Merkel, Macron, Xi Jinping, Charles Michel e Ursula von der Leyen selaram o Acordo bilateral

A União Europeia e a China anunciaram acordo bilateral de investimento (CAI) que o jornal chinês Global Times chamou de “presente de Ano Novo para o mundo”, pouco antes de o difícil ano de 2020 ter fim, na tarde de quarta-feira (30).

Presentes à cerimônia virtual, nesses tempos de pandemia, o presidente chinês Xi Jinping, a primeira-ministra alemã, Angela Merkel, o presidente francês Emmanuel Macron, a presidente da Comissão Europeia (o órgão executivo da UE), Ursula von der Leyen, e o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel.

“O mundo pós-Covid de amanhã necessita de uma forte relação UE-China, para construir melhor em frente”, afirmou von der Leyen. Horas depois do anúncio, o regime Trump respondeu, retaliando alemães e franceses com aumentos de tarifas.

Em discussão há sete anos, o novo acordo europeu-chinês já passou por 35 rodadas de negociação. O presidente Xi destacou o papel do acordo na recuperação econômica mundial pós-pandemia e na afirmação da cooperação econômica, de acordo com a agência de notícias Xinhua.

Em novembro, a China mais 14 outros países da Ásia-Pacífico haviam assinado a Parceria Econômica Integral Regional (RCEP, na sigla em inglês), negociada a partir da Asean, Associação de países do sudeste asiático, e que inclui também Japão, Coreia do Sul e Austrália.

Em termos gerais, o acordo CAI enfatiza a intenção da UE e da China de continuarem aprofundando suas relações econômicas, ao garantir a cada parte mais acesso para investimentos na economia do outro. Isso em um momento em que os EUA apostaram em tentar criar um cordão de isolamento em relação à China, particularmente na alta tecnologia.

O jornal francês Le Monde reivindicou para Merkel boa parte do mérito pelo fechamento do acordo, observando que a “janela” era “muito pequena”, com a Alemanha encerrando sua presidência rotativa da UE em 31 de dezembro.

“Pela primeira vez, foi ela [Merkel] quem empurrou seus parceiros europeus, para que o acordo fosse concluído a tempo”. A oportunidade era única, acrescentou o jornal: “a Presidência alemã, por um lado, deu-lhe o ímpeto e a autoridade necessários; a transição do poder em Washington, por outro lado, deu-lhe margem de manobra que provavelmente seria reduzida à instalação no poder de Joe Biden em 20 de janeiro de 2021”.

“Tudo isso em um ano em que a pandemia de Covid-19 aumentou a percepção na Alemanha da necessidade urgente de fortalecer a ‘soberania’ europeia, particularmente em saúde e tecnologia, no contexto do confronto Pequim-Washington”. Coincidentemente, este mês a Alemanha também driblou a pressão de Trump para que fosse vetado o 5G da Huawei.

Além do esperneio desde Washington, também a mídia pró-EUA reclamou do acordo, sob a cínica alegação de que não teria garantido “direitos humanos” a islâmicos na China – os mesmos islâmicos que Washington gosta de ver pelas costas na hora de imigrar, não cansa de bombardear desde o Iraque até o Paquistão e Afeganistão, passando pela Síria, Líbia, Iêmen e Somália, ou faz passar fome sob sanções desumanas, caso do Irã.

Há os que, ainda, lamentam que Berlim e Paris não hajam esperado pelas novas ordens de Biden, cuja posse será no dia 20, e que promete reconstruir a submissão no esgarçado modelo anterior.

O acordo ainda terá que ser ratificado pelo Parlamento Europeu, mas com a bênção alemã e francesa, assim como das presidências da Comissão Europeia e do Conselho Europeu, não se esperam obstáculos intransponíveis à aprovação.

NOVA ROTA

Como registrou o analista Andrew Korybko, os termos relatados do acordo são “um marco” nas relações econômicas da Eurásia, uma vez que permitirão que cada parte liberte mais plenamente o potencial uma da outra e reforçará a iniciativa chinesa Cinturão e Estrada (BRI), mais conhecida como Nova Rota da Seda.

Ainda, registra Korybko, representa a implementação do novo paradigma de desenvolvimento de dupla circulação, uma vez que os investimentos europeus na China promoverão “tanto a circulação doméstica quanto internacional”.

Para ele, o pacto de investimento serve como a “âncora ocidental da conectividade transeurasiana leste-oeste e permitirá que os dois cantos do supercontinente se aproximem um do outro, melhorando assim naturalmente a integração com todos os países entre eles com o tempo”.

Em paralelo, segue a implementação de outros braços do BRI, como a ligação via Rússia e a pela Ásia Central. Ao mesmo tempo, a China, como já funciona para europeus e norte-americanos, reforçou sua legislação de proteção de setores estratégicos e ligados à segurança nacional.

A China se tornou o maior parceiro comercial da União Europeia, em detrimento dos Estados Unidos, segundo o órgão de estatística da EU, a Eurostat. O comércio entre os 27 e a China atingiu os 425,5 bilhões de euros nos primeiros 9 meses de 2020, contra 412,5 bilhões de euros entre a UE e os Estados Unidos. Foram, respectivamente, 413,4 bilhões e 461 bilhões de euros no mesmo período de 2019. Variação devido ao aumento das importações chinesas (+ 4,5%), enquanto as exportações da UE para a China permaneceram inalteradas (144,8 bilhões de euros).

A União Europeia já era o maior parceiro comercial da China desde 2004, mas esta é a primeira vez que o inverso também é verdadeiro. No entanto, a UE tem superávit no comércio com os EUA e déficit com a China.

Na Europa, o principal parceiro comercial da China é a Alemanha, o que explica o empenho de Merkel, prestes a deixar a condução do governo de Berlim. Em 2019, o volume de comércio entre os dois países foi de 206 bilhões de euros: 96 bilhões de euros foram exportados por empresas alemãs para a China, que vendeu 110 bilhões de euros de mercadorias à Alemanha.

De acordo com o Le Monde, essas transações, que representam cerca de um terço do volume total negociado entre a China e a União Europeia, são realizadas em indústrias vitais para o “made in Germany”: maquinário, automotivo, engenharia elétrica e química, cujas empresas se tornaram extremamente dependentes do mercado chinês.