Multidão celebra em Wuhan a virada do ano.

Ao se tornar o único grande país a crescer em 2020, em 2,3%, a China demonstrou que não é preciso optar, nos tempos de pandemia, entre proteger a saúde ou salvar a economia, como clamam círculos negacionistas, e que, ao contrário, quando se age de forma coordenada, solidária e com base na ciência, como fez Pequim, não apenas o coronavírus pode ser contido, como é o caminho mais curto para a retomada econômica. Números divulgados no domingo pelo Bureau Nacional de Estatísticas (NBS) detalharam como a China alcançou a recuperação em “V” – almejada por outros, mas não alcançada.

Assim, em que pese os dias dramáticos vividos no início do ano passado, com as rígidas medidas sanitárias e econômicas tomadas logrando conter a pandemia em Wuhan e no resto do país, a economia chinesa encerrou 2020 em bases sólidas, atingindo um PIB de 101,6 trilhões de yuans, o que corresponde a US$ 15,7 trilhões, ou seja, 17% do PIB global (na comparação por paridade de poder de compra, a proporção é maior).

“A segunda maior economia do mundo surpreendeu o mundo com uma recuperação em forma de V e se tornou uma grande força motriz da recuperação econômica global”, disse Sheng Laiyun, vice-chefe do NBS.

Erradicação da pobreza

Dois dados expressam o alcance dessa conquista obtida sob condições tão desfavoráveis. 11,86 milhões de novos empregos urbanos foram criados em 2020, enquanto a taxa de desemprego urbano ficou no patamar de 5,2% ao final do ano. A China completou a tarefa que se propusera de zerar a pobreza absoluta no país, retirando dessa condição 5,5 milhões de pessoas que restavam.

E sem carestia: o índice de preços ao consumidor (IPC) da China, principal indicador da inflação, subiu 2,5% em relação ao ano anterior em 2020. O índice de preços ao produtor (IPP), que mede o custo dos produtos na porta da fábrica, caiu 1,8%.

A política da dupla circulação, com o aspecto central focado em fortalecer o mercado interno, e sem descurar os laços econômicos mutuamente vantajosos com os demais países, se fortaleceu, com o setor terciário respondendo por 54,5% do PIB.

Sem sobressaltos nas contas externas. As reservas cambiais da China aumentaram para US$ 3,2 trilhões no final de 2020. A taxa de câmbio média do yuan em relação ao dólar ficou em 6,8974, valorizando 0,02% em relação ao ano anterior.

As importações e exportações totais de bens da China aumentaram 1,9% ano a ano, para 32,16 trilhões de yuans em 2020. Por sua vez, o investimento estrangeiro direto no continente chinês, cresceu 6,2% ano a ano, para cerca de um trilhão de yuans em 2020.

Como enfatizou Sheng, a conquista da China ajudou a estabilizar a cadeia de abastecimento global à medida que o país fortalecia a cooperação internacional em vez de usar a pandemia para tirar vantagem às custas de outros. “Em meio à mudança da situação global, a porta da China para o exterior não apenas permaneceu aberta, mas se abriu ainda mais”, acrescentou.

Em 2020, a China se juntou a outras 14 economias na assinatura da Parceria Econômica Global Regional, o maior bloco de livre comércio do mundo, e concluiu negociações para um acordo de investimento bilateral com a União Europeia. A China se tornou ainda o maior parceiro comercial da UE em 2020, com o volume do comércio bilateral alcançando US$ 649,5 bilhões.

“Com a vida e a produção em muitos países afetados pela Covid-19, a China, cujo trabalho e produção foram retomados, desempenhou um papel insubstituível na produção e transporte globais”, disse Bai Ming, vice-diretor do Instituto de Pesquisa de Mercado Internacional do Ministério do Comércio .

A China também atuou para fortalecer a cooperação internacional no combate à Covid-19, com exportações de 224,2 bilhões de máscaras de proteção de março a dezembro do ano passado, ao mesmo tempo em que duas vacinas desenvolvidas no país (Coronavac e Sinovac) se tornaram uma arma eficaz contra a pandemia, através de acordos de fornecimento e de produção com muitos países.

A China manteve em 2020 sua posição como o maior país manufatureiro do mundo pelo 11º ano consecutivo, com o valor agregado industrial alcançando 31,3 trilhões de yuans (US$ 4,84 trilhões), de acordo com o Ministério da Indústria e Tecnologia da Informação. A indústria de manufatura da China representa quase 30 por cento da indústria de manufatura global.

Avanços também na questão ambiental: das 337 cidades monitoradas, 59,9% tiveram a qualidade do ar dentro dos padrões. Na agricultura, o destaque é a produção quase 670 milhões de toneladas de grãos em 2020, um aumento de 5,65 milhões de toneladas, ou 0,9%, em relação ao ano anterior.

As despesas com pesquisa e desenvolvimento aumentaram 10,3%, para mais de 2,44 trilhões de yuans, representando 2,4% do PIB. O número de lançamentos espaciais bem-sucedidos chegou a 35, incluindo a sonda Chang’e-5 da China, que trouxe amostras lunares, e a primeira missão chinesa a Marte.

No G5, a China instalou 718.000 estações-base, o que corresponde a 70% do total mundial. Durante o período do 13º Plano Quinquenal (2016-2020), a taxa média de crescimento do valor adicionado da indústria de manufatura de alta tecnologia atingiu 10,4 %, o que foi 4,9 pontos percentuais superior à taxa média de crescimento do valor adicionado industrial, disse Xiao Yaqing, ministro da Indústria e Tecnologia da Informação em entrevista coletiva. A produção de robôs industriais na China cresceu 19,1% ano sobre ano, para 237,068 unidades, em 2020.

Liu Chunsheng, professor associado de comércio internacional da Universidade Central de Finanças e Economia, disse que a recuperação econômica da China deve continuar a impulsionar a economia mundial, já que o vasto mercado do país injeta mais ímpeto para o aumento da demanda global, enquanto seu sistema de abastecimento abrangente facilita a restauração da produção global.

Alta tecnologia

Os números acima são um alento para que as sessões anuais do Congresso Nacional do Povo e do Comitê Nacional da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, que estarão reunidas esta semana, avancem nos planos da China de, até 2025, chegar à autossuficiência na indústria de alta tecnologia, especialmente nos semicondutores e outros gargalos identificados.

Atualmente, a China importa cerca de 90 por cento dos chips usados no país, no valor de US$ 300 bilhões, mas a China pretende reverter isso com 70% do fornecimento de chips provenientes de fabricantes nacionais até 2025. “Meta muito ambiciosa que exigirá investimento maciço em muitas áreas”, disse Xiang Ligang, diretor-geral da Aliança de Consumo de Informação. Ele relatou ao jornal Global Times que o investimento da China no desenvolvimento de chips quadruplicou em um ano, para 140 bilhões de yuans.

Para o fundador do ChinaLabs, centro de estudos de tecnologia de Pequim, Fang Xindong, “estas são áreas que não podemos encontrar alternativas, se os EUA decidirem cortar o fornecimento. São as tecnologias centrais mais importantes que temos de dominar”.

Apesar de considerar “improvável” uma separação total entre as duas maiores economias do mundo, ele enfatizou que a China precisa ter essa capacidade “para que os EUA não tomem medidas tão extremas”.