Comissão de Organização faz balanço e pauta desafios para 2022
Com o objetivo de desdobrar, no plano estadual, os debates iniciados em recente reunião do Comitê Central acerca da necessidade de o PCdoB superar a cláusula de barreira em 2022, a partir de profunda análise da realidade nacional e partidária, foi realizada na noite desta quinta-feira (17) reunião por videoconferência com a Comissão Nacional de Organização (CNO). Ao todo, mais de 170 dirigentes participaram do encontro virtual.
Ao abrir os trabalhos, o secretário nacional de Organização, Fábio Tokarski, homenageou os comunistas assassinados na Chacina da Lapa, que completou 44 anos no dia 16 de dezembro. Em seguida, o dirigente destacou que a reunião buscava debater a “construção de novas perspectivas para este momento tão grave que o Brasil enfrenta”.
Ele lembrou, conforme avaliação feita no CC, que as eleições de 2020 marcaram importante derrota para Bolsonaro, mas que os resultados ficaram aquém das necessidades e dos planos dos comunistas. Fábio destacou a importância do 15º Congresso do partido, que será realizado no próximo ano, bem como o centenário que se comemora em 2022 e a Conferência Nacional de Emancipação da Mulher como momentos fundamentais para fortalecer o projeto de 2022 que, no entanto, precisa ser trabalhado desde já.
Para dar conta desses desafios, o dirigente apontou a necessidade imediata de que os comitês estaduais e municipais possam fazer seus balanços dessas eleições, apontando as perspectivas para o próximo período, e acentuar a utilização do programa partidário. Também enfatizou a importância de pautarem a discussão sobre a participação dos comunistas nos mandatos que tomam posse em janeiro. “Devemos estabelecer um debate franco, aberto e que nos permita coesionar o partido”, disse Fábio.
Contexto
A presidenta nacional do PCdoB, Luciana Santos, fez uma intervenção que trouxe para os integrantes da comissão os principais aspectos discutidos na mais recente reunião do Comitê Central, realizada no dia 11 de dezembro. Ela destacou que a pandemia paralisou as atividades econômicas e atingiu bilhões de pessoas no mundo, com impactos difíceis de serem medidos. A Covid-19 trouxe novos e graves elementos para um mundo que já estava em ebulição e que já vivia sob fortes mudanças tecnológicas e no mundo do trabalho, aprofundando desigualdades.
Luciana afirmou, ainda, que “a pandemia deixou muito evidentes as desigualdades sociais e econômicas”, citando a corrida pela descoberta da vacina. Ela avalia que o outro lado da moeda da busca pelo imunizante “revela a perversidade do modelo capitalista que permite que os países ricos vacinem suas populações enquanto os países em desenvolvimento ficam no fim da fila”. A dirigente salientou também que a disputa da geopolítica se dá predominantemente pela guerra tecnológica e da ciência e, neste sentido, o momento evidencia o importante papel da China socialista, que investiu bilhões na vacina e a caracterizou como um bem público mundial.
Plano nacional
Ao trazer o debate para o cenário nacional, Luciana Santos destacou que 2020 deixará marcas profundas em nossa população, citando o trauma trazido pelas quase 200 mil mortes pela Covid-19 até o momento e os impactos econômicos, como o desemprego, que atinge cerca de 14 milhões de pessoas. “A conjunção de pandemia com Bolsonaro colocou o Brasil à deriva”, declarou, enfatizando que o número de óbitos não pode ser tratado com a frieza e a displicência do presidente. “Bolsonaro tem uma atitude genocida, é como um ‘cavaleiro do apocalipse’”, cujo objetivo não é governar, “mas dar continuidade ao seu projeto de poder”
Por isso, Luciana destacou a importância da frente ampla em defesa da vida e da democracia que se caracteriza pela vacinação já, que o PCdoB tem defendido como central para este momento. “A frente impôs derrotas a Bolsonaro, em seus métodos, e ele teve de se readaptar dentro de sua marcha autoritária”. E apontou que sob Bolsonaro, “o país está desgovernado, sem um plano para enfrentar a pandemia e retomar a atividade econômica”.
A dirigente lembrou que em breve mais de 66 milhões de pessoas deixarão de ter acesso ao auxílio emergencial, situação que trará forte impacto social e econômico. Ela também criticou a falta de política de testagem e de um plano efetivo de vacinação. “E o ministro da Saúde ainda pergunta o porquê de tanta ansiedade…”, disse, indignada.
Luciana colocou que a manutenção do desemprego, a piora nos índices de pobreza e desigualdade são problemas que se entrelaçam com as questões de gênero e raça e que estarão presentes nos próximos anos, influenciando nos rumos do país.
Eleições 2020
Analisando as eleições deste ano, que ainda demandam debate mais aprofundado nos níveis estadual e municipal, Luciana Santos destacou aspectos marcantes que fizeram deste um dos pleitos mais atípicos da história, sem o corpo a corpo e com muitas restrições devido à pandemia, e marcado também pelo poder das máquinas — como as igrejas evangélicas e as milícias —, pelas fake news e pelo alto índice de abstenção.
Mesmo neste cenário tão adverso, a presidenta avalia que “a política de frente ampla que produzimos derrotou a política do extremismo, sobretudo nos grandes centros. Prevaleceu a política e a questão democrática foi vitoriosa, mas claro: tivemos vitória do centro e centro-direita”. Luciana enfatizou ainda que “Bolsonaro perdeu, mas está vivo e tem forte poder de cooptação. O bolsonarismo dialoga com ideias profundas da sociedade brasileira, mas seu futuro vai depender também de como vai enfrentar a crise”. Ela avalia que cresceu o campo político identificado com o liberalismo na economia, mas que não se identifica com o perfil bolsonarista mais extremado.
Luciana apontou que o campo da esquerda e centro-esquerda perdeu votos nas prefeituras e câmaras, em boa medida resultante da polarização dos últimos anos. Mas, destacou que “cumprimos o nosso papel de ‘reencantar’ a política, de gerar empolgação com política”. Ela destacou que estes foram aspectos marcantes na campanha de Manuela d’Ávila em Porto Alegre. “Ela foi para o segundo turno numa cidade que deu mais de 60% dos votos para Bolsonaro em 2018”, lembrou. Luciana apontou Manuela e o governador Flávio Dino como “caras novas” e com força que o partido tem para “reforçar o que somos, a nossa identidade” em nível nacional.
Ao falar sobre as dificuldades advindas do fim das coligações e da cláusula de barreira, que impõem dificuldades ao partido, Luciana enfatizou: “O PCdoB é um patrimônio do povo brasileiro. A exclusão de nossa corrente de pensamento seria extremamente negativa no cenário político nacional”. Ela defendeu a necessidade de analisar a fundo a perda de voto nos últimos anos e a necessidade de corrigir rumos. Para ela, é preciso tirar lições para “a superação da cláusula autoritária, feita justamente para atingir partidos ideológicos, como o nosso”, um elemento “perverso com a democracia”. E disse que o anticomunismo não é novo, mas recrudesce em momentos de crise como agora.
“Precisamos ter mais capacidade de diagnosticar e, para além do diagnóstico, temos que ver as causas e tomar medidas”, apontou. Ela citou como positivo o Movimento 65 e o Comuns, bem como o chamamento aos democratas feito pelas candidaturas comunistas para as plataformas das cidades, mas colocou, ao mesmo tempo, a dificuldade que muitas vezes houve de “tirar essas ações do papel”. Luciana defendeu ainda que é preciso manter o esforço de atrair aliados que tenham pensamento comum com o do partido, que sejam democratas, progressistas. A dirigente avaliou que “nossas candidaturas deram seu recado e politizaram as disputas”, mas os resultados ficaram aquém do necessário.
“Não podemos não fazer nada”
De acordo com a presidenta, “precisamos encarar a luta institucional como vital para nossas ideias, para a construção do socialismo”. Ela colocou ainda que “o Partido Comunista não morrerá enquanto houver injustiça social”, e concluiu que o partido precisa incidir ainda mais na política real e cotidiana.
“Não podemos não fazer nada”, disse, e colocou como central a avaliação sobre qual é o lugar político do PCdoB. Ela lembrou que um Grupo de Trabalho foi criado no âmbito do Comitê Central para avaliar as possibilidades de enfrentamento das dificuldades impostas pela nova realidade política. “O que não nos falta é militância aguerrida. Vamos construir saídas com coesão, com a espinha ereta e o coração tranquilo para seguir adiante”, concluiu.
Manifestação dos estaduais
A reunião foi seguida por manifestações dos dirigentes estaduais, que iniciaram um processo de avaliação das eleições, da atual conjuntura e das formas de enfrentamento dos desafios impostos pela cláusula de barreira e pelo fim das coligações. O debate será aprofundado nos níveis estadual e municipal a partir do balanço das eleições 2020 a fim de construir uma resposta coesa e que reflita as necessidades do partido.
Fizeram o uso da palavra os dirigentes estaduais Euler Ivo (GO), Edival Goes (SE), Claudio Machado (ES), José Carlos Rufino (PI), Divanilton Pereira (RN), Juliano Roso (RS), Douglas Matos (SC), Terezinha Braga (CE), Lucia Antony (AM), Milton Barbosa (BA), Eduardo Farias (AC), Lucia Rincon (GO), Geraldo Galindo (BA), João Batista Lemos (RJ) e Ronald Freitas (SP), ambos do Comitê Central.
A reunião foi encerrada pelo vice-presidente nacional do PCdoB, Walter Sorrentino, que corroborou a apresentação feita pela presidenta Luciana Santos e acrescentou que o partido está diante de um “enorme desafio”, que “a luta de classes se desenvolve e muda” e que “precisamos estar sempre prontos para atualizar nossas linhas e posicionamentos”.
Ele agregou que “devemos valorizar o que alcançamos”, mesmo que tenha ficado aquém do necessário. “Manuela se transformou numa gigante nacional pelo seu compromisso com o partido”, colocou.
Walter apontou ainda que o centro da luta interna do partido é superar a cláusula de barreira. E destacou também o desafio de achar saídas políticas para a superação da crise nacional, marcada pela pandemia e pelo bolsonarismo. “Temos que falar com o povo, na linguagem do povo”, disse. Recordando episódios como o da Chacina da Lapa e a luta contra a ditadura, Walter colocou que “cada momento histórico tem seus desafios. O que é semelhante é a coragem política de enfrentá-los”.
Por Priscila Lobregatte
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