Três representantes da cepa de convidados por Biden: Duterte, Guaidó e Bolsonaro

A encenação, pelo governo Biden, da assim chamada ‘cúpula pela democracia’ virtual, nesta quinta-feira (9) e sexta-feira (10), sem coordenação com a ONU e com convites a critério da Casa Branca, levou o porta-voz da chancelaria chinesa, Zhao Lijian, a comentar a falta de credenciais dos Estados Unidos quanto ao tema.

A relação de convites a dedo de Biden incluiu também Jair Bolsonaro, o filipino Rodrigo Duterte e até o autonomeado Juan Guaidó.

Bolsonaro é notório por sua defesa do torturador confesso Ulstra, e por alardear sua disposição em matar “30 mil esquerdistas”. Duterte tornou-se um pária no mundo inteiro por seus esquadrões da morte que, a pretexto de “coibir o tráfico’, cometeram execuções sumárias em bairros paupérrimos, dezenas de milhares, a ponto da denúncia ter valido à jornalista filipina, Maria Ressa, o Nobel da Paz 2021.

Já Gaidó é execrado na Venezuela, entre outras coisas, por ter ajudado a assaltar, para sua corriola, reservas depositadas em bancos da Inglaterra e Portugal e ativos estatais nos EUA, quando faltavam divisas para comprar vacinas.

A cúpula abordará ainda ‘corrupção’ – possivelmente sob o prisma da ‘melhor democracia que o dinheiro pode comprar’, como costuma dizer o jornalista Greg Palast – e ‘direitos humanos’ (‘Guantánamo’ onde?).

“Na sociedade dos EUA, o racismo está profundamente enraizado, a supremacia branca é galopante e a igualdade étnica permanece fora de alcance. É assim que os EUA defendem a democracia?”, apontou o porta-voz Zhao, se referindo a questões como a maior explosão de indignação em cinco décadas, no ano passado, após um negro, George Floyd, ser asfixiado com o joelho sobre seu pescoço por um policial branco racista, e traduzir a democracia made in USA com sua frase “não consigo respirar”.

Sobre a incapacidade dos EUA de fazer frente à pandemia, apesar dos imensos recursos disponíveis no país mais rico do planeta, Zhao assinalou: “Os Estados Unidos registraram mais de 800.000 mortes e 50 milhões de infecções por Covid-19, mais do que qualquer outro país do mundo. Isso equivale a uma tragédia de direitos humanos. É assim que os EUA defendem a democracia?”.

“Em apuros” ou “falhando”

Pesquisas e relatórios mostram que 45% dos americanos acham que a democracia não está funcionando bem em casa. Entre os jovens, 52% acreditam que a democracia americana está “em apuros” ou “falhando”.

Como lembrou Zhao, 81% dos americanos afirmam que há uma séria ameaça doméstica para o futuro da democracia dos EUA, com apenas 17% dos americanos alegando que a democracia dos EUA é um bom exemplo a ser seguido por outros países. Em compensação, para 44% das pessoas ao redor do mundo os Estados Unidos são “a maior ameaça à democracia global”.

Mentalidade de Guerra Fria

Por sua vez, o Diário do Povo denunciou o objetivo da ‘cúpula’ de “provocar separação e confronto”, retomando a mentalidade de guerra fria, do “nós contra eles”. O artigo registrou ainda que “a democracia é fruto do desenvolvimento da civilização humana e um valor comum compartilhado por toda a humanidade. No entanto, ao longo dos anos, os EUA, apesar das falhas estruturais e da prática problemática de seu sistema democrático, reivindicou-se como o ‘modelo de democracia’”.

Pior: “interferiu incessantemente nos assuntos internos de outros países e travou guerras sob o pretexto de ‘democracia’, criando turbulências regionais e desastres humanitários”.

Não é adorno

“A democracia não é um adorno ou golpe de publicidade; em vez disso, deve ser usada para resolver problemas enfrentados pelas pessoas. Para julgar se um país é democrático, é importante ver se seu povo governa seu próprio país. Não existe um sistema de democracia perfeito no mundo, nem um sistema político que se adapte a todos os países”, assinala o documento “O Estado da Democracia nos Estados Unidos”, publicado por Pequim.

O relatório chinês conclama todos os países “a superarem as diferenças de sistemas, rejeitarem a mentalidade do jogo de soma zero e buscarem o multilateralismo genuíno. Todos os países precisam defender a paz, o desenvolvimento, a equidade, a justiça, a democracia e a liberdade, que são valores comuns da humanidade”.

Também é importante – acrescenta – que todos os países “respeitem uns aos outros, trabalhem para expandir o terreno comum enquanto abrigam as diferenças, promovam a cooperação para o benefício mútuo e construam conjuntamente uma comunidade com um futuro compartilhado para a humanidade”.

Mas é um estudo do Instituto Chongyang de Estudos Financeiros da Universidade Renmin da China (RDCY), intitulado “Dez perguntas para a democracia americana”, que pôs em xeque a pretensão dos EUA de serem o ‘farol da democracia’ no mundo.

“A democracia americana é uma democracia para a maioria ou uma democracia para a minoria? Garante freios e contrapesos ou leva ao abuso de poder? Melhora o bem-estar das pessoas ou aumenta seu sofrimento? Defende a liberdade ou a atrapalha? Protege os direitos humanos ou os viola? Promove unidade ou leva à divisão? Ajuda a realizar sonhos ou a criar pesadelos? Vai melhorar a governança nacional ou levar à falha do sistema? Traz desenvolvimento e prosperidade para outros países ou desastre e turbulência? Irá manter a paz e o desenvolvimento mundiais ou minar a ordem internacional?”, elenca o estudo.

Também referente à questão, Pequim repudiou o convite de Biden a Taiwan para participação na ‘cúpula das democracias’, que para muitos sugere uma tentativa de criar uma ‘otan das democracias’ anti-China e anti-Rússia. “Há apenas uma China no mundo. O governo da República Popular da China é o único representante legal de toda a China, e Taiwan é parte inalienável do território chinês”, disse Zhao .