O presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Nésio Fernandes

O presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Nésio Fernandes, criticou a decisão do governo federal de encerrar de forma abrupta a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin) em virtude da pandemia de Covid-19.

Na tarde desta sexta-feira (22), o ministro da Saúde do governo Bolsonaro, Marcelo Queiroga, publicou decreto em que confirma o encerramento da Espin.

“Lamentável que o debate sobre o fim do Estado de Emergência de Importância Nacional tenha se limitado a determinação política do Palácio do Planalto”, considerou Nésio Fernandes. O Conass defendia um período de 90 dias para que a Espin fosse encerrada, após a devida avaliação dos impactos da pandemia pelos órgãos de saúde pública.

“O Conass orienta que os Estados vinculem suas normas à declaração de Emergência de Saúde Pública Internacional definida tecnicamente pela Organização Mundial da Saúde (OMS), de modo a preservar a capacidade de resposta do SUS à pandemia”, apontou Nésio, que é secretário de Saúde do Espírito Santo, em suas redes sociais.

Segundo ele, o sistema de saúde precisa “avançar na formulação dos indicadores de controle e gatilhos para adoção de novas medidas caso ocorra novo crescimento de casos/internações/óbitos”.

“Ao longo dos próximos 90 dias seguiremos construindo avaliações de cenários e consensos técnicos em torno da gestão da pandemia, buscando entendimentos com o MS e construindo um Plano de Retomada”, ressaltou.

A nota do Conass e Conassems alerta: “Preocupa-nos o impacto de um encerramento abrupto, pois há considerável número de normativos municipais e estaduais que têm se respaldado na declaração de emergência publicada pelo Ministério da Saúde, assim como há diretrizes do próprio ente federal que impactam estados e municípios e que também têm seus efeitos vinculados à vigência da declaração de emergência.  Consequentemente, tais atos normativos precisarão ser revistos e atualizados para adequação à nova realidade”.

O documento destaca ainda que “a pandemia da Covid-19, não obstante seu arrefecimento, ainda não acabou. Desse modo, é necessária a manutenção das ações de serviços de saúde, sobretudo as da atenção primária, responsáveis pela vacinação e pela capacidade laboral dos leitos hospitalares ampliados”.

Na avaliação de Nésio Fernandes, agora é  “tempo de consolidar a tendência de queda de casos, internações, óbitos e avançar mais na vacinação; 90 dias para monitorar e avaliar o cenário e construir um plano de retomada”.

Tal plano, diz, deve prever, entre outros pontos, indicadores de controle relativos ao número de casos, internações e óbitos por semana epidemiológica, “definindo gatilhos para ações de enfrentamento à pandemia nos diversos cenários possíveis. Outros indicadores podem compor a avaliação de cenário, quantos e quais precisam ser definidos”.

Da mesma forma, Nésio defende uma meta mínima de 90% de cobertura vacinal por faixa etária. “O PNO [Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19] precisa migrar para o PNI [Programa Nacional de Imunizações] e com meta clara. Até hoje não consta oficialmente a meta de vacinação. A eficácia da atual geração tecnológica de vacinas exige meta mínima de 90% com esquema atualizado”.

Vacinação

Para o secretário, a imunização contra a Covid-19 precisa de “uma agenda nova e mobilizadora da população. Sua incorporação ao PNI deve acontecer acompanhada de ampla campanha que recupere o ritmo da vacinação em todo o Brasil”.

Nésio salientou que “a confiança de pais e mães foi profundamente abalada e o ritmo da vacinação em idades pediátricas é insatisfatório. A terceira dose é fundamental para preservar o cenário epidemiológico de controle no segundo semestre de 2022. Ele reforçou que a vacinação pediátrica precisa avançar para outras faixas etárias e que o segundo reforço dos idosos é fundamental para a mitigar riscos de internações e óbitos.

O secretário também explicou que “sem uma ampla campanha de mobilização que recupere o ritmo da vacinação, teremos uma grande proporção de pessoas com mais de seis meses da última dose da vacina no segundo semestre, onde a subvariante BA.2 da ômicron deverá estar predominante em todo o Brasil”.

Ele destaca ainda que a capacidade de resposta assistencial e de vigilância instalada dos estados e municípios “precisa estar preparada para todas as necessidades de saúde e com condições de responder rapidamente a mudanças abruptas do cenário” e alertou que “podemos ter uma campanha eleitoral com máscaras e muitos testes se um plano de retomada eficaz não for construído e executado ao longo dos próximos 120 dias. Quem acha que agenda da pandemia acabou poderá ser surpreendido”.

Medida atende interesses eleitorais de Bolsonaro

Em entrevista ao portal UOL, o médico sanitarista Gonzalo Vecina disse que o anúncio da medida não foi “inteligível” e buscou apenas atender a interesses eleitorais de Bolsonaro.

“O momento (da pandemia) não é desesperador, mas jamais seria o de decretar o fim da emergência sanitária”, disse Vecina.

Segundo ele, o decreto anunciado por Queiroga baseia a validade de cerca de 170 atos que foram tomados pelo Executivo para lidar com a pandemia, como o que permite o registro emergencial de vacinas contra a Covid-19 e a dispensa de licitações.

“A diferença entre o registro emergencial e o normal (de vacinas) é pequena, mas significa algo em torno de três a quatro meses de tramitação burocrática na Anvisa”, afirmou o médico.

Para o sanitarista, tudo indica que o anúncio feito deve ser questionado pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), instância que monitora as políticas do Ministério da Saúde e pela Comissão Intergestores Tripartite, responsável pela gestão do SUS e que não foi consultada.

Da mesma forma, o secretário de Saúde de São Paulo, Jean Gorinchteyn, disse discordar da ação do ministro da Saúde: “É uma atitude intempestiva. Não poderia acontecer nesse momento. Hoje temos um país desigual na vacinação. Não falo de São Paulo, que é uma realidade muito diferente do Brasil.”

“Seguramente temos que entender que temos de manter as estratégias. Elas ajudam os estados tanto para compra de insumos para covid, quanto para as vacinas, as restrições. Temos de ter essa compreensão”, concluiu.