Presidente revela o Brasil paralelo em que vive, onde não há fome, nem desemprego, e ele fez tudo que era necessário para ajudar na crise sanitária.

O presidente Jair Bolsonaro admitiu que, provavelmente, foi o único chefe de Estado que adotou estratégia diferenciada de combate à pandemia, ao questionar o isolamento social e seus efeitos para a economia do país. Ele tenta desassociar seu governo da crise econômica, culpando a pandemia.

A afirmação foi feita no Rio de Janeiro, quando o presidente estava em um almoço com participantes do Congresso Mercado Global de Carbono – Descarbonização & Investimentos Verdes.

“Talvez o único chefe do Estado do mundo que não aceitou o ‘fica em casa porque a economia a gente vê depois’ tenha sido eu. Lamentavelmente, a condução da pandemia foi retirada da minha mesa presidencial”. Bolsonaro é criticado por sanitaristas de todo o mundo pela condução negacionista da pandemia, e responsabilizado por grande parte dos 665 mil óbitos registrados no país.

Desde o início da pandemia, o presidente estimula a desinformação e ataca os cientistas que alertavam para a necessidade de controle da circulação do vírus para evitar as mortes. Bolsonaro dificultou o trabalho dos ministros da Saúde, trocando-os quatro vezes durante a maior crise sanitária vivida pelo país.

As declarações desta quinta revelam que Bolsonaro vive num Brasil paralelo, em que mais de meio milhão de perdas humanas não importam. Mas também num Brasil em que ele fez tudo que era preciso para cuidar da condição econômica dos mais pobres.

“O Brasil fez sua parte, colaborando com estados e municípios, e mais: com os mais humildes que, quando obrigados a ficar em casa, perderam toda sua renda”, disse ele ao afirmar que, graças a essa “acolhida” dada pelo governo não houve “nenhum problema social no Brasil”.

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, instalada no Senado, comprovou o trabalho sistemático de Bolsonaro para dificultar o controle da pandemia por governadores e prefeitos. Assim como o Congresso resistiu às tentativas de Paulo Guedes, o ministro da Economia, de impedir que um auxílio emergencial fosse aprovado pelos parlamentares para amenizar o impacto do lockdown sobre os mais pobres.

No mundo paralelo do bolsonarismo, o Brasil voltou a normalidade com ampla retomada da economia, enquanto o resto do mundo passa fome. O presidente nunca menciona as frequentes imagens de brasileiros disputando ossos em lixeiras de açougue ou atacando caminhões de lixo para procurar comida. Ele só resolveu garantir aumento para o Auxílio Brasil neste ano eleitoral, quando começou a sofrer muita rejeição nas intenções de voto.

Bolsonaro presidente reiterou que, enquanto o país volta à normalidade, em muitos países nota-se a possibilidade de desabastecimento. “Com certeza a preocupação de todo chefe de Estado é a segurança alimentar, e, nesse momento, todos voltam os olhos ao Brasil, uma potência agrícola que não parou”, acrescentou ao lembrar que uma em cada cinco pessoas no mundo é alimentada pela produção brasileira.

Parte da crítica a seu governo é que n˜ao há nenhuma medida que sirva de colchão de contenção à excessiva exportação de commodities agrícolas, mesmo durante os piores momentos da pandemia. Vários governos garantiram abastecimento interno de alimentos, antes de exportar sua produção. Com isso, alimentos sofreram aumentos sucessivos nos preços, alcançando os piores índices inflacionários em décadas.

Por Cezar Xavier