Em 2018, Vital Nolasco e eu nos víamos quase diariamente. Como membros da Comissão Executiva do PCdoB São Paulo (SP) – ele à frente da Secretaria Sindical e eu, na Secretaria de Comunicação –, volta e meia ficávamos de papo no prédio da Rua Rego Freitas que abriga as sedes nacional, estadual e municipal do PCdoB.

Mas na tarde de 21 de março daquele ano, em vez de conversa, houve uma entrevista. O Centro de Memória Sindical (CMS), coordenado pela Carolina Maria Ruy, preparava o projeto “1968 e os Trabalhadores”. Fui contratado para ajudar na apuração – e uma das minhas tarefas foi justamente tomar o depoimento do Vital.

Operário aposentado, mineiro de nascimento, ele tinha participado da greve dos metalúrgicos de Contagem (MG), em abril de 1968. Foi uma das primeiras manifestações sindicais a confrontar diretamente a ditadura militar imposta pelo Golpe de 64. Cinquenta anos depois, gravamos cerca de uma hora de entrevista com o Vital sobre esse episódio histórico do movimento sindical brasileiro. O material foi publicado na revista lançada pelo projeto e também chamada “1968 e os Trabalhadores”.

Em homenagem a Vital, que morreu nesta quarta-feira (19), aos 75 anos, o Portal do PCdoB reproduz a íntegra dessa entrevista. Nossos agradecimentos ao CMS – e à Carolzinha, em especial – por terem autorizado a publicação desse conteúdo que, até aqui, estava inédito na internet.

André Cintra: Como você se tornou metalúrgico?

Vital Nolasco: Em 1967, eu trabalhava como representante em uma empresa de máquina de calcular e ganhava salário mínimo. Lá eu conheci uma pessoa que me apresentou na empresa Sottex (Sociedade Técnica Têxtil Ltda.), que reformava máquinas de costura. Aí, sim, fui ser metalúrgico. Entrei em contato com o Sindicato entre o fim de 1967 e início de 1968.

André: Em Contagem ou sempre BH?

Vital: Em BH. Comecei a ter contatos em Contagem por meio da JOC (Juventude Operária Católica) e na preparação da greve de abril de 1968. Conheci a diretoria do Sindicato. O presidente era o Santana, que era um tipo de interventor. Quem tinha ganhado as eleições foi o Ênio Seabra, cassado em 1964. O Ênio era a grande liderança.

André: Nestes anos, 1967, 1968, quais forças políticas atuavam e ditavam os debates dentro do Sindicato?

Vital: O Partido Comunista lá sempre teve certa hegemonia, mas após golpe de 1964 houve uma grande dispersão na esquerda. Começaram a surgir organizações, quase todas oriundas ou do antigo Partido Comunista ou ligadas a Igrejas, que eram os casos da JOC, da JUC (Juventude Universitária Católica), da JEC (Juventude Estudantil Católica) e a AP (Ação Popular), que era uma das mais fortes. A Igreja tinha forte influência nesses movimentos sociais. Havia também a Polop (Política Operária), POC, ALN (Ação Libertadora Nacional) e outras.

André: O Ênio era reconhecido como a grande liderança?

Vital: Em 1967 se formou essa chapa de oposição, liderada pelo Ênio Seabra. Ele ganhou, mas não o deixaram tomar posse. Ele, que trabalhava na Mannesmann, era a grande liderança dos metalúrgicos. Outra grande liderança era o Mário Bento. Ele era mais ligado a Belo Horizonte e o Ênio, a Contagem. Tinha outras lideranças, como o Vinícius, o Renato, que era um pastor que trabalhava na Polimatic, a Maria Imaculada Conceição, secretária-geral do Sindicato, que era de uma corrente marxista dissidente do PCB. Ela foi presa, torturada, comeu o pão que o diabo amassou. Mas a grande disputa ali era entre a Mannesmann e a Belgo-Mineira. Por causa do Ênio quem tinha o controle ali era a AP – e o Ênio era AP. Na Belgo-Mineira, atuavam esses outros grupos.

André: Tinha um jornal ali chamado O Companheiro, não?

Vital: Sim. Ajudei muito a distribuir O Companheiro na porta da Mannesmann.

André: Antes da eleição?

Vital: Antes da eleição. O jornal era o porta-voz dos trabalhadores da Mannesmann. Depois fundamos outros. Ali, logo que você chegava você fundava um jornal. Tinha O Companheiro, tinha o Marreta.

André: Vou citar três pontos do programa da chapa de oposição que gostaria que você comentasse. Um ponto era a “expulsão dos pelegos”. Esse era um ponto em voga na época?

Vital: Estava muito em voga porque quem assumiu a direção do Sindicato, o Santana, era tido como pelego. Mas hoje, se você for ver, ele não era pelego.

André: Outro ponto era contra o arrocho. Vamos falar bastante sobre ele porque é um tema bem importante. A questão do arrocho estava mais ligada à base…

Vital: Isso, porque a ditadura estipulou o arrocho salarial. Então não tinha aumento de salário, mas tinha inflação.

André: A outra bandeira era “contra o fim da estabilidade no emprego”?

Vital: Sim. Antes de 1964, havia a estabilidade. Depois de um tempo de serviço, você não podia ser mandado embora. E, se fosse, a empresa tinha de pagar uma multa altíssima. Por isso, ninguém demitia. Então os militares acabaram com essa estabilidade e instituíram o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

André: Aí vem a eleição e a oposição vence…

Vital: A oposição vence, mas não deixaram o Ênio e os outros companheiros tomarem posse.

André: Mas a Conceição entrou…

Vital: Não sei por que cargas d’água, mas o fato é que ela entrou.

André: Esse processo ajudou a politizar o Sindicato e a torná-lo mais bem visto pela categoria?

Vital: Sim. Naquela época, o movimento estudantil estava no auge, né? Teve um papel importante. O movimento operário também começou a ressurgir com força – e aí deu naquela greve. Logo em abril, foi feita a primeira greve depois do golpe. Isso não é muito lembrado, não se conta muito essa história, mas foi a primeira vez que se obteve uma vitória contra a ditadura, que foi o reajuste. Na verdade, não foi nem um reajuste, foi uma antecipação de 10%. Lembro como eram concorridas as assembleias naquele Sindicato. A rua ficava cheia, descia gente pelas galerias. E foi numa dessas assembleias que o ministro Jarbas Passarinho compareceu.

André: Vamos chegar lá. Mas, antes desse processo da eleição, como eram as negociações Sindicato/empresa, trabalhador/empresa? Havia negociação? Havia alguma coisa organizada?

Vital: Que eu saiba, não. Como a ditadura interveio, era muito difícil a negociação por empresa. Aliás, eu só tomei conhecimento de negociação por empresa aqui em São Paulo.

André: Entre 1964 e 1968, os salários perderam cerca de 30% do valor. Em março de 68, foi criado em Minas o Comitê Intersindical Antiarrocho. Você participou desse processo?

Vital: Enquanto JOC, sim. Não do Comitê porque não era sindical.

André: É verdade que tinha, já na criação, uns 2 mil trabalhadores?

Vital: Sim, era gente pra diabo. Foi um marco da retomada da luta operária. Quem propôs a criação do Comitê Intersindical Antiarrocho foi o PCdoB. O João Amazonas ajudou a criar esse movimento.

André: Aí vem o dia 16 de abril. Às 7 da manhã, a paralisação começa com os trabalhadores da trefilaria da Belgo-Mineira.

Vital: Isso mesmo. Como tinha esse Comitê, o pessoal se reunia. Aí fluía. Houve até uma disputa para ver quem liderava. A pauta principal era 25% de reposição salarial. E a empresa oferecia só 10%. Mas não queríamos aceitar.

André: Por que começou na Belgo-Mineira?

Vital: Não houve nada planejado. Foi feita a assembleia que decidiu pela greve. E o pessoal da Belgo tomou a frente.

André: Qual era a importância da Belgo para a cidade? Tinha um peso grande?

Vital: Ah, tinha, junto com a Mannesmann. A Belgo pegava material bruto, o aço, e fazia arame, enfim. Por isso, chamava trefilaria. Eram os trefilados.

André: É verdade que o Sindicato não estava a par desse início da greve?

Vital: Não, não estava. A greve foi preparada de forma clandestina.

André: Foi uma iniciativa do pessoal do Colina (Comando de Libertação Nacional)?

Vital: A greve na Belgo, sim. Eles tinham força na Belgo. O jornal de fábrica deles era O Piquete. E O Companheiro era o da Mannesmann. A adesão foi massiva – cerca de 1.600 trabalhadores. Outras empresas aderiram e foi uma grande greve. Aí elegemos uma comissão.

André: Havia uma direção que centralizava ou a assembleia tinha peso?

Vital: A assembleia tinha peso, mas, quando as decisões chegavam à assembleia, elas já tinham passado pela comissão. Geralmente, como as lideranças defendiam essas posições, a assembleia acabava aprovando.

André: A Sociedade Brasileira de Eletrificação e os bancários também aderiram à greve?

Vital: Eles eram dirigidos também pela AP, que adotava o sistema de integração na produção. Muitos profissionais liberais e estudantes acabaram indo para as fábricas. O Sindicato ficou lotado. E houve o episódio no qual o Jarbas Passarinho foi ao Sindicato.

André: E o Ênio Seabra?

Vital: Ele voltou como presidente da comissão.

André: Qual era a expectativa com a greve?

Vital: Havia a idealização de que a gente ia botar a ditadura abaixo. Tanto que, quando estava no auge da greve, lembro que entrei todo feliz na sala da Conceição, que era a secretária-geral, e falei: “Ô, Conceição, desta vez a gente vai botar a ditadura abaixo”. Porque era corrente, né? Nas organizações, na JOC, no movimento sindical, todos achávamos que deveríamos aproveitar toda aquela mobilização para botar abaixo a ditadura. Agora, claro que os operários, a grande massa, não tinham essa expectativa. Queriam mesmo era o aumento.

André: Havia também temores?

Vital: Não rapaz, vou te dizer o seguinte: naquela época, era todo mundo “porra louca” (risos). A gente queria “botar pra quebrar”. Tanto que a aceitação dos 10% foi sob a condição de que a gente já começasse a preparar a greve de outubro.

André: Vocês esperavam que o Jarbas Passarinho se pronunciasse sobre a greve em rede nacional?

Vital: Não. Na realidade, o Jarbas Passarinho era um cara muito ousado e corajoso. Não era qualquer um que entrava em uma assembleia sindical representando o patronato e a ditadura. E ele foi. Foi e falou um monte de besteira.

André: Chegou a intimidar?

Vital: Não. Pelo contrário: tocou mais fogo na canjica. Cresceu o movimento.

André: E depois?

Vital: Aí a polícia começou a reprimir.

André: Qual foi seu sentimento em relação à greve?

Vital: Foi um sentimento de vitória, apesar de não termos conseguido os 25% de aumento, nem termos derrubado a ditadura, porque aquilo era um sonho. Só pelo fato de a greve ter se expandido e ter confrontado a ditadura foi um movimento e tanto, entendeu?

André: O reajuste, de 10%, era só para Contagem?

Vital: Era, mas depois eles estenderam para todo o Brasil. Não era reajuste, era antecipação. Depois começou a luta para que na campanha salarial, que seria em outubro, não houvesse o desconto da antecipação. Em outubro foi bem maior. Não era mais uma campanha salarial, ali já era greve. Teve mais organização. Tanto que se dividiu o comando. Em outubro, tinha o comando de greve de Contagem e o comando de greve de Belo Horizonte.

André: E a cidade foi parada?

Vital: Foi tudo parado, com ocupação, com tudo. Eu não me recordo quanto tempo, mas a Mannesmann ficou um tempo grande ocupada. Aí, sim, eu participei das reuniões do comando de greve. As reuniões dos comandos de greve de BH e Contagem eram unificadas. Antes disso, houve o Primeiro de Maio, onde começou uma divisão. Estávamos reunidos no auditório da Secretaria de Saúde. Uns queriam que a gente fosse para a rua. Virou uma discussão da peste, se terminava ali o Primeiro de Maio ou se a gente saía para a rua. A AP defendia que fôssemos para a rua. Só sei que, quando a gente decidiu ir para a rua, rapaz, aí a gente apanhou da polícia. Porque a polícia se articulou e meteu o cacete. Mas também a turma reagiu, viu? Tocaram fogo em carro de polícia. Foi uma guerra campal. Isso foi depois da greve e já preparando as batalhas de outubro. Você falou do Sindicato dos Bancários. O pessoal jogou um papel aí. Dos bancários e da Petrobras, que tinha ali a refinaria Gabriel Passos.

André: Qual grupo era mais radical?

Vital: É difícil dizer. Nessa discussão sobre o Primeiro de Maio, teve gente que defendeu encerrar a assembleia ali. Mas o pessoal da AP defendeu ir para a rua. Eu era ligado à AP, mas não era orgânico da AP ainda, e defendi que o melhor fosse terminar ali. Quando um companheiro – não me recordo se dos Bancários ou da Petrobras – botou o pé na rua, aí o pau cantou. Eu mesmo passei por um cordão polonês que a polícia fez. Não sei se você sabe como é isso – a gente era obrigado a passar pelo cordão polonês e levava porrada, rapaz! E depois saímos para o revide.

André: Qual foi a pauta da greve de outubro?

Vital: Aumento salarial e não desconto da antecipação. Havia também a questão da estabilidade no emprego.

André: Houve perseguição depois da greve?

Vital: Não. Ninguém foi preso. Me parece que o Ênio Seabra chegou a ser conduzido ao Dops (Departamento de Ordem Política e Social), mas nem preso ficou.

André: Por que você acha que a greve de outubro foi maior?

Vital: Houve mais tempo de preparação. A de abril foi mais espontânea, porque o arrocho era violento.

André: E o episódio da Mannesmann?

Vital: A gente dividiu o comando de greve em dois comandos. Depois da greve deflagrada, tinha o comando de BH, que se reunia separado do comando de Contagem. Aí o comando de Contagem resolveu se organizar. Deve ter tido infiltração, qualquer coisa. Fizeram uma reunião em uma igreja da cidade e puseram um peão para tomar conta. Os primeiros a serem presos foram eles, os caras que estavam tomando conta. E prenderam toda a liderança, mas aí depois de eles já terem invadido a Mannesmann. Porque a resistência lá foi muito grande. O pessoal ocupou a fábrica, prendeu a diretoria da empresa. Houve muita tática por parte da repressão. Começaram a difundir boatos dentro da fábrica. Diziam: “Mulher de fulano tá passando mal, tá internada”, “o filho do outro tá assim” – e isso foi criando um clima de muita apreensão por parte dos trabalhadores. Um dos erros que se cometeu ali na Mannesmann foi que a greve se centralizou dentro da oficina central, que era onde estava o pessoal mais politizado. Era ferramentaria, manutenção, e a “peãozada” entrou de alegre. Não foi feito um trabalho para ganhar o pessoal para o movimento. Aí se restringiu àquela oficina central.

André: Houve uma negociação para libertar a diretoria?

Vital: Houve. E foi aí que o pessoal foi enganado. Falaram que se libertassem a diretoria não haveria repressão, e eles acreditaram. O trunfo do pessoal que ocupou a Mannesmann era justamente manter a diretoria refém. Na medida em que libertaram… não foi imediato. Mas aí invadiram a fábrica.

André: Quando libertam a diretoria, foi o ponto da virada?

Vital: Sim. Aí foi uma repressão que, só na Mannesmann, mandaram mais de mil trabalhadores embora por justa causa. Criou-se um clima de terror. Depois disso, começamos a fazer, pela primeira vez, um… o nome não era fundo de greve. Foi onde a Igreja teve um papel importante. Tinha uma instituição chamada Cáritas, que recolhia doações, mantimentos. E eles doaram tudo para a gente formar os comitês de apoio aos demitidos. Foi o que ajudou. Mas foi um clima de terror. Eu mesmo, quando ia à casa de alguns companheiros, eles falavam assim: “Se você quiser vir como amigo, venha… mas não venha mais falar de greve”. Eu mesmo pensei que nunca mais fosse haver greve em Contagem. E demorou muito. Depois veio o AI-5, essa coisa toda.

André: Houve repressão posterior às lideranças da greve?

Vital: Sim, foram todos presos. E ficaram vários meses. Eu fiquei na clandestinidade. Me encontraram assim: a JOC era ligada à Cúria Metropolitana. O pessoal da comissão nacional e regional da JOC morava no Horto, em uma casa alugada no meu nome. E o fiador era o Faria, ex-presidente do Sindicato dos Bancários. Logo depois do AI-5, o pessoal da JOC foi perseguido, e deixaram a casa fechada. A vizinhança e a proprietária acharam estranho e chamaram a polícia, apesar que a Cúria pagava o aluguel. Quando abriram a casa e foram ver na imobiliária, viram que a casa estava alugada em meu nome. Aí me localizaram. Foram para me prender e tal, eu consegui me mandar e fui morar uns tempos lá em Contagem, na casa do Mário Bento. Depois vim para São Paulo. Vim clandestino e procurado, né? Não podia ter contato com a família nem com ninguém.

André: Apesar disso tudo, você voltou para a luta sindical.

Vital: É um dado interessante. Eu era da célula de ampliação da AP, porque não podia me integrar direto na AP. Havia um estágio (risos). Quando cheguei a São Paulo eu não tinha onde ficar. E tinha um ponto ali no Largo da Aclimação. Era mês de julho, um frio desgraçado, rapaz! Aí veio um cara nos encontrar e me deixou uns dias na casa dele. Foi quando eu retomei o contato com a JOC. Procurei o pessoal da JOC aqui, procurei a Maria José, que era casada com o Stein, que era da Ala Vermelha do PCdoB. Escrevi uma carta para o Mário Bento, contando a situação e dizendo que eu ia procurar meu pessoal. Mas eu me referia à JOC, e eles pensaram que eu me referia à minha família. Então eles montaram campana em frente à minha casa e tudo. E essa carta eles prenderam quando prenderam a Gilse Consenza, que era da direção da AP, porque o Mário Bento havia entregado para ela a carta. Eu não tinha documento e não tinha como trabalhar em São Paulo. Foi quando comecei a usar o nome “Vital”, e não o primeiro nome, “Eustáquio”. O pessoal da AP, então, me botou em contato com o Aldo Arantes, que me arrumou uma cópia do certificado de reservista. Com aquilo eu consegui tirar a carteira profissional, tirar a documentação, e fui trabalhar na metalúrgica Wapsa, depois na Walita, fiz o curso de eletricidade no Senai do Tatuapé e aprendi a profissão de eletricista. Fui, então, trabalhar de eletricista na Philco.

André: Como você foi parar no Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo?

Vital: Eu era da oposição sindical, militei na oposição e a primeira coisa que a gente fez foi um jornal, porque eu trazia a experiência de Contagem. Mas antes disto eu fiquei um tempo no ABC, com aquele pessoal, o Stein, e conheci o Frei Chico, que é irmão do Lula. Naquela época estava se discutindo se compunha com a chapa com o Paulo Vidal ou se fazia oposição. Prevaleceu a ideia do Frei Chico de compor com ele. Foi onde o Lula entrou na diretoria do Sindicato.

André: Mas você chegou a ser diretor em São Paulo?

Vital: Aí foi depois de ser oposição, quando o Aurélio Peres tinha encabeçado a Chapa 3. Tivemos a greve de 1979, quando foi morto o Santo Dias. O Aurélio já era deputado, e o Joaquinzão, então, fez uma reciclagem. Entrou um pessoal que era do Partido, do PCB, na diretoria. E a gente foi também! Eu entrei para a diretoria dos metalúrgicos em 1984.

André: Como você enxerga 1968 na sua vida, na sua formação de militante? Falta idealismo hoje no movimento sindical?

Vital: Acho que falta. Mudou muito, né, André? Quem conserva ainda um pouco deste desprendimento é o MST, até por causa da influência da Igreja. Mas hoje falta muito idealismo à esquerda. O pessoal era muito solidário. A própria situação obrigava que fosse. Eu, por exemplo, dividia meu salário com a AP. Dividia mesmo. Tirava o que era suficiente para mim e entregava o restante. Muita gente fazia isso. Hoje, para conseguir um centavo, é uma briga de foice (risos). Essa briga de Contagem e BH foi uma parte da história. Eu não fui dos principais protagonistas desse movimento, estava no início da minha militância, mas aprendi muito. Foi o que me deu sustentação para eu poder continuar na caminhada que estou até hoje.