Charles Darwin revolucionou a maneira como se olhava para a evolução das espécies e contribuiu significativamente para a biologia.

Já no título de seu livro clássico Darwin apresentou a tese de que haveria uma hierarquia racial entre os homens: “Sobre a origem das espécies por meio da seleção natural ou a preservação das raças favorecidas na luta pela existência” (1859).

Por José Carlos Ruy*

A mesma tese está também em “A Descendência do Homem” (1871) livro onde ele diz claramente que há uma hierarquia entre as “raças” sendo as inferiores formadas por negros e índios e as superiores constituidas pelos brancos “civilizados” das nações europeias, colocados no topo daquela classificação preconceituosa. (Blanc, 1994).

Neste livro Darwin endossou as idéias de seu primo, Francis Galton (o criador da eugenia) e se declarou contrário ao apoio ao que, segundo ele, eram “inferiores” e mais fracos, atitude que dizia ser danosa ao desenvolvimento da espécie. Ele defendeu o favorecimento aos fortes e “superiores” e sugeriu a existência de restrições legais ao casamento dos considerados fracos e aceitou que seria um “benefício” se “os membros mais débeis e inferiores da sociedade não se casem tão livremente” (Darwin: 1871).

A partir desta tese surgiu, mais tarde, o chamado “darwinismo social”, a teoria racista que contaminou inclusive setores positivistas e reformistas do marxismo, como aqueles influenciados por Karl Kautsky e pelos teóricos da II Internacional. E foi uma das bases do fatídico e criminoso “racismo científico” do início do século XX.

Um dos primeiros autores a usar a expressão “darwinismo social” foi o inglês Herbert Spencer (1820-1903), que criou a expressão “sobrevivência dos mais aptos”, usada por Darwin desde a segunda edição da “Origem das espécies” para definir a seleção natural (Blanc: 1994).

Para o darwinismo social os seres humanos seriam naturalmente desiguais, “dotados de diversas aptidões inatas, algumas superiores, outras inferiores”, sendo o convívio social “uma luta pela vida, nem maior nem menor do que a dos animais na natureza”. E sempre vencida pelos “mais aptos” e “fortes”, com maior sucesso e acesso aos postos de comando, detendo as alavancas do poder social e político, enquanto os menos aptos ocupam posições inferiores e são submetidos ao domínio dos “superiores”. Spencer pensava que não cabia ao estado ou aos governos criar obstáculos ao “processo natural de seleção bio-sociológica das elites”, cabendo-lhes apenas defender as classes dominantes (Blanc: 1994).

Trata-se de um pensamento conservador que condena toda intervenção do Estado – e humana, social – num processo que considera “natural,” e rejeita qualquer medida para alterar a ordem social injusta existente, e que considera “natural”. Para esta maneira de pensar autoritária e exclusivista, a seleção natural elimina aqueles que considera “inferiores” e menos aptos, que “deveriam morrer mais cedo e deixar menos descendentes” (Blanc, 1994).

Um autor que defendeu um ponto de vista baseado nesses pressupostos terríveis e desumanos foi o alemão Oswald Spengler (1880-1936), cujas ideias foram registradas num livro de grande prestígio em sua época, “A decadênciado Ocidente”, de 1918 (Spengler: 1964), onde descreveu a sociedade como um organismo e seus ciclos vitais. Ele diferenciou entre natureza e história: a primeira foi vista como ligada à lógica mecânica e à repetição; a história foi encarada como a experiência vivida, captada de forma imediata, irracional e instintiva. Concepção que tem forte afinidade com a do conservador, aristocrático e inimigo da democracia Friedrich Nietzsche.

Os nazistas consideraram Spengler (assim como Nietzsche) precursor de suas idéias desumanas, embora o pensamento de Spengler fosse ainda mais radicalmente de direita e excludente que o deles – Spengler se afastou dos nazistas por não aceitar o que considerava o “plebeísmo” “populista” de Adolf Hitler e seus asseclas. Rejeitava a preocupação em atender, mesmo que apenas retoricamente, às reivindicações do povo alemão, que os nazistas consideravam racialmente “superior”. Para Spencer o foco do regime nazista deveria ser a defesa dos privilégios da classe dominante alemã e restaurar o prestígio da aristocracia (Spengler: 1964).

Ele tinha uma visão da história pessimista e acreditava que a Europa enfrentava dois inimigos: um, interno, era a revolução “branca” dos operários e socialistas. Outro, externo, era a revolução “morena” dos povos colonizados que lutavam pela independência e autonomia. Eram inimigos de classe e das nações dominantes e colonizadoras e podiam provocar, pensava ele, a decadência do Ocidente.

Referências:

Blanc, Marcel. Os herdeiros de Darwin. São Paulo, Editora Scritta, 1994.

Darwin, Charles. A origem das espécies e a seleção natural. São Paulo. Madras, 2009.

Darwin, Charles. The descent of man, and selection in relation to sex. London, John Murray, 1871.

In http://darwin-online.org.uk/content/frameset?pageseq=1&itemID=F937.1&viewtype=text, consultado em 15 de julho de 2018.

Spengler, O. “A Decadência do Ocidente: esboço de uma morfologia da História Universal”. Rio de Janeiro. Zahar Editores, 1964.

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José Carlos Ruy* é jornalista, escritor, estudioso de história e do pensamento marxista. 

 

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(BL)