que “deviam a ele” antes de “assinar o cheque”, e advertiu sobre um “impasse” se a Ucrânia não agisse. O que Taylor disse ter interpretado no sentido de que a ajuda militar não seria liberada sem a abertura das investigações.

Taylor também confirmou as declarações do primeiro depoente, George Kent, vice-secretário de Estado assistente e do Conselho de Segurança Nacional, de que haveria um “canal não oficial” interferindo na política dos EUA na Ucrânia.

“Em uma reunião comum do NSC em 18 de julho eu ouvi um funcionário dizer que havia uma retenção na ajuda de segurança à Ucrânia, mas não soube me dizer por quê (…) e que nenhum gasto adicional em assistência de segurança à Ucrânia seria aprovado até segunda ordem”, declarara Kent.

O Secretário asssistente dissera, ainda, ter ficado “atônito” e que um funcionário revelou que a ordem “partira de Trump”. Ordem que, no entendimento de Kent, “violava a política externa dos EUA”.

O depoimento de Sondland será na próxima semana. Ele já se viu forçado a remendar declaração que dera a portas fechadas, na etapa preliminar do inquérito de impeachment.