Hua Chunying, porta-voz da chancelaria chinesa, acusou os EUA de tentarem “chantagear” e “intimidar” Pequim

Em resposta à inesperada tuitada de Trump, anunciando nova tarifa de 10% sobre US$ 300 bilhões em importações da China e rompendo a trégua acertada em Osaka em junho, a China anunciou que terá que tomar as “contramedidas necessárias” para defender seus interesses legítimos e repetiu que “não quer a guerra comercial, mas não a teme”. A nova sobretaxa passará a vigorar no dia 1º de setembro.

Na ONU, o novo embaixador chinês, Zhang Jun, considerou a escalada tarifária de Trump como “um ato irracional e irresponsável” e advertiu que a posição da China “é muito clara – se os EUA quiserem conversar, então vamos conversar, se querem lutar, então vamos lutar”. “Decididamente, a China tomará as medidas necessárias para proteger nossos direitos fundamentais”, afirmou.

Zhang instou, ainda, Washington a voltar “ao caminho correto para que se possa encontrar a solução correta”, com base no respeito mútuo e igualdade. A decisão de Trump significa que essencialmente todas as importações desde a China estarão, a partir dessa data, sujeitas a sobretaxas, numa escalada significativa, já que, além dos produtos industriais visados até então, vai ser atingida uma ampla gama de produtos de consumo até então isentos, como smartphones, brinquedos e roupas.

Também o Ministério do Comércio chinês advertiu que os EUA terão que arcar “com as consequências”, se insistirem nesse caminho. O comunicado alertou, ainda, que a postura dos EUA iria pressionar a economia mundial no sentido de uma “recessão”. As novas tarifas vão se somar às que já são aplicadas por Washington de 25% sobre US$ 250 bilhões em importações da China e, reciprocamente, por esta sobre US$ 110 bilhões em exportações dos EUA.

Hua Chunying, porta-voz da chancelaria chinesa, que acusou os EUA de tentarem “chantagear” e “intimidar” Pequim, assinalou também que seu país “não negociará sob pressão” e exigiu “respeito mútuo” para que as negociações cheguem a bom porto.

A tuitada de Trump foi no dia seguinte da primeira rodada de negociações China-EUA pós-Osaka, considerada na véspera, por ambas as partes, “construtiva”.

Numa de suas tuitadas seguintes sobre a questão, Trump asseverou que o acordo não pode ser “igual” mas “melhor” [para os EUA], e que a moeda chinesa, o yuan, “vai para o inferno”.

ESTRATÉGIA FALIDA

Não foi apenas em Pequim que a fúria tarifária de Trump causou contrariedade. Mudou o humor de Wall Street, com quedas nos principais índices da especulação. Entre essas, as ações da Boeing, o que se explica: está no meio de negociações com companhias aéreas chinesas para concretizar – ou não – uma encomenda massiva.

“Estamos decepcionados com o fato de o governo estar dobrando uma estratégia tarifária falida que já está desacelerando o crescimento econômico dos EUA, criando incerteza e desencorajando investimentos”, afirmou David French, vice-presidente sênior de relações governamentais da Federação Nacional de Varejo. Ele ressaltou que “as tarifas impostas no ano passado não funcionaram, e não há evidências de que outro aumento de impostos sobre empresas e consumidores americanos trará novos resultados”.

Até aqui, o aumento das tarifas de Trump estava direcionado para produtos industriais, e vinha isentando os bens de consumo correntes, de modo que a economia norte-americana, sustentada no consumo das famílias, seguia relativamente protegida da guerra comercial, o que já não é o caso.

O vice-presidente executivo da Câmara de Comércio dos EUA, e responsável pelos ‘assuntos internacionais’, Myron Brilliant, alertou que o aumento de tarifas “infligirá maior sofrimento às empresas norte-americanas, aos agricultores, trabalhadores e consumidores, e prejudicará uma economia forte nos EUA”.

A entidade está pedindo aos dois lados “que se comprometam a alcançar progresso em curto prazo antes que essas novas tarifas entrem em vigor e em remover todas as tarifas remanescentes o mais rápido possível”.

“DESGASTE”

Craig Allen, presidente do Conselho Empresarial EUA-China, manifestou a preocupação de que as novas tarifas adicionais de Trump “desgastem ainda mais nossa reputação como fornecedores confiáveis” e tragam mais dor para “nossos agricultores, trabalhadores e consumidores”. Ele disse, ainda, temer que a investida “afaste os chineses das negociações”.

Comunicado da Associação de Vestuário e Calçados registrou que “adicionar esses custos adicionais para as famílias americanas trabalhadoras é realmente chocante” e conclamou o Congresso a usar sua autoridade em relação às políticas comerciais dos EUA.

O presidente da entidade, Rick Helfenbein, classificou de “extremamente preocupante” que a tuitada houvesse sido cometida imediatamente após a primeira reunião com a delegação chinesa depois da retomada das negociações.

Reprovação, ainda, do Conselho da Indústria da Tecnologia da Informação, cujo presidente, Jason Oxman, pediu a Trump e sua equipe que redirecionem seu foco para “fechar um acordo de longo prazo sem usar as carteiras dos americanos como alavancagem”.

Ele apontou que as tarifas já em vigor custaram aos consumidores, trabalhadores e empresas de todos os tamanhos dos EUA mais de US$ 30 bilhões, “dano que seria exacerbado por esse aumento tarifário sem precedentes”.

A mídia da China desancou Trump e suas tuitadas com vontade. “Tarifas não vão ajudar os EUA a vender 1 kg a mais de soja”, afirmou em editorial o Global Times, publicado em língua inglesa e usado por Pequim como megafone. O editorial também fez menção a um velho provérbio chinês: “coma lentamente o tofu quente”.

Acrescenta o jornal que “tentativas de intimidar a China com tarifas são fúteis. Quanto mais tarifas sobre a China, mais dor os EUA sofrerão. Isso não pode ser encoberto por mentiras dos EUA contra as leis básicas da economia”. As ações dos EUA despencaram depois que as novas tarifas foram anunciadas.