Anvisa

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) enviou ofício ao Ministério da Saúde em março para se queixar de que estava recebendo e-mails diretamente da empresa Precisa, representante do laboratório indiano Bharat Biotech no Brasil, para viabilizar a aprovação da vacina Covaxin. O governo havia assinado um contrato no valor de R$ 1,6 bilhão para a compra de 20 milhões de doses da vacina indiana.

Antes disso, Jair Bolsonaro já havia se empenhado pessoalmente junto ao primeiro ministro da Índia, Narendra Modi, em favor do contrato com a empresa Precisa para a compra da Covaxin.

Em 20 de março o servidor de carreira do Ministério da Saúde, Luis Ricardo Miranda, chefe da divisão de importações do órgão, foi ao Palácio da Alvorada junto com seu irmão, o deputado Luis Miranda (DEM-DF), da base do governo, e relataram ao presidente a existência de fortes indícios de irregularidades na importação da Covaxin.

Pressões foram feitas para acelerar contrato irregular de R$ 1,6 bilhão (Reprodução)

Nos dias anteriores e também depois da denúncia feita a Bolsonaro, os superiores de Luis Ricardo seguiram pressionando-o a assinar uma nota de importação no valor de R$ 225 milhões a serem pagos antecipadamente para uma terceira empresa com sede em um paraíso fiscal. Todas essas condições estavam em contradição com o contrato oficial. Ele relatou que foram feitas mudanças nas notas, mas com a permanência de graves irregularidades, entre elas o pagamento antecipado à terceira empresa. Por isso ele decidiu não autorizar o prosseguimento da importação.

Como Jair Bolsonaro não tomou nenhuma providência, mesmo tendo tomado conhecimento das irregularidades e também porque uma outra servidora do Ministério, na função de fiscal do contrato, indicada na gestão de Ricardo Barros, atual líder do governo, autorizou a importação, o servidor prestou depoimento ao Ministério Público e relatou as irregularidades e as pressões que sofreu para acelerar a aquisição da Covaxin. O depoimento vazou e o escândalo veio à tona.

Agora, a informação de que a Anvisa também se manifestou, relatando que, da mesma maneira que o servidor do MS, foi pressionada, é mais um elemento que reforça as suspeitas de irregularidades sobre a importação da vacina, que previa a entrega de 20 milhões de doses por R$ 1,6 bilhão. A dose do imunizante foi a mais cara entre todas as vacinas contratadas, e o processo para aquisição ocorreu de maneira mais célere. Outro dado é que o dono da Precisa foi apresentado ao presidente do BNDES pelo senador Flávio Bolsonaro. Mais um sinal de que o esquema de desvio do contrato da Covaxin não era somente do líder do governo, como quis fazer crer Bolsonaro na conversa com os irmãos Miranda.

O comunicado da Anvisa ao Ministério da Saúde, datado de 24 de março – quatro dias após o encontro dos irmãos Miranda com Bolsonaro – partiu do gabinete do presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres. Ele reclamava que a agência estava sendo procurada diretamente pela empresa Precisa, representante do laboratório indiano Bharat Biotech no Brasil, responsável pela fabricação da Covaxin. Bolsonaro já sabia das irregularidades e não havia feito nada.

Na mensagem, a Anvisa alegou que era preciso evitar “tumulto” no processo. “Precisa Medicamentos, tem, por intermédio de mensagens eletrônicas, copiado setores e diretorias da Anvisa com informações alusivas ao processo, o que pode causar tumulto à instrução processual”, diz trecho do ofício, que consta de um processo administrativo aberto pela própria pasta. Mesmo com todas essas evidências de irregularidades, o processo estava andando. Só parou quando o servidor denunciou. Bolsonaro não só não fez nada como iniciou uma perseguição violenta ao servidor de carreira do Ministério.