Com queda na renda e inflação, endividamento das famílias é recorde
Com a renda arrochada e o desemprego atingindo vários membros das famílias, o endividamento dos brasileiros com o sistema financeiro chegou a 58,5% em abril, um recorde histórico, segundo dados do Banco Central, divulgados na quarta-feira (28). É o maior porcentual da série histórica, iniciada em janeiro de 2005.
O banco considera endividados os que têm dívidas em atraso por mais de 90 dias. Os números foram divulgados no mesmo dia em que o Santander deu início à divulgação do balanço dos bancos do segundo trimestre deste ano. O banco espanhol teve um lucro líquido no Brasil de mais de 100% em relação ao primeiro trimestre de 2020. Um lucro histórico para o banco, em plena pandemia da Covid-19, quando a indústria, o comércio varejista e o setor de serviços ainda patinam para recuperar as perdas de uma já sofrível crise econômica agravada pela crise sanitária.
Segundo o chefe do Departamento de Estatísticas do BC, Fernando Rocha, “o crescimento do endividamento das famílias mostra que o saldo de crédito para pessoas físicas tem avançado em um ritmo maior que o da renda dos trabalhadores”.
Com boa parte da renda comprometida com as parcelas dos empréstimos junto ao sistema financeiro, o brasileiro ainda enfrenta uma carestia sem tamanho, nos alimentos, no gás de cozinha, nos combustíveis, no aluguel, na conta de luz… E cada vez se enrosca mais com os bancos que cobram juros extorsivos. Enquanto o crédito para empresas, que amargaram sérios prejuízos na pandemia e ficaram sem apoio do governo, desacelera, o crédito pessoal segue alto.
Os bancos se aproveitam do crédito consignado, com retorno garantido, já que é descontado na fonte, no salário do trabalhador, para quitar as dívidas como os próprios bancos.
Segundo Claudio Fonseca, que usou o crédito consignado da Caixa para quitar uma dívida com o Bradesco, “continuei devendo e não pude usar o recurso pra qualquer outra gasto que minha família precisa, como remédios“, disse o aposentado no alto de seus 74 anos, que vive de aluguel e dependendo da ajuda dos filhos.
De acordo com o BC, o crescimento do crédito consignado de maio para junho foi de 1,5%. Em 12 meses, o estoque do consignado teve alta de 19,2%. “O consignado representa 36% do crédito livre para pessoas físicas e tem apresentado crescimento nos saldos de todas as modalidades, seja para aposentados, servidores públicos e trabalhadores da iniciativa privada”, disse o chefe do Departamento de Estatísticas do BC.
Já o saldo do crédito pessoal não consignado cresceu 2,7% em junho e acumula alta de 26,3% em 12 meses. “Nesse caso, as taxas de juros são bem mais elevadas, devido ao menor nível de garantia quando comparado ao crédito consignado”, ressaltou Rocha.
Os juros do crédito pessoal consignado estão em 18,7% ao ano e do crédito pessoal não-consignado em 82,4% ao ano, segundo o BC. Tudo isso com aval do governo Bolsonaro, que na contramão do mundo, elevou o Brasil ao segundo lugar entre os países com as maiores taxas de juros reais do mundo.
Os juros do cheque especial subiram de 122,9% em maio para 125,6% em julho ao ano. O juro médio do cartão de crédito, que segundo a Confederação Nacional do Comércio é a modalidade de maior endividamento das famílias brasileiras (80%) atingiu o absurdo 327,5% ao ano em junho. Muitas famílias têm constantemente recorrido ao cartão de crédito para pagar as contas básicas, como luz e água, e só.
É significativo que o Comércio Varejista reclame a queda nas vendas em segmentos como vestuário, calçados, entre outros, e o setor de Serviços continua patinando. Se já não há dinheiro para comida…
O cálculo do BC leva em conta o total das dívidas bancárias dividido pela renda das famílias no período de 12 meses. Como incorpora dados da Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar (Pnad) contínua e da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), ambas do IBGE, o percentual possui certa defasagem. Por isso, o resultado divulgado é de abril.