Delegados da PF reprovam troca de comando em Brasília: “clima ruim”
O delegado Edvandir Félix de Paiva, presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF), afirmou que a substituição do superintendente da PF no Distrito Federal cinco meses depois de sua nomeação tem causado “nervosismo” e suspeita de intervenção política na corporação.
O ex-superintendente, Hugo de Barros Correia, que tinha sido indicado em maio, foi substituído pelo delegado do Rio de Janeiro, Estado da família Bolsonaro, Victor César Carvalho dos Santos. A troca foi determinada pelo diretor-geral da PF, Paulo Maiurino.
Hugo de Barros estava liderando as investigações que tocavam diretamente a família de Jair Bolsonaro, como a do inquérito das fake news, a organização de manifestações golpistas e sobre os ataques às urnas eletrônicas.
Além disso, Barros investigava o filho “04” de Jair Bolsonaro, Jair Renan Bolsonaro, por tráfico de influência e lavagem de dinheiro.
O presidente da ADPF disse que não houve nenhuma forma de comunicação interna para justificar a saída de Hugo de Barros, o que tem gerado muitos questionamentos sobre sua substituição.
“Objetivamente não foi anunciado nada”. Segundo Paiva, os membros da PF do Distrito Federal “estão extremamente preocupados. É uma troca que o pessoal não estava esperando”.
“O colega que está saindo é muito respeitado. Não há uma explicação clara para a troca e isso gera um clima interno ruim, com especulações de todas as formas”, disse em entrevista ao Estadão.
“Os colegas se sentem inseguros. Será que estão trocando para quê? Será que isso que estão falando de que é para uma intervenção é verdadeiro? E os colegas que estão fazendo investigações muito sensíveis, como ficam? Vão ter um respaldo da Polícia Federal ou vão ser pressionados? Tudo isso vêm à tona e cria um clima de nervosismo interno”.
“É necessário que os colegas que estão nas investigações no Distrito Federal fiquem bastante tranquilos e também que todos os delegados do País não recebam recado de que alguém está sendo trocado por motivação política. Isso a gente não abre mão”.
“Nós não vamos permitir intervenção política na Polícia Federal ou pelo menos ela não vai ocorrer sem que nós nos manifestemos. Talvez esse seja o recado mais importante que a gente precisa dar para a sociedade: os delegados de Polícia Federal não vão permitir trocas políticas na corporação. É por isso que é muito necessário que, todas as vezes que as trocas ocorram, tenha uma fundamentação muito transparente e objetiva a respeito”, continuou.
O delegado Edvandir Félix de Paiva disse que a insegurança gerada pela falta de comunicação em trocas como a que foi realizada atrapalha as investigações, pois gera medo de perseguição entre os delegados. “Os recados passados são muito importantes”.
“O delegado não pode estar, em nenhum momento, preocupado se o que ele está fazendo vai gerar prejuízo para ele pessoal e funcional”, afirmou.
“O primeiro apoio que um delegado e sua equipe devem ter é da própria Polícia Federal. Nós não vamos permitir que sejam feitas movimentações políticas na Polícia Federal sem que tenhamos uma reação”.
“É como se tivéssemos marcando um X no chão: daqui ninguém passa. Nós queremos que o nosso diretor-geral retire a Polícia Federal dessa narrativa política, que ele evite qualquer tipo de ação que coloque a credibilidade da corporação em risco. Se isso não ocorrer, realmente nós teremos uma crise atrás da outra”, pontuou.
Jair Bolsonaro já é investigado por ter pressionado e ameaçado o ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, para conseguir trocar o superintendente da PF no Rio de Janeiro para proteger sua família e aliados das investigações.
Em uma reunião ministerial de maio de 2020, que Moro usou como prova de que ele estava sendo pressionado para trocar a direção da PF no Rio de Janeiro, Jair Bolsonaro diz: “Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro oficialmente e não consegui. Isso acabou. Eu não vou esperar foder minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança da ponta de linha que pertence à estrutura. Vai trocar. Se não puder trocar, troca o chefe dele; não pode trocar o chefe, troca o ministro. E ponto final. Não estamos aqui para brincadeira”.
Dentro dos próximos 30 dias, Jair Bolsonaro terá que prestar depoimento presencialmente à PF.