Declaração final do G20 conclama à ação em defesa do clima
Após dois dias de discussões, os líderes do G20, em seu comunicado final, se comprometeram em limitar o aquecimento global a 1,5 grau Celsius, indo além da meta do acordo climático de Paris de dois graus, e pediram uma ação “significativa e eficaz”, assinalou a agência de notícias Reuters.
Quanto às propostas concretas para isso, pouco se avançou, segundo especialistas. O G20 reúne as maiores economias do mundo, compreendendo 80% do PIB global, 60% da população e 75% do comércio global. São membros África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia, Turquia e União Europeia.
Os líderes do G20 prometeram “US$ 100 bilhões por ano até 2025” para ajudar o mundo em desenvolvimento a atingir essa meta. Embora documento divulgado antes da cúpula haja revelado que a promessa, feita em 2009, tem sido sistematicamente violada.
“Devemos acelerar a eliminação do carvão e investir mais em energia renovável”, disse o primeiro-ministro italiano, e anfitrião, Mario Draghi. “Também precisamos nos certificar de que usamos os recursos disponíveis com sabedoria, o que significa que devemos nos tornar capazes de adaptar nossas tecnologias e também nosso estilo de vida a este novo mundo.”
O comunicado foi lançado no mesmo dia em que a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP26) começa em Glasgow, na Escócia. Espera-se que as metas de emissões concretas e o investimento em energia renovável sejam ali discutidos em mais detalhes.
G20 em sintonia com a COP26
A cúpula, realizada na Itália, foi a despedida da primeira-ministra alemã cessante, Angela Merkel. A maioria dos líderes participou presencialmente, mas os presidentes Xi Jinping (China) e Vladimir Putin (Rússia) discursaram por videoconferência, com os dois países representados presencialmente por delegações encabeçadas pelos respectivos chanceleres, Wang Yi e Sergei Lavrov. Com sua presença, Jair Bolsonaro submeteu o Brasil perante o mundo ao vexame de ter o único líder no G-20 não vacinado.
O presidente norte-americano Joe Biden teve de viajar a Roma sem poder contar com a definição final do programa de avanços sociais e ambientais que está empacado dentro da própria bancada democrata no Congresso e, portanto, com o impacto disso sobre a preservação ambiental sem solução. Ele cortou o pacote pela metade, para cerca de US$ 1,75 trilhão (ao longo de dez anos), e nem aí se fez a luz.
Por sua vez, o Presidente Xi exortou os países do G20 a contribuírem para o sucesso da COP26, assinalando que os países desenvolvidos precisam dar o exemplo na redução de emissões, acomodar totalmente as dificuldades e preocupações especiais dos países em desenvolvimento, cumprir seus compromissos com o financiamento do clima e fornecer tecnologia, capacitação e outros apoios aos países em desenvolvimento.
Xi enfatizou que a proteção ambiental e o desenvolvimento econômico devem ser coordenados e as mudanças climáticas devem ser abordadas enquanto o bem-estar das pessoas é garantido, acrescentando que cabe às principais economias fortalecer a cooperação nesse sentido.
Embora a China seja atualmente, como ‘fábrica do mundo’, o maior emissor de dióxido de carbono, a pegada chinesa per capita de carbono é bem menor do que a norte-americana.
Apesar de ainda ter a geração por carvão como 60% da grade energética, a capacidade instalada cumulativa da China de fontes renováveis é responsável por um terço da atual capacidade instalada mundial de energia renovável, e a China lidera em veículos elétricos e painéis solares.
O comunicado contém o compromisso de encerrar o financiamento público para usinas termelétricas a carvão no exterior até o final do ano, e para a energia a carvão em geral “o mais rápido possível”.
John Kirton, diretor do Grupo de Pesquisa G-20 da Universidade de Toronto, disse à Associated Press que os líderes “deram apenas pequenos passos” no acordo e não fizeram “quase nada de novo”, inclusive quanto ao compromisso vencido e não cumprido de fornecer US$ 100 bilhões ao ano em assistência aos países mais pobres.
Já o acordo para acabar com o financiamento público internacional do carvão “é algo específico e real. Esse conta”, acrescentou Kirton. A China anunciara o fim do financiamento da produção de carvão no exterior no mês anterior, e Japão e Coreia do Sul já o haviam adotado no início do ano.
Para fazer uma síntese das diferentes posições de países sobre a data até quando a transição para a economia descarbonizada deve estar completada, o comunicado final declara que “reconhecendo a relevância fundamental de alcançar emissões globais líquidas de gases de efeito estufa ou neutralidade de carbono por volta da metade do século”.
Emissões líquidas zero, quando?
Uma autoridade francesa disse que o texto “não específico” reflete o objetivo de afirmar um “objetivo comum”, ao mesmo tempo em que fornece flexibilidade para lidar com “a diversidade dos países do G-20”. Especialmente China e Índia, bem como a Indonésia e Austrália – esta, como fornecedora.
EUA e União Europeia anunciaram 2050 como prazo para as emissões líquidas zero, enquanto outros países, como China e Rússia, têm a meta de 2060.
“Por que você acredita que 2050 é um número mágico?”, questionou o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, durante uma entrevista coletiva. “Se é uma aspiração da União Europeia, é direito de outros países também terem aspirações … ninguém provou a nós ou a qualquer outra pessoa que 2050 é algo que todos devem subscrever.”
Putin afirmou no G20 que a Rússia está “totalmente comprometida com a redução das emissões de carbono”, mas quer “as mesmas regras precisas e transparentes para todas as nações”.
Ele pediu uma avaliação clara sobre quantas emissões as várias fontes de energia realmente produzem e observou que essas emissões provêm de “8% das terras” do planeta, que será atingido “em 100%”.
Ele advertiu ainda que a energia solar é quatro vezes mais suja do que a nuclear. A comunidade mundial precisa testar vários projetos climáticos em termos de seu impacto líquido nas emissões por dólar de investimento, sugeriu Putin. “Pode muito bem acontecer que, por exemplo, a conservação de florestas na Rússia ou na América Latina seja mais eficaz do que investir em energias renováveis em alguns países”, afirmou.
Putin também tem destacado que essa transição na matriz energética não pode ser feita de forma atabalhoada, para evitar problemas como os agora vividos na Alemanha, com as fontes renováveis [solar e eólica] tendo um desempenho aquém do esperado, com o custo do gás nas alturas e às vésperas da chegada do inverno.
Vacinas e piso de imposto
Em outra intervenção, Putin chamou a fazer cumprir decisão anterior do G20 de acesso às vacinas para todos. Ele cobrou o reconhecimento mútuo dos certificados de vacinação nacionais e o fim da ‘concorrência desleal’, através da negação à certificação a vacinas concorrentes das produzidas pelos monopólios farmacêuticos transnacionais, enquanto boa parte da humanidade fica sem imunizantes.
“Quanto mais rápido isso for feito, mais fácil será retomar a atividade empresarial mundial, inclusive a que sofreu mais, a atividade turística”, sublinhou.
Além das questões climáticas, os líderes do G20 assinaram um acordo para um imposto corporativo mínimo global de 15% sobre os lucros, destinado a diminuir a evasão fiscal cometida pelas transnacionais, que transferem os lucros para paraísos fiscais cuja tributação é diminuta.
Redução que os críticos dizem ser muito abaixo das expectativas, já que foi adotado um piso muito baixo, muito próximo, por exemplo, ao da Irlanda (12,5%), ao qual se ancoraram gigantes como a Apple na sua estratégia global de evasão fiscal.