“Acreditamos que a forte queda nos casos é fruto da vacinação", diz o infectologista Ignacio Silva

O Chile começa a colher os frutos da sua campanha de vacinação contra a Covid-19, registrando nesta quarta-feira (28) uma queda vertiginosa nas infecções pelo vírus: o menor número de casos diários desde outubro do ano passado.

O resultado veio poucos dias depois do país andino registrar a menor taxa de positividade nos testes de coronavírus realizados diariamente desde o início da pandemia e foi entusiasticamente comemorado pela comunidade científica.

“Acreditamos, hoje, que essa forte queda nos casos é fruto praticamente exclusivo da vacinação, porque isso não veio acompanhado de maiores restrições, mas sim do contrário. As restrições foram caindo, a vacinação foi aumentando e os casos foram diminuindo”, declarou Ignacio Silva, médico infectologista e pesquisador da Universidade de Santiago do Chile.

A principal vacina utilizada pelo país é a da Sinovac (assim como a CoronaVac, é um produto chinês) e mais de 63% dos chilenos foram vacinados completamente (com duas doses) e mais de 72% já receberam uma dose do imunizante, conforme dados oficiais.

“A vacinação não foi centralizada em grandes centros médicos nem foi feita exclusivamente por meio das autoridades sanitárias. Foram distribuídas vacinas em ginásios, colégios e pequenos municípios. As comunidades se encarregaram da distribuição e administração das vacinas. Isso fez com que elas estivessem ao maior alcance das pessoas”, explicou Silva.

Entre os vacinados, a maior parte recebeu o imunizante chinês – pesquisadores estimam que pelo menos 75% das injeções foram feitas com esta vacina. As vacinas da Pfizer, da AstraZeneca e de dose única da Cansino também são utilizadas, mas em menor escala.

No Brasil, a CoronaVac, envasada no Instituto Butantan a partir de insumos vindos da China já foi desqualificada por Jair Bolsonaro, que chegou a mentir dizendo que ela não teria comprovação científica.

Para Gabriel Cavada, epidemiologista da Universidade do Chile, “o desprestígio da eficácia que têm uma ou outra vacina, a meu ver, é um problema político e que não tem nenhuma sustentação científica”.

Um estudo publicado em julho no New England Journal of Medicine mostrou que a Sinovac teve 86% de eficácia na prevenção de mortes causadas pela covid-19 no Chile. A eficácia encontrada para a prevenção da infecção pelo vírus foi de 65,9%.

“Na prática, com o exemplo do Chile, vemos que, mesmo vacinando massivamente com a Sinovac, conseguimos diminuir o número de casos. Isso significa que, a nível comunitário, vacina ajuda a diminuir a circulação viral”, relatou o infectologista Silva.

Entre março e junho deste ano, o Chile viveu uma explosão de contágios que, alavancada pela variante gamma, marcou o pior momento da pandemia no país. O quadro acabou sendo manipulado por negacionistas para, mesmo sem qualquer sustentação científica, colocar em xeque os resultados da vacinação com a CoronaVac.

O coordenador de dados da Rede Análise Covid-19, Isaac Schrarstzhaupt, alertou à época que a campanha de vacinação ainda era incipiente no país para se traçar um quadro. No início de maio, pouco mais de 35% dos chilenos estavam completamente vacinados, percentual que chegou a 50% em meados de junho. “Houve um aumento na mobilidade lá no começo da imunização. Eles estavam com 20%, 30% de vacinados, e estava aumentando muito a mobilidade. Isso deixa ainda boa parte da população descoberta e acaba gerando mais hospitalizações e óbitos”, explicou.

Foi somente em meados de junho que os indicadores da pandemia começaram a dar sinais de melhora, e a média móvel de casos confirmados diariamente voltou agora a patamares semelhantes aos de novembro do ano passado, com o registro de cerca de mil novos casos por dia.

“O que a gente vê nas vacinas é muito mais essa redução de curva de hospitalizações e óbitos. Além de acelerar a vacinação, essas restrições que o Chile fez também são muito responsáveis pela queda de casos que estamos vendo agora”, acrescentou Schrarstzhaupt.

Para Cavada, o anúncio de um ‘Pase de Movilidad’ (Passe de Mobilidade), criado em maio deste ano pelo governo para permitir maior facilidade no deslocamento daqueles que já estão completamente vacinados pelo país, também incentivou os chilenos a buscarem o imunizante. “Foi um incentivo tremendo para que as pessoas se vacinassem, e esse incentivo se mantém até agora”, declarou.

Os imensos resultados positivos advindos da parceria com o país asiático fizeram com que na semana passada uma delegação do laboratório chinês desembarcasse no continente sul-americano para avaliar a construção de uma fábrica de vacinas no Chile. Se efetivada, poderá ficar pronta no primeiro trimestre do ano que vem.

Uma delegação de executivos da Sinovac se reuniu com autoridades e visitando possíveis locais, tanto na capital Santiago como no norte do país.

“É um investimento que pode ser realizado muito rapidamente e que fará com que a fábrica, que vai ter um alto nível tecnológico, entre em operação no primeiro trimestre do ano que vem”, disse o ministro da Economia do Chile, Lucas Palacios, durante uma visita da delegação à cidade de Antofagasta, no norte do país.

Palacios explicou que a unidade projetada produziria 50 milhões de doses anuais de vacinas e que, além da Coronavac, poderia produzir vacinas contra hepatite B, gripe e outras doenças.